quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Transtorno do Sono no Idoso

O sono como entidade fisiológica tem fundamental importância na manutenção da homeostase. 


Já é tradicional a afirmação de que passamos dois terços de nossa vida dormindo mas, o que ninguém sabe exatamente, é quantas pessoas estão fora desse cálculo hipotético. Calcula-se, por baixo, que aproximadamente 14% das pessoas têm algum transtorno do sono.

Essas pessoas estarão passando muito menos ou muito mais que dois terços de sua vida dormindo e a insatisfação com a qualidade do sono aumenta com a idade. Estima-se que os transtornos do sono afetam em torno de 50% das pessoas com mais de 65 anos.

Um grande número de idosos apresenta alterações na qualidade do sono, principalmente as dificuldades em conciliar o sono (pegar no sono), sono entrecortado ou fragmentado, sono muito superficial. Nos idosos, o próprio ritmo circadiano sofre alterações e não são raros os casos de inversão do dia pela noite (acordado a noite e sonolento de dia). Uma das primeiras alterações que podem indicar a iminência de transtornos do sono é a alteração do horário de acordar (muito mais cedo na velhice).

Além de eventual sensação de cansaço durante o dia que segue a noite mal dormida, outros problemas musculares e articulares podem surgir com as alterações do sono. É o caso, por exemplo, das bursites, refluxo gastro-esofágico, tendinites, mialgias (dores musculares), cervicalgias (torcicolos), etc. Se esses problemas podem ser conseqüência de esforços posturais e posições mal acomodadas durante noites de Insônia, por outro lado, eles também acabam perturbando o sono das noites seguintes, fazendo assim uma espécie de círculo vicioso.

Os pacientes idosos portadores de demência também costumam apresentar distúrbios do ciclo sono-vigília, e esse distúrbio pode servir até como avaliação do grau de demência; quanto mais alterado for o ritmo sono-vigília, mais intensa a demência. O fato dos pacientes demenciados passarem as noites acordados tem como complicação, não exatamente a saúde do paciente, mas os transtornos que isso acaba produzindo nas pessoas que cuidam deles.

CLASSIFICAÇÃO DOS DISTÚRBIOS DO SONO
Entre as chamadas dissonias, parassonias, alterações associadas a medicamentos e substâncias, associadas a transtornos emocionais ,etc, existem aproximadamente 100 tipos de problemas do sono. Para nós a classificação pode ser bem mais simples, interessando mais os casos chamados de InsôniaHipersonia, parassonia e distúrbios dos movimentos noturnos.

INSÔNIA
Insônia pode ser definida como a dificuldade em conciliar e manter o sono. Inclui-se aqui (indevidamente?) também, os casos onde a pessoa julga que seu sono não está sendo suficiente. É bom lembrar que a Insônia, apesar de referida sempre como um estado isolado, normalmente é apenas um sintoma e não a doença em si.

Uma das classificações mais simples é quanto à parte do sono comprometida. Assim sendo, teríamos Insônia Inicial, quando a pessoa custa a pegar no sono, a InsôniaIntermediária, quando acorda durante a noite e a Insônia Final, quando acorda muito cedo.

Assim sendo, a Insônia pode ser tanto a dificuldade de iniciar o sono como de manter o sono ou mesmo a percepção de que o sono não foi reparador. Para alguns autores, o diagnóstico de Insônia exige que, além do dormir mal ou não dormir, exista também as perturbações do bem-estar no dia seguinte. Estas perturbações seriam: fadiga, cansaço fácil, ardência nos olhos, irritabilidade, ansiedade, fobias, incapacidade de concentrar-se, dificuldades de atenção e memória, mal-estar e sonolência.

Surpreendentemente, porém, alguns pacientes que relatam passar a noite em claro, dizem-se bem dispostos de dia. Tais pacientes não poderiam ser classificados como verdadeiros insones mas como pessoas com baixa necessidade de sono. Essas pessoas que dormem pouco não se queixam de Insônia e nem mesmo reconhecem a má qualidade do sono como um problema sério em suas vidas.

Em termos de gravidade podemos dizer que a Insônia "não mata mas maltrata". Isso quer dizer que a Insônia afeta mais o aspecto psíquico e social da vida do que ameaça o seu componente biológico. Idosos com Insônia tendem a ter mais acidentes.

Em relação aos dados estatísticos, podemos dizer que todos os grupos etários, raciais e socioeconômicos apresentam Insônia mas, de modo geral, são as mulheres que mais referem o problema, o qual aumenta com a idade e nas pessoas que vivem sós. O sintoma Insônia tem múltiplas causas que podem ser reunidas em seis grupos. As causas situacionais, as psiquiátricas, as clínicas, as disritmias circadianas, os fatores comportamentais e os distúrbios do sono primários.

