A.M.N. de F. Stamm, M.S.S. de A. Coutinho
Departamento de Clínica Médica do Hospital Universitário ¾ Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC.
RESUMO
OBJETIVO. Determinar a incidência e os fatores de risco relacionados a infecção do trato urinário (ITU) em pacientes submetidos à sondagem vesical de demora (SVD).
MÉTODOS E CASUÍSTICA. Cento e trinta e seis pacientes submetidos à SVD entre maio e dezembro de 1993 no Hospital Universitário(HU) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Estudo observacional de coorte contemporânea, não-controlado, em pacientes submetidos a SVD, que foram seguidos desde a inserção até a remoção da sonda. Culturas de urina no ato da inserção e da retirada foram realizadas em meios convencionais para bactérias aeróbicas; também foi cultivado material obtido com "swab" do meato uretral. Na análise estatística usou-se métodos paramétricos para variáveis categóricas e contínuas, e análise multivariada para determinação de fatores de risco para ITU.
RESULTADOS. A incidência de ITU associada a SVD nesta amostra foi de 11 % . Na análise univariada três fatores foram significativos estatisticamente: a doença de base (clínica ou cirúrgica) (p=0,01), a permanência em uma clínica durante a internação(p=0,02) e a duração (em dias) da cateterização (p= 0,00003) Na análise multivariada, somente a duração da sondagem vesical foi preditiva para ITU (p = 0,03).
CONCLUSÕES. A incidência de ITU relacionada a SVD na amostra analisada foi de 11,0%, porque no HU da UFSC existe um controle dos fatores de risco alteráveis. A duração da sondagem vesical é um importante fator de risco para este problema. Recomenda-se limitar ao mínimo necessário o tempo de cateterização em pacientes internados.
OBJETIVO. Determinar a incidência e os fatores de risco relacionados a infecção do trato urinário (ITU) em pacientes submetidos à sondagem vesical de demora (SVD).
MÉTODOS E CASUÍSTICA. Cento e trinta e seis pacientes submetidos à SVD entre maio e dezembro de 1993 no Hospital Universitário(HU) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Estudo observacional de coorte contemporânea, não-controlado, em pacientes submetidos a SVD, que foram seguidos desde a inserção até a remoção da sonda. Culturas de urina no ato da inserção e da retirada foram realizadas em meios convencionais para bactérias aeróbicas; também foi cultivado material obtido com "swab" do meato uretral. Na análise estatística usou-se métodos paramétricos para variáveis categóricas e contínuas, e análise multivariada para determinação de fatores de risco para ITU.
RESULTADOS. A incidência de ITU associada a SVD nesta amostra foi de 11 % . Na análise univariada três fatores foram significativos estatisticamente: a doença de base (clínica ou cirúrgica) (p=0,01), a permanência em uma clínica durante a internação(p=0,02) e a duração (em dias) da cateterização (p= 0,00003) Na análise multivariada, somente a duração da sondagem vesical foi preditiva para ITU (p = 0,03).
CONCLUSÕES. A incidência de ITU relacionada a SVD na amostra analisada foi de 11,0%, porque no HU da UFSC existe um controle dos fatores de risco alteráveis. A duração da sondagem vesical é um importante fator de risco para este problema. Recomenda-se limitar ao mínimo necessário o tempo de cateterização em pacientes internados.
UNITERMOS: Infecção urinária. Cateter vesical. Infecção nosocomial. Fatores de risco.
INTRODUÇÃO
A Infecção do Trato Urinário (ITU) é responsável por 35 a 45% de todas as infecções adquiridas no hospital, sendo essa a causa mais comum de infecção nosocomial.1-5,46 Entre os pacientes que são hospitalizados, mais de 10% são expostos temporariamente à cateterização vesical de demora, o fator isolado mais importante que predispõe esses pacientes à infecção.6 Em unidade de terapia intensiva, também é expressivo o seu uso7.
Existem vários fatores de risco associados à infecção durante o uso do cateter vesical de demora, entre eles, a colonização do meato uretral e a duração da cateterização. A colonização do meato uretral por bactérias potencialmente patogênicas foi considerada em uma análise univariada como o mais importante fator de risco para a bacteriúria relacionada à cateterização urinária8.
A incidência de Infecção do Trato Urinário relacionado à cateterização vesical (ITUc) tem relação direta com a duração da cateterização, estando esse fator sempre presente em análises multivariadas.9,4 Entre os fatores de risco, este tem sido considerado o mais importante para o desenvolvimento de bacteriúria10.
