sexta-feira, 16 de maio de 2014

Relação jurídica de consumo e direitos básicos do consumidor




“...na atual sociedade de consumo, existe uma grande massa vulnerável, inapta a se relacionar em paridade com o fornecedor que detém toda a informação e domina as peculiaridades das transações econômicas...”
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é um grande marco na proteção dos direitos fundamentais trazidos pela Constituição Federal de 1988. Este diploma segue a tendência contemporânea de técnica legislativa, baseada na criação de microssistemas normativos, com a preponderância de cláusulas gerais e aberturas principiológicas, aptas a oferecerem, em espécie, a tutela adequada a um conjunto específico de situações fáticas.

Por meio da análise do diálogo das fontes, sabe-se que os diversos dispositivos do CDC não derrogam as previsões do Código Civil, mas as complementam em benefício da equalização da relação jurídica de consumo. Para que isso ocorra, inúmeras garantias ao consumidor – considerado a parte vulnerável do sinalagma – são elencadas. Estas têm fundamento nos princípios e direitos básicos presentes no rol do art. 6° do CDC.

Uma das prerrogativas que mais se destacam é a responsabilização objetiva do fabricante pelo fato do produto, apto a ocasionar os acidentes de consumo. Para que se possa avaliar com precisão os direitos e prerrogativas presentes no micro-sistema em foco, deve-se definir em que consiste a relação jurídica de consumo.

De acordo com o autor N. DE LUCCA, esta se sustenta em três aspectos fundamentais, a saber: sujeitos, objeto e finalidade.

No aspecto subjetivo, o consumidor, conceituado de forma ampla pelo CDC, tendo quatro sentidos de possível interpretação: o standard (art. 2°); a coletividade (art. 2°, parágrafo único); as vítimas de acidentes de consumo (art. 17) e as pessoas expostas às práticas comerciais (art. 29).

Nota-se que a noção de consumidor não se limita à relação contratual. Esta se expande, ao criar a figura do consumidor por equiparação, para concretizar as garantias de proteção e prevenção ao dano, com base na efetiva reparação.

Ainda no pólo subjetivo, o fornecedor é o contraponto. Definido pelo art. 3°, é pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que desenvolve um rol de atividades aptas produzir ou colocarem em circulação bens ou serviços com finalidade econômico-lucrativa.

O aspecto objetivo abrange os produtos – como qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial - e os serviços oferecidos pelos fornecedores (art. 3°, parágrafos 1° e 2°). Já a finalidade desta relação deve ser aferida pela qualificação de destinatário final do sujeito adquirente de produto ou serviço.

Uma vez presentes estes três elementos, aplicam-se as regras consumeristas, que tem como fundamento axiológico, além da matriz constitucional (art. 5°, XXXII e art. 170, V, da Carta Constitucional), um rol de direitos básicos dispostos no art. 6° do CDC.

Tais são previstos por se considerar que, na atual sociedade de consumo, existe uma grande massa vulnerável, inapta a se relacionar em paridade com o fornecedor que detém toda a informação e domina as peculiaridades das transações econômicas, alheias à realidade de muitos daqueles que contratam.

Estes valores sociais fazem com que as normas do CDC sejam de ordem pública, vale dizer, inafastáveis pela iniciativa das partes, reduzindo-se, neste âmbito, o dogma da autonomia de vontade.

Assim, os incisos do artigo mencionado, inspirados na Resolução 39.248/85 da Organização das Nações Unidas, preveem pontos indissociavelmente presentes em qualquer relação de consumo.

O primeiro deles é a proteção à vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por produtos ou serviços fornecidos (art. 6°, I). Tem-se que o consumidor deve conhecer a nocividade do objeto da contratação e o fornecedor, baseado no princípio da prevenção, deve evitar qualquer possibilidade de dano.

Se este, entretanto, ocorrer, o inciso VI do artigo em análise traz a obrigatoriedade da efetiva reparação dos danos patrimoniais, morais, difusos ou coletivos gerados.

Ademais, é de grande importância o acesso do consumidor a todas as informações (art. 6°, III) – claras e adequadas – sobre os diferentes produtos e serviços, para que se estabeleça a justa expectativa, formando-se uma relação de confiança na qualidade do que se está a fornecer, ao se saber dos perigos inerentes do que se está a contratar.

Por fim, para a efetivação de todas as prerrogativas elencadas, é assegurada a facilitação da defesa dos direitos do consumidor, inclusive por meio da adoção da técnica de julgamento baseada na inversão do ônus da prova, quando presentes os requisitos de verossimilhança da alegação ou hipossuficiência (art. 6°, VI).


 
Camila Mattos de Carvalho Ribeiro

OAB/SP nº 231.207

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