CAUSAS FARMACOLÓGICAS DE INSÔNIA
As drogas consideradas metilxantinas, tais como a cafeína e a teofilina, as drogas simpatomiméticas como a efedrina, o álcool, os corticóides, as tiroxinas, alguns neurolépticos e antidepressivos, particularmente os modernos inibidores seletivos de recaptação da serotonina, todas elas têm grande potencial para causar a Insônia.


Substâncias causadoras de Insônia
substâncias
onde estão
álcoolBebidas, alguns xaropes
cafeínaBebidas, analgésicos, café, xaropes, antigripais, chocolate
teofilinaRemédios para bronquite, enfisema e asma
efedrinaDescongestionantes nasais, xaropes, antigripais
corticóidesAntinflamatórios e antialérgicos
neurolépticosSedativos
antidepressivosAntidepressivos
tiroxinasRemédios para tireóide e alguns para emagrecer
anorexígenosRemédios para perder peso


Uma das informações muito úteis aos clínicos, é em relação aos anti-histamínicos e tranqüilizantes diazepínicos (Valium®, Diempax®, Diazepam®, Lorax®, Dormonid®...) podem causar efeito paradoxal em idosos, ou seja, podem produzir mais Insônia ao invés de melhorá-la. Também o álcool, utilizado em pequenas doses por alguns idosos para induzir ao sono, pode ser uma das causas do sono fragmentado e de má qualidade.

CAUSAS MÉDICAS DE INSÔNIA
Em geral, qualquer doença crônica capaz de causar dor ou desconforto pode produzir alterações na qualidade do sono. Nos idosos, as causas clínicas mais freqüentemente relacionadas às alterações do sono são: dificuldades urinárias, doenças articulares, bursites, refluxo gastro-esofágico, dificuldades digestivas com flatulência e meteorismo, doença pulmonar crônica (bronquite, asma...).

Alguns desses quadros podem ser responsáveis pelo sono fragmentado e despertar no meio da noite. Atualmente fala-se muito da Síndrome da Apnéia Noturna como uma das condições mais associadas ao despertar no meio da noite e, conseqüentemente, deHipersonia no dia seguinte.

Entre as situações clínicas capazes de produzir Insônia, podemos esquematizá-las da seguinte forma:


Causas Médicas de insônia X Gravidade
Causa clínica
Insônia leve (%)
Insônia grave (%)
Depressão
Bronquite Crônica
Doença Prostática
Insuficiência Cardíaca
Dor Lombar
2,6
1,6
1,6
1,6
1,4
8,2
1,5
2,7
2,5
1,5


CAUSAS PSICOLÓGICAS DE INSÔNIA
O estado de tensão produzido por estresse, embora seja encontrado em qualquer idade, tem uma prevalência muito acentuada nos idosos. Motivos para alterações depressivas o idoso pode ter de sobra; morte de companheiros, perda do cônjuge, perda do espaço social, dificuldades financeiras, sentimentos de abandono por parte da família, limitações físicas próprias da idade, mudanças no status social, percepção da própria condição de saúde, etc.

As três situações psiquiátricas mais associadas à Insônia no idoso são, por ordem decrescente de freqüência: ansiedadedepressão e demência. Normalmente, salvo muitas exceções, a ansiedade é mais responsável pela Insônia inicial, ou dificuldade para conciliar o sono, e à Insônia intermediária, proporcionando o ato de levantar no meio da noite e não conseguir dormir mais.

depressão, por sua vez, estaria mais relacionada com a Insônia terminal, ou seja, pelos despertares muito cedo, ainda de madrugada. A depressão pode ainda causar aHipersonia, que é o ato de dormir demais. Na demência, ainda em seus estágios iniciais, pode haver inversão circadiana, quando o paciente troca o dia pela noite.

CAUSAS AMBIENTAIS DE INSÔNIA
Uma das maneiras mais fáceis de se "aprender" a ter Insônia é a opção de dormir tarde, ficar até de manhã vendo televisão, lendo ou qualque outra coisa. Esse tipo de Insôniaadquirida tem sido muito freqüente devido ao hábito das pessoas terem aparelhos de televisão no quarto.

Insônia Adquirida também atormenta profissionais com necessidade do trabalho em turnos noturnos, bem como os pilotos de avião, os quais podem ter dificuldades para criar uma rotina para o sono devido aos ajustes aos fusos horários.

