segunda-feira, 7 de março de 2016

Competência dos Juízes Federais e Lava-Jato

Nos últimos meses muito tem se falado a respeito da competência da Justiça Federal e de seus juízes devido a polêmica ação do juiz Sérgio Moro e da Polícia Federal na Operação Lava Jato. Principalmente depois da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em desmembrar o processo da operação Lava Jato, sob a reponsabilidade do juiz Sérgio Moro.  Na ocasião o plenário do STF decidiu por desmembrar o inquérito 4130. O inquérito foi enviado ao STF pelo juízo da 13ª Vara Federal do Paraná, depois que, no curso da chamada operação Lava-Jato, teve conhecimento de possíveis delitos atribuídos à senadora e a outros investigados, que teriam se beneficiado de repasses de valores da Consist Software, empresa que tinha contrato com o Ministério do Planejamento para gestão de empréstimos consignados. Por conta da prerrogativa de foro da senadora, o caso foi enviado ao STF e distribuído ao ministro Teori Zavascki, relator dos casos relacionados à investigação da Lava-Jato. O caso foi enviado à Presidência do STF para avaliar-se a possibilidade de livre distribuição do processo por entender que os fatos apresentados na investigação envolvendo a senadora não teriam relação com a apuração de fraudes e desvios no âmbito da Petrobras. A Presidência da Corte em acordo com o ministro Teori determinou a livre distribuição do processo.
Depois da distribuição por sorteio o processo caiu com o ministro Dias Toffoli, com a seguinte decisão:
“Em seu voto sobre a questão de ordem, o ministro Dias Toffoli salientou que a colaboração é considerada um meio de obtenção de prova, e pode acontecer que o colaborador traga informações de crimes que não sejam objeto da investigação primária. A colaboração, assim, não pode ser considerada um critério para determinar a competência para analisar e julgar o processo.
No histórico constante dos procedimentos encaminhados ao Supremo, frisou Toffoli, o juiz da 13ª Vara Federal do Paraná disse que os ilícitos em apuração se referem a repasses de valores pela empresa Consist em acordo celebrado com o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, com a intermediação de empresas de fachada. Para o ministro, não existe nenhuma dependência recíproca entre esses fatos - a gestão de empréstimos consignados no Ministério - com apuração de fraudes e desvios de recursos na Petrobras.
De acordo com o relator, não se trata de fatos que se imbriquem de forma tão profunda que justifiquem a unidade de processo e julgamento, não importando que esses fatos tenham surgido em depoimento de colaborador de outro processo. O fato de a Polícia Federal e o Ministério Público Federal denominarem essas investigações de fases da Operação Lava-Jato não se sobrepõe às normas técnicas legais disciplinadoras da competência.
O ministro votou no sentido de acolher o pleito de desmembramento do processo, para que permaneça no STF apenas a investigação contra a senadora Gleisi Hoffmann, detentora de foro por prerrogativa de função”. (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=300414)
A grande questão trata do juízo competente, ou seja, qual juízo seria competente para julgar estes casos. Segundo decisão daqueles que votaram pelo desmembramento a competência para processar e julgar crimes delatados pelo colaborador que não sejam conexos aos fatos do objeto da investigação principal depende de condições do local da consumação. Portanto, como os indícios da emissão de notas fiscais falsas teriam sido em sua grande maioria emitida por empresas sediadas em São Paulo para empresas do mesmo município, ficou decidido que o juízo competente seria o da justiça Federal do Estado de São Paulo. Aqueles que divergiram da decisão sustentaram o argumento de que os fatos apresentados neste inquérito estão ligados por conexão e continência às investigações da Operação Laca-Jato. Nas palavras do ministro Gilmar Mendes “Trata-se de uma mesma organização criminosa, com os mesmos métodos de atuação”.
Face esta decisão muitos se posicionaram com os mais diversos argumentos. A decisão do STF gerou muito debates, discussões com afirmações de que se tratava de uma decisão política para enfraquecer a Operação Lava-Jato e o trabalho realizado até então. Sem tomar qualquer tipo de partido, vamos entender o que a Constituição Federal nos diz a respeito da competência dos juízes federais. O artigo 109 da CRFB/1988 assim dispõe:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País;
III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;
VII - os "habeas-corpus", em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;
VIII - os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;
IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;
X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;
XI - a disputa sobre direitos indígenas.
A grande questão é a respeito do conflito de competência da julgar e processar tais assuntos. A decisão do STF fora estritamente de cunho técnico, mesmo que isto possa refletir em algum aspecto político. Em verdade a Suprema Corte entendeu que o caso investigado não tinha ligação com o “petróleo”, portanto deveria observar s regras de competências processuais existente nas leis em vigor.
Embora, seja compreensível o receio da sociedade brasileira com este desmembramento não podemos nos esquecer de que o juiz Sérgio Moro não está só nesta batalha. A Justiça Federal possui tantos outros competentes juízes que já manifestaram apoio e solidariedade ao magistrado Sérgio Moro. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) já se manifestou em apoio ao juiz Sérgio Moro, e está atenta às tentativas de manobras políticas a fim enfraquecer os trabalhos realizados junto à Polícia Federal e ao Ministério Público.
Termino esta reflexão com a seguinte nota da Ajufe:
“A Operação Lava Jato coroa um lento e gradual processo de amadurecimento das instituições republicanas brasileiras, que não se colocam em posição subalterna em relação aos interesses econômicos. A Justiça Federal realiza um trabalho imparcial e exemplar, sem dar tratamento privilegiado a réus que dispõem dos recursos necessários para contratar os advogados mais renomados do País. Essa ausência de benesses resulta em um cenário incomum: empreiteiros, políticos e dirigentes partidários sendo presos”.


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