quinta-feira, 26 de março de 2015

O CRIME DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO




O ARTIGO DISCUTE AS PROPOSTAS COM RELAÇÃO A CRIMINALIZAÇÃO DA CONDUTA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO SERVIDOR PÚBLICO.

 
O CRIME DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO
ROGÉRIO TADEU ROMANO
Procurador Regional da República aposentado

A comissão que elaborou o anteprojeto do Código Penal criminalizou o enriquecimento ilícito de funcionários servidores públicos. Tal proposta, que é inovadora, vai na linha do que prevê a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, da qual o Brasil é signatário.
Tal crime já é previsto do México, da Nicarágua, do Peru e da  Colômbia.  
A pena prevista no anteprojeto para tal conduta ilícita é de um a cinco anos de reclusão mais confisco de bens. Caberá ao Parquet, como titular da ação penal, comprovar a ilicitude do enriquecimento.
A redação aprovada considera crime adquirir, vender, alugar, receber, ceder, emprestar, usufruir de forma não eventual de valores ou bens móveis ou imóveis que sejam incompatíveis com os rendimentos auferidos pelo funcionário público em razão de seu cargo ou por outro meio lícito. Tendo sido caracterizado o enriquecimento ilícito e sendo descoberto o crime que deu origem a este enriquecimento, ambos serão punidos.
Para o relator da comissão, procurador da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, ainda que subsidiário de outro, trata-se de um crime de enorme gravidade, quanto mais se levado em conta que é cometido por quem deveria servir, o funcionário público que enriquece sem que se saiba como, aquele que entra pobre e sai rico. O enriquecimento ilícito é a prova viva da eficiência da corrupção.
No entanto, registro que, alguns juristas, em que destaco o advogado Antônio Nabor Bulhões a criminalização comprometeria o princípio constitucional da não-culpabilidade. Também se critica que o tipo puniria a consequência do ato que já está criminalizado pelo Código Penal.
De toda sorte, o  Ministério Público apresentou dez propostas para o combate a corrupção no Brasil.
Dentre essas medidas destaca-se a criminalização do enriquecimento ilícito de agentes públicos.
Seria o caso de posse de recursos sem origem comprovada e incompatível com a renda do servidor com pena de três a oito anos de prisão.
Essa providência seria somada a outras dentre as quais a recuperação do lucro derivado do crime, quando haveria a medida de confisco onde se obrigaria o criminoso a devolver todo o dinheiro que possui em sua conta, exceto recursos que comprovar terem origem lícita. Haveria, outrossim, a hipótese de ação civil de extinção de domínio que possibilitaria recuperar bens de origem ilícita, mesmo que não haja a responsabilização do autor do fato ilícito, em caso de morte ou prescrição, formas de extinção da punibilidade, por exemplo.
Sabido é que o Direito Penal, ultima ratio na ordenação jurídica, depende da congruência do bem, a ser resguardado por meio de tipo penal com os valores constitucionais.
Entende-se que o artigo 37 da Constituição, dentre outros valores, zela por uma Administração proba, eficiente, voltada à legalidade, à moralidade, à publicidade, à impessoalidade, à eficiência, dentre os seus princípios retores. Como tal, a ordem jurídica não pode conviver com o enriquecimento ilícito de servidor público.
Sabido que o servidor público pode praticar crimes como peculato, corrupção, lavagem de dinheiro etc.
Poderá haver o entendimento que existirá um crime exaurido, que será o enriquecimento ilícito
Para Carrara não basta que o crime seja consumado.
A consumação é a última fase do atuar criminoso. É o momento em que o agente realiza em todos os seus termos o tipo legal da figura delituosa, e em que o bem jurídico penalmente protegido sofreu a lesão efetiva ou ameaça que se exprime no núcleo do tipo, como ensinou Anibal Bruno(Direito Penal, Parte Geral, tomo II, 1967).
O crime pode estar consumado e dele não haver resultado todo o dano que o agente previra e visara. Diz-se então que o crime não foi exaurido.
Considerou Rocco(L’oggetto del reato, pág. 326, nota 113) inadmissível a concepção do chamado crime exaurido, argumentando que todo crime produz uma série infinita de resultados que se sucedem e que assim, nunca se pode dizer que o crime tenha produzido todos os efeitos danosos que eram consequência da violação. Colocaram-se em sentido contrário a Rocco, Manzini, Maggiore e Florian.

Há ainda a consideração de Bettiol(Diritto Penale, Parte generale, pág. 378), quando admitiu a noção de crime exaurido em um sentido que ele chamou econômico, no sentido de que é exaurido o crime quando tem produzido em concreto todas aquelas consequências que normalmente é destinado a produzir.
Ferri(Princípios, pág. 524) atribuiu a distinção entre crime consumado e crime exaurido um valor positivo, para avaliação não só da periculosidade do agente, como da gravidade do crime em relação ao dano.
Uma  outra vertente poderá trazer a ideia de que o enriquecimento ilícito de servidor é um crime de fusão.
Mas os chamados delitos de fusión são aqueles delitos relacionados a um outro delito anteriormente praticado por terceiro. É o que ocorre no favorecimento pessoal(artigo 348 do CP) e real(art. 349 do CP), na receptação(artigo 180 do CP), quando prevalece o critério do exaurimento e não da consumação. Enquanto não se tenha exaurido o delito anterior,  as formas de participação no concurso de agentes irão prevalecer sobre os delitos de fusão. O crime de enriquecimento ilícito de servidor será praticado pelo próprio servidor que praticara crime contra a Administração Pública, por exemplo, ou se beneficiara dele.
Há, na verdade,  no crime de enriquecimento ilícito de servidor,  a necessidade de um crime antecedente: peculato, corrupção, lavagem de dinheiro etc. Aliás, o próprio crime de lavagem de dinheiro exige delito anterior, que pode ser contravenção ou crime.
O delito  de enriquecimento ilícito de servidor envolve crime formal e permanente.
Tal como no crime de lavagem de dinheiro, tenta-se impedir que o produto do ilícito possa ser transformado ou dissolvido no meio social, evitando assim, seu confisco, bem como a identificação da autoria e materialidade do crime anterior.
Aquele que legitima os ganhos ilícitos por meio do uso de instrumentos jurídicos que garantam a circulação dos bens atinge a confiabilidade dos negócios jurídicos, daí a necessidade da incriminação de tal conduta.
Em escala crescente, um comportamento dessa espécie envolvendo o enriquecimento ilícito de servidor público pode abalar a economia de um país.
Há bem jurídico ofendido, que é a Administração Pública, razão pela qual o tipo penal(a rigor exige a aplicação do principio da taxatividade), de forma a singularizar ação humana que venha a lesionar ou pôr em risco valores penalmente tutelados(principio da ofensividade).


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