HIPERSONIA
Alguns autores classificam como Hipersonia, um grupo diverso de condições que tem como principal queixa a Sonolência Excessiva Diurna. Outros preferem achar que aHipersonia é um transtorno que se manifesta pelo ato de dormir demais, ou seja, por passar dormindo a maior parte do tempo em que estaria acordado.

Normalmente a maioria das Hipersonias é secundária à Insônia noturna, quando então o paciente passa a dormir de dia o tempo que não dormiu à noite, portanto, não se trata deHipersonia primária. Outros casos de Hipersonias que não sejam secundárias à Insônia, podem ser conseqüência de hipotireoidismo, hipoglicemia, de má ventilação pulmonar nos bronquíticos crônicos e enfizematosos, ao uso de antihistamínicos (antialérgicos) ou tranqüilizantes, e a Insuficiência Cardíaca. Outros medicamentos também podem induzir à sonolência, como é o caso dos antiespasmódicos, antidepressivos, barbitúricos, etc.

APNÉIA DO SONO
Pessoas que tem o transtorno conhecido como Apnéia do Sono podem parar brevemente de respirar quando adormecidos, e tem vários despertares breves e repetidos ao longo da noite perturbados por essas crises. Este distúrbio freqüentemente se associa a roncos, que é a tradução sonora do estreitamento da via aérea durante a passagem do ar.

Quando o referido estreitamento da via aérea se torna mais severo, dá-se o fechamento desta, resultando em Apnéia. Assim sendo, a Apnéia é arbitrariamente definida como parada da respiração ou interrupção do fluxo aéreo por no mínimo durante 10 segundos.

A chamada Apnéia Noturna ou Apnéia do Sono é muito mais comum nos idosos que em outros grupos etários, e uma importante causa de hipersônia. A Apnéia Noturna se caracteriza por uma crise de roncos altos, repentina, que se repete ao longo da noite e cessa em mais ou menos 10 segundos. As crises acontecem mais quando a pessoa dorme de barriga para cima.

Apnéia do Sono parece estar relacionada ao excesso de sonolência durante o dia, adepressão, a dor de cabeça, e o prejuízo da memória da demência. O quadro de Apnéia do Sono está ainda relacionado a um aumento do risco de morte súbita dormindo.

PARASONIAS
As Parasonias são comportamentos incomuns apresentados pelo paciente dormindo. Normalmente esses comportamentos incomuns dizem respeito ao sonambulismo, mioclonias, fala noturna, pesadelos e confusão mental noturna. Alguns medicamentos agravam essas parasonias, como é o caso dos beta-bloqueadores que costumam provocar pesadelos, da cafeína, antidepressivos e álcool que podem produzir mioclonia (movimentos espasmódicos durante o sono).


Saber mais:
Transtornosdo Sono em DSM.IV
Laboratório do Sono

Tratamento Farmacológico da Insônia
Antes de se recomendar um medicamento, cujo objetivo seja exclusivamente fazer dormir, é indispensável verificar se existe alguma condição responsável pela Insônia e que mereça um tratamento anterior e prioritário.A depressão emocional, por exemplo, deve ter tratamento prioritário sobre a Insônia e, normalmente, esta cede depois de tratada aquela. O mesmo se diz da diabetes, do hipertireoidismo, das dores nas juntas, das lombalgias, etc.

Preferentemente o tratamento medicamentoso da Insônia deve ser temporário, até que se corrijam as causas que a originaram. A duração do tratamento deve ser definida em função da indicação e informada ao paciente. Trata-se de 2 a 5 dias em caso de Insôniaocasional (ex.: durante uma viagem) e de 2 a 3 semanas em caso de Insônia transitória (quando da ocorrência repentina de um incidente sério). O tratamento da Insônia crônica deve ser instituído somente após consulta a um especialista. Qualquer persistência de distúrbios do sono após um período de 6 semanas deve ser objeto de investigações adicionais.

Nos idosos, quando necessários, os medicamentos eleitos para induzir o sono devem ser aqueles com meia-vida curta, tomando-se o cuidado de verificar se os mesmos não estão tendo um efeito paradoxal, ou seja, se não estão deixando o paciente mais agitado ainda.

Uma vez que a Insônia é um distúrbio complexo, seu tratamento pode exigir múltiplas abordagens. Para as Insônias transitórias, que duram um ou dois dias, a solução mais prática são os hipnóticos. Atualmente, o uso de hipnóticos tornou-se bastante seguro mas, mesmo quando havia riscos, esses nunca afastaram os pacientes da tentação do sono instantâneo. Os laboratórios do sono procuram estabelecer por meio da história clínica e, às vezes, da polissonografia, as causas da Insônia e instituir tratamentos capazes de corrigi-las.