Através de dados obtidos com a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH), no Hospital Universitário (HU), em Florianópolis, as taxas anuais de incidência da ITUc oscilam entre 10,8% a 12,7%,11-16 provavelmente porque há um controle dos fatores de risco considerados alteráveis.
Pressupondo uma indicação criteriosa para o cateterismo vesical de demora, em um hospital onde é utilizado o sistema de drenagem fechado, com padronizações e normas dos Centros de Controle de Doenças (CDC), do Sistema Nacional de Vigilância das Infecções Nosocomiais (NNISS) e Ministério da Saúde, propusemos esse estudo, que teve como objetivo determinar a incidência da ITUc e os fatores de risco a ela associados, na população adulta internada no Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), no ano de 1993.
MÉTODOS E CASUÍSTICA
Desenho do estudo - População
Através de estudo observacional de coorte contemporânea, não controlado, realizado no Hospital Universitário (Fpolis-SC) da UFSC, foram avaliados os pacientes internados nas enfermarias de Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Ginecologia, Emergência, Unidade de Terapia Intensiva e Centro Cirúrgico, no período de maio a dezembro de 1993, com idade igual ou superior a 15 anos, submetidos à cateterismo uretral breve (duração superior a 24 horas e inferior a 30 dias).Foram excluídos do estudo: a) pacientes cateterizados com patologia urológica ou cirurgia urológica ou de pelviperíneo; b) débito urinário menor do que 720 mL/24h, c) bacteriúria (> 100 unidades formadoras de colônias (UFC) /mL) no momento da inserção do cateter, d) sondagem urinária nos últimos 12 meses e/ou cateterismo de alívio prévio.
Técnicas utilizadas - Definição de critérios
Na sondagem vesical de demora foi usado cateter de Foley de 2 vias, seguindo técnica padronizada pela CCIH17do HU. Antes da colocação do cateter era colhida amostra com um "swab" estéril, introduzido até 1 cm no meato uretral. A seguir, feita a inserção da sonda, eram colhidas 2 amostras de urina recente através de punção na parte de látex do sistema coletor fechado. Este mesmo procedimento era realizado no momento da remoção da sonda vesical.
Os estudos microbiológicos foram realizados no Setor de Microbiologia do Laboratório Central do HU, conforme rotina estabelecida pelo mesmo18. O material do "swab" uretral foi inoculado nos meios de ágar Mac Conkey e ágar sangue (meio de base Casoy, com 5% de sangue de carneiro desfibrinado); as placas foram incubadas a 36ºC durante 48 horas. A urina foi semeada no meio de ágar C.L.E.D. (Cysteine Lactose Electrolyte-Deficient Medium) e em ágar Mac Conkey, e quando necessário em ágar sangue (meio de base Casoy com 5% de sangue de carneiro desfibrinado). As placas foram incubadas a 36ºC durante 24 horas, quando então a leitura da contagem de colônias foi feita através da técnica comparativa tipo "dip-slide". Se houvesse crescimento precário ou ausente, as placas eram reincubadas a mesma temperatura por mais 24 horas, fazendo a leitura final com 48 horas. A identificação dos microorganismos foi realizada em nível de gênero e espécie bacteriana através de provas bioquímicas.
A ITU ou bacteriúria relacionada ao cateter foi definida com a presença de 100 ou mais UFC/ml, após o isolamento repetido da mesma bactéria ou fungo em duas culturas de urina, tanto no ato da inserção quanto na remoção do cateter urinário19, 20. A cultura do material coletado no meato uretral através do "swab" foi considerada positiva (= colonização) no caso de qualquer germe ser identificado8, 21.
Análise estatística - Aspectos éticos
As seguintes variáveis foram coletadas para fins de análise: sexo, idade (anos), óbito, tempo de internação, clínica onde foi realizada a inserção do cateter; resultados das culturas de urina e material uretral, duração e indicação da cateterização vesical; doença de base (cirúrgica ou clínica) que motivou a indicação da sondagem urinária; procedência do paciente no momento da inserção do cateter (hospital ou comunidade); presença de sintomas de ITU (tais como febre,disúria, polaciúria); clínicas percorridas pelo paciente (da inserção até a remoção do cateter) e antibioticoterapia durante a cateterização (independente da sua indicação). Utilizando o procedimento do intervalo de confiança para a proporção e considerando 0,05 como erro de estimação, determinou-se uma amostra de pelo menos 130 pacientes considerando-se uma incidência estimada de 10% .
