sábado, 21 de março de 2015

Ressonância mórfica – a hipótese do centésimo macaco


Publicado em 8.03.2015
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Sheldrake na fogueira

Quando o biólogo inglês Rupert Sheldrake publicou o livro, A New Science of Life (Uma nova ciência da vida), apresentando suas ideias sobre campos mórficos e ressonância mórfica, a obra foi recebida de maneira contrastante pelas duas principais revistas científicas da Inglaterra.
Foi apontada como “uma importante pesquisa científica” pela New Scientist e ao mesmo tempo qualificada pela Nature como sendo “a melhor candidata à fogueira em muitos anos”.
A hipótese do centésimo macaco
Imagine duas pequenas ilhas tropicais A e B, completamente isoladas.
Ambas possuem uma pequena população de macacos da mesma espécie e com hábitos alimentares muito parecidos.
Raízes e frutas fazem parte de seu cardápio diário.
Numa maré enchente a água do mar invadiu o refeitório dos moradores da ilha A, o pequeno bosque à beira-mar em que viviam.
Casualmente a força da ressaca expôs várias amostras de um tipo de raiz que tanto apreciavam e as deixaram completamente livres da terra.
Na maré vazante, voltando ao refeitório os macacos descobriram que o sabor de seu trivial alimento melhorou de forma pronunciada.
Livres da terra e ainda levemente salgadas aquelas raízes transformaram-se em iguarias.
Com isso, usando sua inteligência, adquiriram o hábito de caminhar alguns metros até a praia apenas para lavar e também temperar seu alimento.
Hábito que passou a ser imitado por todas as famílias daquela população.
Porém, quando o centésimo macaco dessa ilha A dominou completamente a técnica, espontaneamente na ilha B, e sem a influência de nenhuma maré, a prática surgiu como por encanto.
Um macaco muito esperto resolveu, espontaneamente, caminhar até a praia lavar e temperar seu alimento.
Como isso aconteceu? Se não houve nenhuma forma de comunicação convencional entre as duas populações?
Seria uma simples coincidência?
Será que esse conhecimento adquirido pelos habitantes da ilha — lavar as raízes na água do mar antes de comê-las — simplesmente se incorporou aos hábitos da espécie?
Ou existem telepatas entre os habitantes?

Cristais e moléculas
Telepatia à parte, o mesmo se dá com moléculas e cristais.
Quando um novo composto químico é criado, sua forma cristalina é obtida em laboratório com certa dificuldade.
Entre tantas possibilidades geométricas de disposição das moléculas para formar cristais uma forma X é assumida, em detrimento de todas as outras, e algumas porções desse cristal são obtidas.
Até aí nada de fantástico.
No entanto, quando uma certa quantidade dessa substância é cristalizada nesse formato X em um laboratório em Zurique, por exemplo, espontaneamente essa mesma geometria X é adotada pelo composto em laboratórios similares localizados em outras partes do mundo.
Ficou “mais fácil” para esse composto cristalizar depois que a forma X foi assumida por um determinado número de moléculas que fariam aí o papel do centésimo macaco.
Claro que muitos pesquisadores poderiam argumentar sobre a possibilidade de alguma contaminação atmosférica criada por cristais semente, e até a contaminação de correspondências e/ou de visitantes de um laboratório que tenha cristalizado o composto na forma X, etc.
No entanto, ainda não foi dado um parecer definitivo sobre o caso.
Ratos num labirinto e o código Morse
Duas populações de ratos de mesma idade e geneticamente semelhantes são isoladas e tratadas de forma similar em ambientes controlados.
Coloca-se em meio a população A um pequeno obstáculo para se chegar ao alimento (que é obviamente inodoro).
Um labirinto.
Sem a artimanha de usar o faro na solução do problema, os roedores devem descobrir o caminho — e resolver o labirinto — para chegar até o alimento.
Depois de algumas tentativas e erros, acabam casualmente descobrindo o caminho.
Esse processo é cronometrado.
Adivinhem o que acontece depois?
Isso mesmo.
Depois que um certo número de roedores da população A resolveu o labirinto, a solução do mesmo problema na população B se tornou muito mais rápida.
Por quê?
Será que aquilo que já foi aprendido por um certo número de indivíduos fica muita mais fácil de ser aprendido?
Numa pesquisa realizada entre populações da Europa, das Américas e da África os resultados parecem apontar nessa direção.
Em duas ocasiões, os pesquisadores mostraram duas ilustrações (1 e 2) com imagens ocultas para um contingente de pessoas que não conheciam suas respectivas “soluções”.
Entre uma enquete e outra, a figura 2 e sua “resposta” foram transmitidas pela TV— à revelia dos entrevistados — de forma que o contingente de pessoas que aprendessem a solução da figura 2 aumentasse significativamente.
Verificou-se que o índice de acerto na segunda amostragem subiu 76% para a ilustração 2, contra apenas 9% para a 1.
Fora feitas experiências similares apontando que, por exemplo, o aprendizado do código Morse original é muito mais rápido do que um código de comunicação similar (e até muito mais intuitivo) mas que não é conhecido por tantas pessoas no mundo.