BENZODIAZEPÍNICOS
Os chamados benzodiazepínicos são classificados de acordo com a duração de sua ação (meia-vida). Nos idosos a meia vida desses medicamentos costuma ser maior, de tal forma que o flurazepam e o diazepam podem chegar a uma meia-vida de mais de 100 horas.

Tanto a sedação do dia seguinte, quanto os efeitos paradoxais (agitação) devem ser muito bem considerados. Tanto sedação do dia seguinte, quanto agitação do efeito paradoxal podem favorecer quedas nos idosos.

Para os idosos, o triazolam e o lorazepam (Lorax®, Mesmerin®) são preferíveis, apesar desse último ter probabilidade de desenvolver dependência. Nesses casos a relação custo-benefício deve ser considerada. Normalmente eles não têm efeito pardoxal e a meia-vida é menor. Particularmente em idosos o lorazepam é o benzodiazepínico com melhor ação hipnótica e ansiolítica. O midazolam (Dormire®, Dormonid®) é o benzodiazepínicos com menor meia-vida, entretanto, numa porcentagem de até 12% dos casos pode haver agitação paradoxal e/ou confusão mental noturna. Isso deve ser previsto e orientado para a família do paciente idoso.

Para pacientes suspeitos de portarem Apnéia do Sono, cujo diagnóstico pode ser suspeitado pelo roncar muito alto e em surtos, devem ser evitados os benzodiazepínicos em geral.

ANTI-HISTAMÍNICOS
Alguns antihistamínicos, como por exemplo, a difenidramina (antialérgico), cicloheptadina (Periatim®) ou a prometazina (Fenergam®) costumam ser usados como hipnóticos por profissionais que evitam benzodiazepínicos. Não se recomenda essa prática, tendo em vista os efeitos colaterais dos antihistamínicos, bem como a grande probabilidade do efeito paradoxal e agitação em idosos.

ANTIDEPRESSIVOS
Alguns antidepressivos tricíclicos, como é o caso da amitriptilina (Amytril®, Tryptanol®) podem ter um bom efeito hipnótico. Na realidade eles são preferíveis quando a eventual causa da Insônia possa estar sendo a depressão.

Nos idosos, entretanto, devemos estar atentos para os efeitos anti-colinérgicos desses medicamentos tricíclicos, tais como a constipação intestinal, a glossite por ressecamento de mucosas, excesso de sudorese, hipotensão e, principalmente em homens idosos, a retenção urinária ou prostatismo.

A nortriptilina (Pamelor®), também um antidepressivo tricíclico, tem menos efeitos anti-colinérgicos e pode induzir também ao sono. A dose capaz de induzir ao sono chega a ser até menor que a dose terapêutica para a depressão. Assim sendo, tendo em vista a ausência de possibilidade de dependência, muitas vezes é preferível induzir ao sono com antidepressivos que com tranqüilizantes.

Outros Sedativos
O zolpidem (Stilnox®) é um hipnótico não-benzodiazepínico e está indicado nos casos deInsônia (ocasional, transitória). O zolpidem atua principalmente sobre os distúrbios do sono e quando usado isoladamente, não se constitui em tratamento para nenhum outro problema psíquico, podendo mascarar outros sintomas emocionais.

Em pacientes idosos com mais de 65 anos recomenda-se que a dose inicial seja de 5 mg e que uma dose de 10 mg não seja ultrapassada. Estudos de farmacologia humana e animal não demonstraram quaisquer efeitos sobre os centros respiratórios, todavia, o uso do zolpidem em pacientes com insuficiência respiratória severa deve ser realizado com cautela, bem como nos portadores de Apnéia do Sono.

O zopiclone (Imovane®) também pertence a um novo grupo químico, farmacologicamente semelhante às benzodiazepinas. É um hipnótico que rapidamente induz o sono, além de mantê-lo dentro dos padrões normais durante a noite (melhora a qualidade de sono). O zopiclone possui uma meia-vida de eliminação curta, sendo rapidamente excretado, não havendo, pois, acúmulo do produto e de seus metabólitos. Nos estudos realizados, mostrou-se que zopiclone não causou dependência nos pacientes em que ele foi administrado.

Ballone GJ, Moura EC - Transtornos do Sono em Idosos, PsiqWeb, internet, disponível em www.psiqweb.med.br,  revisto em 2004.


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