Foram utilizados os testes Qui-Quadrado (c2) e o teste t de Student, para analisar as variáveis qualitativas e quantitativas, respectivamente. Para estimar a incidência de ITUc no HU, foi utilizado o procedimento de estimação de parâmetros. A análise estatística foi feita com o programa STATGRAPHICSÒ, versão 5.0 e StatisticaÒ, versão 5.0. Adotou-se um nível de significância a de 0,05, para estimar a incidência de Infecção do Trato Urinário relacionada ao cateter vesical de demora.
Para análise multivariada foi usada regressão logística, tendo a ITU como variável dependente e 10 variáveis independentes inicialmente no modelo (sexo, idade, tempo de internação, positividade do "swab" uretral, duração da cateterização, indicação da mesma, tipo de paciente-clínico ou cirúrgico, sua procedência, presença de diabetes e uso prévio de antibióticos). O projeto foi implantado após ter sido submetido e aprovado pela Comissão de Ética Médica do HU; os pacientes eram informados da natureza do estudo e solicitado seu consentimento.
RESULTADOS
No período de maio a dezembro de 1993, 1.727 pacientes adultos foram internados no Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Desses, 14,1% (244) submeteram-se à cateterização vesical de demora, e constituíram a amostra inicial, da qual 108 pacientes foram excluídos por causas diversas (tabela 1). A amostra final foi constituída de 136 que preenchiam os critérios de inclusão. Onze por cento da amostra (15/136) estudada evoluiu para o óbito durante a internação hospitalar. Nenhum dos óbitos teve como causa a infecção do trato urinário.
Dos 136 pacientes incluídos na amostra final, 15 (11,0%) adquiriram ITUc. A incidência de infecção na amostra analisada foi de 11,0 %, estimando-se uma incidência entre 5,7% a 16,3% (95% intervalo de confiança) para os pacientes internados no HU. O germe mais prevalente foi a Escherichia coli (6/15), seguido por Enterobacter sp. (4/15), Staphylococcus sp. (2/15), Staphylococcus aureus (1/15) e Candida albicans (1/15). Apenas um paciente teve infecção mista, com Escherichia coli e Pseudomonas aeruginosa (gráfico 1).
Os "swabs" uretrais foram positivos em 44 dos 136 pacientes da amostra total (44/136 (32,0%). Nesses, os germes encontrados foram: Staphylococcus sp. (15/44), Streptococcus sp (a hemolítico do grupo viridans) (10/44), Escherichia coli (6/44), Staphylococcus aureus (3/44), Staphylococcus saprophyticus (2/44),Enterobacter sp. (2/44), Streptococcus agalactiae (b hemolítico do grupo B) (2/44), Candida albicans (1/44) eProteus sp (1/44). Em apenas dois casos, houve a presença concomitante de duas espécies bacterianas: um comStaphylococcus sp e também Streptococcus sp (a hemolítico do grupo viridans), enquanto outro com Escherichia coli e Enterobacter sp (gráfico 2). Dos 15 pacientes com ITUc, 8 (53,3%) tiveram "swab" positivo; em apenas um caso, o gênero encontrado no "swab" coincidiu com o da cultura de urina (Staphylococcus sp.). Não houve associacão entre "swab "positivo e ITUc ( p=0,7).
Na análise dos potenciais fatores de risco para ITU nosocomial, a análise univariada mostrou que apenas 3 fatores foram estatisticamente significativos: a doença de base (clínica ou cirúrgica) (p = 0,01); a permanência em uma clínica durante a internação (p = 0,02) e a duração (em dias) da cateterização vesical (p= 0,00003). (tabela 2 e gráfico3)
Pacientes com doença de base clínica tiveram mais ITU, da mesma forma, aqueles que permaneceram em uma clínica durante o período de cateterizacão e nos pacientes que tiveram seu cateter mantido por mais de dois dias. A análise multivariada mostrou somente a variável "duração da cateterizacão" estatisticamente significativa (p = 0,03). (tabela 3)
DISCUSSÃO
A presença do cateter na uretra remove os mecanismos de defesa intrínsecos do hospedeiro tais como a micção e o eficiente esvaziamento da bexiga22. O uso de cateteres vesicais em pacientes internados é alto e está associado com incidência aumentada de infecções do trato urinário. As infecções do trato urinário nosocomial em pacientes cirúrgicos aumentam o período pós-operatório na média de 2,4 dias, o que representa uma elevação no custo hospitalar em cerca de US$ 558 por paciente23. Tem-se constatado, ainda, um aumento em três vezes da taxa de mortalidade nos pacientes hospitalizados que adquirem essas infecções24.
