terça-feira, 26 de julho de 2016

O medo de ser uma farsa

Em algum momento da vida profissional, a maioria de nós já se sentiu uma farsa. E, em pequenas doses, essa sensação eventual pode ser até benéfica, nos fazendo rever valores e objetivos. O problema é que, para alguns, a impressão de ser uma fraude é persistente – independentemente do quanto saibam sobre suas áreas de atuação, se esforcem ou mesmo tenham acumulado conquistas e reconhecimento de seus pares e chefes. Essa condição, descrita pela primeira vez nos anos 70, é chamada de “fenômeno do impostor”. Apesar de anos de pesquisa, não se sabe quais os aspectos psicológicos específicos que levam a esse quadro e não há consenso sobre fatores externos com maior probabilidade de causar a síndrome.


Recentemente, pesquisadores da Universidade de Ghent, na Bélgica, publicaram um estudo que lança algumas luzes sobre o tema. Os cientistas solicitaram a 201 executivos de alto escalão que preenchessem oito questionários com mais de 130 questões. A pesquisa avaliou até que ponto esses funcionários sofriam do fenômeno do impostor e como eles se autoavaliavam em relação a algumas características como instabilidade emocional, responsabilidade, cuidado consigo mesmo e com os outros, amabilidade, sinceridade, extroversão, perfeccionismo, satisfação profissional e comprometimento com o trabalho.
O fenômeno do impostor estava presente em cerca de 20% dos voluntários em todos os níveis da organização. Pessoas que atribuíram a si mesmas altos escores em instabilidade emocional e baixos escores em cuidado eram as mais propensas a se sentir impostoras. Os psicólogos Jasmine Vergauwe, Bart Wille, Marjolein Feys, Filip de Fruyt e Frederik Anseel, autores do estudo, especulam que indivíduos que se sentem impostores apresentam maior tendência para autocrítica e perfeccionismo. Em outras palavras, podem exigir demais de si mesmos e ser mais comprometidos, exigentes e responsáveis do que se descrevem.
Outra descoberta interessante: profissionais que se sentem impostores mostram pontuações mais baixas em medidas do que os que os pesquisadores chamaram de “cidadania organizacional”, o que significa que são menos propensos a ajudar colegas, participar de reuniões opcionais ou desempenhar outras tarefas que não sejam essenciais para seu trabalho. Obviamente, sentir-se um impostor é angustiante – e também contraproducente. Os cientistas acreditam que o acompanhamento psicoterapêutico possa ser de grande utilidade para a redução do perfeccionismo, que muitas vezes aparece como forma de dar conta de sentimentos de insegurança e baixa autoestima. Com frequência, durante o processo terapêutico, as pessoas se dão conta de experiências vividas no passado que sustentam crenças nem sempre conscientes, de autodesvalorização, que desencadeiam sentimentos intensos de raiva, culpa, tornando-as mais propensas à depressão.

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