A hipótese de Sheldrake
Sem dúvida a proposta de Sheldrake caracteriza uma das mais ousadas e instigantes ideias científicas da atualidade: a hipótese dos campos mórficos.
Segundo o cientista, os campos mórficos são estruturas que se estendem no espaço-tempo e moldam a forma e o comportamento de todos os sistemas do mundo material.
Átomos, moléculas, cristais, organelas, células, tecidos, órgãos, organismos, sociedades, ecossistemas, sistemas planetários, sistemas solares, galáxias: cada uma dessas entidades estaria associada a um campo mórfico específico.
São eles que fazem com que um sistema seja um sistema, isto é, muito mais que um simples conjunto de partes.
Embora possam se fazer uma comparação aos campos magnéticos da física, no entanto, não se trata de transmissão de energia através do espaço-tempo, mas sim de informação.
É isso que mostra o exemplo dos macacos.
Nele, o conhecimento adquirido por um conjunto de indivíduos agrega-se ao patrimônio coletivo, provocando um acréscimo de consciência que passa a ser compartilhado por toda a espécie.
E esse processo de coletivização da informação foi batizado por Sheldrake com o nome de “ressonância mórfica”.
É através dela que as informações se propagam no interior do campo mórfico, alimentando uma espécie de memória coletiva.
Em nosso exemplo, a ressonância mórfica entre macacos da mesma espécie teria feito com que a nova técnica chegasse à ilha “B”, sem que para isso fosse utilizado qualquer meio usual de transmissão de informações.
No caso da nova substância química sintetizada em laboratório – diz ele -, “não existe nenhum precedente que determine a maneira exata de como ela deverá cristalizar-se. Dependendo das características da molécula, várias formas de cristalização são possíveis. Por acaso ou pela intervenção de fatores puramente circunstanciais, uma dessas possibilidades se efetiva e a substância segue um padrão determinado de cristalização. Uma vez que isso ocorra, porém, um novo campo mórfico passa a existir. A partir de então, a ressonância mórfica gerada pelos primeiros cristais faz com que a ocorrência do mesmo padrão de cristalização se torne mais provável em qualquer laboratório do mundo. E quanto mais vezes ele se efetivar, maior será a probabilidade de que aconteça novamente em experimentos futuros”.
Com afirmações como essa, não é de estranhar, que a hipótese de Sheldrake tenha causado tanta polêmica e desconforto na comunidade científica. Principalmente entre os biólogos, cuja a corrente majoritária preconiza a atividade dos organismos vivos à interação físico-química entre moléculas e faz do DNA uma resposta definitiva para os mistérios do fenômeno vital.
Porém, nas palavras de Sheldrake:
“A realidade é exuberante demais para caber na saia justa do figurino reducionista”.
Mesmo concordando com essa visão progressista da ciência, é importante não perdermos o foco do que é ou não científico.
A ressonância mórfica parece ser uma cornucópia mágica que tanto pode abrir um campo completamente novo na ciência, quanto abrigar todo o tipo de crendice pseudocientífica; incluindo aquelas que, não apenas ambicionam o acesso ao inconsciente coletivo, mas que pretendem também o acesso ao número do nosso cartão de crédito.
Mas, isso já é assunto para outro artigo.



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