O sistema coletor estéril fechado foi aperfeiçoado ao longo dos anos, sendo utilizado na maioria dos hospitais de hoje, mas a bacteriúria ocorre em média em 10 a 30% dos pacientes cateterizados. Portanto, ele retarda mas não elimina o risco de infecção.
Nesse sistema, a sonda de Foley é introduzida através do meato urinário em condições assépticas e ligada a um tubo coletor que, por sua vez, é ligado a uma bolsa de drenagem. Dessa forma, um patógeno pode entrar nesse sistema fechado por via intraluminal, ocorrendo a penetração em dois pontos, ou seja, na junção entre o cateter e o tubo coletor, e entre este e a bolsa coletora. Outra via de acesso, a extraluminal, é considerada quando uropatógenos potenciais que colonizam a região periuretral penetram na bexiga, entre a bainha do meato uretral e a sonda vesical. Esta última é a via mais freqüente pela qual um microorganismo causa infecção urinária relacionada ao cateter, pois ocorre em 70 a 80% dos casos6.
A maioria dos episódios de bacteriúria com contagem baixa de colônias (100 a 10.000 unidades formadoras de colônias (UFC) de bactérias ou fungos/ml) rapidamente progridem para altas contagens (>100.000 UFC/ml) dentro de 24 a 48 horas19. A partir desses dados, para se estabelecer o diagnóstico de bacteriúria no paciente cateterizado, tem sido recomendado o limiar quantitativo de 100 UFC de bactérias ou fungos/ml. Isso sugere que patógenos presentes, mesmo em pequeno número, durante um cateterismo breve, representam uma real permanência na urina e não uma contaminação.
Assim como nas infecções comunitárias, na Infecção do Trato Urinário relacionada ao cateter vesical de demora (ITUc), Escherichia coli é a espécie bacteriana mais comumente encontrada, porém em uma percentagem menor (85% e 50%, respectivamente)25, 26.
Desde a sua implantação, em 1980, o Hospital Universitário na UFSC, utiliza o sistema de drenagem fechado, sendo a cateterização vesical de demora realizada por um profissional da área de enfermagem .
Em 1966, pesquisadores que utilizaram o sistema de drenagem fechado, obtiveram uma incidência de bacteriúria relacionada ao cateter vesical de demora de 23%27. Nessa ocasião esses índices foram muito expressivos, pois representaram uma significante redução da bacteriúria quando comparada ao uso do sistema de drenagem aberto. Segundo Kunin e McCormack, 95% dos pacientes se tornam bacteriúricos nos primeiros quatro dias com o sistema aberto. A partir desse momento, outros estudos realizados entre 1974 a 1990 mostraram uma tendência geral a uma redução na incidência de bacteriúria (em 1974, incidência de 23%;1 em 1978, incidência de 17%2;em 1984, incidência de 10%47; em 1990, incidência de 10%)36.
No HU, entre 1987 a 1992, a taxa de incidência da ITUc mantém-se estável, com uma discreta variação entre 10,8% a 12,7%11-16. Em 1993, essa taxa foi de 12,5%48, bastante próxima da incidência reportada neste estudo.
O controle da diurese durante cirurgias é uma das indicações mais comuns para a sondagem vesical de demora6, 25, 28. Essa indicação foi a mais freqüente (70,6%), seguida pela determinação da diurese (29,4%), em pacientes graves ou comatosos, fato esse detectado no trabalho de campo. Em função da metodologia adotada, creditamos a ausência de indicação para retenção ou incontinência urinária.
Neste estudo observamos a mesma tendência, ficando o centro cirúrgico como a área do hospital onde a maioria dos cateteres foi inserida (71,3%), seguido da UTI (16,9%) e Emergência (5,9%), com um número inexpressivo para as clínicas cirúrgicas e médicas. Da mesma forma, em relação à doença de base (clínica ou cirúrgica, e esta, eletiva ou de urgência) que determinou a indicação para o cateter vesical de demora, a doença cirúrgica foi preponderante (75,7%).
Todos esses dados, em conjunto com as observações feitas durante a pesquisa, permitem algumas considerações. A indicação para a cateterização vesical de demora em pacientes cirúrgicos, na maioria das vezes, é feita de forma eletiva em pacientes que já estão internados, e apenas eventualmente em situações de urgência. Nos pacientes com patologias clínicas e que na sua maioria, procediam da comunidade, a indicação da cateterização era feita quase que exclusivamente em situações de urgência.
A maior parte das ITU nosocomiais são adquiridas de forma endêmica, geralmente por auto-infecção, mas várias formas de transmissão epidêmica têm sido registradas29, 25. Quando esta ocorre, há um aumento importante na taxa de infecção, e as bactérias responsáveis não são aquelas comumente encontradas, mas sim outras tais como Serratia marcescens, Proteus rettgeri e Providencia stuartii.25 Nesses casos, as investigações têm demonstrado que a infecção cruzada é a principal forma de disseminação, através das mãos do pessoal hospitalar29,25.
A maioria dos pacientes deste estudo (83,8%) percorreu mais de uma clínica desde a inserção do cateter até a sua remoção, porém a análise univariada mostrou uma associação com ITU naqueles pacientes que se mantiveram em uma clínica durante todo o período da cateterização. Mesmo assim, esse dado deve ser avaliado com cautela, pois não existem outras evidências de que a infecção adquirida tenha sido por disseminação exógena.
A uretra, em ambos os sexos, ou não é colonizada ou tem uma microbiota pouco numerosa30. Encontramos 1/3 dos pacientes da amostra analisada com cultura do meato uretral positiva (44/136), sendo que em um estudo semelhante observou-se positividade em metade deles (601/1213)8. As espécies de microorganismos e a freqüência com que foram encontrados na porção anterior da uretra estão de acordo com os dados encontrados na literatura30-32.
Em 1980 foi estabelecido em uma análise univariada, a colonização do meato uretral por bactérias potencialmente patogênicas como o maior fator de risco para bacteriúria relacionada ao cateter vesical de demora8 . Outros autores também observaram susceptibilidade à infecção nos indivíduos com aumento na densidade da colonização bacteriana, porém a flora do meato uretral específica nem sempre predisse as espécies responsáveis pela mesma21. Observou-se ainda que a colonização retal e periuretral freqüentemente precedem a bacteriúria associada ao cateter33.
Nesse estudo, entre os 15 pacientes que adquiriram bacteriúria, apenas 8 (53,3%) tiveram "swab" positivo, não se encontrando uma associação entre "swab" positivo e ITUc. É possível que o número de casos não tenha sido suficiente para estabelecer essa relação, e, além disso, a colonização periuretral não é seguida invariavelmente por bacteriúria.4 Encontramos 1/3 da amostra com "swab" positivo (44/136), e entre esses, apenas 1/5 desenvolveu ITUc (8/44). Alguns indivíduos têm colonização periuretral persistente, mas nunca desenvolvem bacteriúria4.
Outro aspecto que deve ser salientado é a ausência de um padrão que estabeleça de maneira uniforme o nível bacteriano quantitativo a ser considerado na colonização periuretral. Entre os fatores de risco para ITUc, as análises multivariadas têm demonstrado de maneira constante a duração aumentada da cateterização34, 4. Foidemonstrado um risco de 2,5% para 1 dia de cateterização, 10% para 2 a 3 dias, 12,2% para 4 a 5 dias, chegando a 26,9% com a duração igual ou maior do que 6 dias.35
Na presente observação, a duração da cateterização foi o único fator que persistiu estatisticamente significativo na análise multivarida. A mediana do número de dias com o cateter foi maior no grupo de pacientes que desenvolveu ITUc. Enquanto em 75% dos pacientes não-infectados a duração da cateterização esteve entre 2 a 4 dias, em 75% dos infectados cateterizados esteve a partir de 4 dias ou mais. Em um estudo, verificou-se que a incidência de ITUc era duas vezes maior quando o período de cateterização fosse superior a uma semana; a duração média da cateterização encontrada foi de 6,5 dias, comparada com os 3 dias entre os pacientes sem infecção36.
Mais ainda, os pacientes clínicos tiveram o dobro da duração média de cateterização em relação aos pacientes cirúrgicos, com uma significante associação entre a duração e a doença de base do paciente (p=0,000001). Em 75% dos pacientes cirúrgicos a duração esteve entre dois e três dias; em 75% dos pacientes clínicos o tempo de cateterização foi superior a três dias. A prevenção permanece como o melhor caminho para reduzir a morbidade, mortalidade e custos da ITUc 35, 37.
As estratégias comprovadamente efetivas incluem a inserção estéril e os cuidados com o cateter, sua pronta remoção e o uso do sistema de drenagem fechado38-41,4, 42-44."Desde a introdução do sistema de drenagem fechado por Dukes, já se passaram 69 anos e nós aprendemos mais sobre o que não é efetivo do que como aperfeiçoar o cuidado com o cateter. Com certeza uma única medida não será suficiente. O desafio é desenvolver métodos que efetivamente drenem a bexiga sem alterar os seus mecanismos de defesa"41. "Na verdade, a única medida mais efetiva é evitar o uso do seu maior fator de risco: o cateter vesical de demora"45.
CONCLUSÕES
A incidência de ITUc na amostra analisada foi de 11,0%, índice semelhante aos países desenvolvidos, porque no HU da UFSC existe um controle dos fatores de risco alteráveis. Houve uma nítida relação entre o tempo de permanência do cateter vesical de demora e o desenvolvimento de ITUc, sendo a duração da cateterização vesical um importante fator de risco. Recomenda-se limitar ao mínimo necessário o tempo de sondagem vesical em pacientes internados.
SUMMARY
Urinary tract infection associated with indwelling catheters: incidence and risk factors
BACKGROUND. To determine the incidence and risk factors associated with urinary tract infection (UTI) in patients submitted to long-term urinary (bladder) catheterization. One hundred and thirty-six patients who had urinary catheterization during the period of may to december 1993 at an University Hospital in Brazil.
MATERIAL AND METHOD. Observational prospective cohort non-controlled study. Patients receiving bladder catheter were followed from insertion to removal of the catheter, looking for the development of a positive culture. Urine cultures were done using conventional media for aerobic organisms and biochemical tests for identification. Material from a urethral meatus swab was also examined for bacteria. Statistical analysis using parametric tests for cathegorical and continuous variables, and multivariate analysis for determination of risk factors for UTI were performed.
RESULTS. Incidence of UTI associated with urinary catheter was 11,0%. Univariate analysis showed 3 factos as predictors: the nature of his disease (clinical or surgical) (p=0,01), stayed during hospitalization in one clinic (p=0,02)and duration of catheterization (p=0,00003). In the multivariate analysis only the duration of catheterization was statistically significant.(p= 0,03).
CONCLUSIONS. Incidence of UTI associated with urinary catheters in the analysed sample was 11,0%, because in the University Hospital there is a control of the alterable risk. Catheterization duration is an important risk factor for this problem. It is recommended to limit to the minimum the time of catheterization in hospitalized patients. [Rev Ass Med Brasil 1999; 45 (1): 27-33]
KEY WORDS: Urinary tract infection. Urinary catheter. Nosocomial infection. Risk Factors.
Urinary tract infection associated with indwelling catheters: incidence and risk factors
BACKGROUND. To determine the incidence and risk factors associated with urinary tract infection (UTI) in patients submitted to long-term urinary (bladder) catheterization. One hundred and thirty-six patients who had urinary catheterization during the period of may to december 1993 at an University Hospital in Brazil.
MATERIAL AND METHOD. Observational prospective cohort non-controlled study. Patients receiving bladder catheter were followed from insertion to removal of the catheter, looking for the development of a positive culture. Urine cultures were done using conventional media for aerobic organisms and biochemical tests for identification. Material from a urethral meatus swab was also examined for bacteria. Statistical analysis using parametric tests for cathegorical and continuous variables, and multivariate analysis for determination of risk factors for UTI were performed.
RESULTS. Incidence of UTI associated with urinary catheter was 11,0%. Univariate analysis showed 3 factos as predictors: the nature of his disease (clinical or surgical) (p=0,01), stayed during hospitalization in one clinic (p=0,02)and duration of catheterization (p=0,00003). In the multivariate analysis only the duration of catheterization was statistically significant.(p= 0,03).
CONCLUSIONS. Incidence of UTI associated with urinary catheters in the analysed sample was 11,0%, because in the University Hospital there is a control of the alterable risk. Catheterization duration is an important risk factor for this problem. It is recommended to limit to the minimum the time of catheterization in hospitalized patients. [Rev Ass Med Brasil 1999; 45 (1): 27-33]
KEY WORDS: Urinary tract infection. Urinary catheter. Nosocomial infection. Risk Factors.
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