domingo, 27 de julho de 2014

Representações do golpe de 1964 e da ditadura na mídia - sentidos e silenciamentos na atribuição de papéis à imprensa, 1984-2004



Representations of the1964's coup and the dictatorship in the media - meanings and silences in the roles ascribed to press, 1984-2004


Flávia Biroli
Professora Adjunta do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). Doutora em História pela Unicamp. Instituto de Ciências Humanas - IH. Campus Universitário Darcy Ribeiro. ICC - Ala Norte - Mesanino - sala B1-606 (minhocão norte). CEP: 70.910-900 Brasília - DF.fbiroli@terra.com.br



RESUMO
Este artigo discute representações sobre os papéis assumidos pela imprensa no golpe de 1964, na ditadura e na redemocratização, em textos publicados em jornais e revistas brasileiras entre 1984 e 2004. A análise demonstra como as significações atribuídas ao golpe e à ditadura nos textos jornalísticos sobrepõem-se a discursos que vinculam a prática jornalística à defesa da democracia, tendo por base uma oposição simplista entre liberdade de imprensa e ditadura. A associação entre crise, autoritarismo e um passado já encerrado permite a afirmação da democracia como realidade consensual, esvaziada das disputas e tensões que a caracterizam.
Palavras-chave: imprensa, golpe de 1964, democracia, ditadura

ABSTRACT
This study discuss the form of representation of the role played by Brazilian press in the coup of 1964's dictatorship and redemocratization, in texts that were published in Brazilian papers and magazines between 1984 and 2004. The analysis shows how the meanings assumed by the coup and the dictatorship in the texts are superposed to discourses that tie the practice of journalism to the defense of democracy, based on a reductionist oposition between freedom of the press and dictatorship. The association among crise, authoritarianism and the near past produces a comprehension of democracy as a consensual reality, with no disputes and tensions.
Keywords: press, 1964's coup, democracy, dictatorship



Este trabalho é parte de uma pesquisa sobre as representações do golpe de 1964 e da ditadura militar recente, na imprensa brasileira, nas últimas décadas. O material selecionado para a pesquisa, assim como a problemática destacada, permite uma série de análises, enfocando diferentes questões. Neste artigo, optamos por tratar apenas dos discursos que se referem à atuação da imprensa na crise, no golpe e/ou na ditadura militar recente.1
As seguintes questões orientam a discussão apresentada: como se cruzam as representações sobre a história recente do país e aquelas que são cultivadas pela própria imprensa sobre seu papel (papel do jornalismo, de jornais e de jornalistas) na sociedade? Quais as sobreposições entre as significações atribuídas ao golpe e à ditadura e aquelas que compõem um ethos para o jornalismo, vinculando-o de modo peculiar ao funcionamento da democracia? E ainda, como crise e golpe ganham sentido em uma temporalidade que delimita a compreensão do passado e assegura um lugar de relevância para a imprensa no presente?
1964, como se sabe, é um dos marcos relevantes na história recente do país. Na literatura acadêmica, aparece como ruptura ou momento de inflexão em análises que procuram, ao mesmo tempo, atribuir sentido ao fato e à crise que o engendrou.2 Trata-se de um evento significativo em um imaginário político que é constituído historicamente e que integra as significações sociais que "dão sentido" ao presente e àquilo que "somos".
Cornelius Castoriadis define as significações sociais não como algo que se constitui em relação a objetos e indivíduos a elas exteriores, mas como "as condições do representável e do factível", como "posição primeira, inaugural, irredutível do social-histórico e do imaginário social tal como se manifesta cada vez numa sociedade dada", que define, em cada sociedade, "o que é e o que não é, vale ou não vale, o que pode ser ou valer", dando unidade "à multidão indefinida e essencialmente aberta de indivíduos, de atos, de objetos, de funções, de instituições".3 Essas significações seriam, elas mesmas, temporalidade, no sentido de que não se poderia ter, de um lado, um conjunto de sentidos e, de outro, o tempo lógico-calendário em que esses sentidos se materializariam como história. Para o autor, o social-histórico é um modo de instituição da temporalidade. Assim, a análise de uma sociedade seria inseparável da descrição de sua temporalidade, de sua instituição como uma temporalidade própria.4
Não consideramos que 1964 seja um evento que, por si só, funda uma temporalidade. Consideramos, no entanto, que é um evento-chave na construção de sentidos para as últimas décadas e para a atualidade política, participando da composição da temporalidade que orienta o fazer e o representar social e político.
A mídia pode ser abordada ao menos de duas maneiras em relação a essa problemática: a) como instituição central aos processos de significação nas sociedades contemporâneas e, portanto, dentro da proposta de Castoriadis, como instituição (no sentido corrente) que é central aos movimentos de afirmação-alteração da instituição da sociedade (no sentido que lhe atribui o autor), e b) como ator na crise que engendra o golpe de 1964, na ditadura e no processo de democratização, de forma não-homogênea e não-determinada.

Imprensa e crise política
A relação entre a imprensa brasileira e a crise política que precedeu o golpe de 1964 nos parece importante para a análise dos discursos que, posteriormente, atribuem sentido ao passado recente. Podemos trabalhar com essa questão em pelo menos dois níveis, correlatos às duas maneiras de abordar a mídia que foram indicadas há pouco. Um deles diz respeito aos aspectos de maior duração e que extrapolam os limites da sociedade brasileira, isto é, ao papel assumido pela imprensa na contemporaneidade e às relações entre esse papel e formas de sociabilidade e valores políticos. Estaríamos, nesse caso, no campo das representações de maior duração, que, na esteira do que nos diz Castoriadis, constroem temporalidade e orientam o fazer e o representar social e político. O outro, por sua vez, diz respeito às peculiaridades da atuação da imprensa no Brasil, e especificamente às peculiaridades de sua atuação na crise que antecedeu o golpe, na ditadura e, posteriormente, no processo de redemocratização.
Os dois níveis só podem ser separados por meio de artifícios teórico-metodológicos que nos auxiliam na análise do problema. Fazemos, aqui, essa opção, tratando inicialmente do primeiro deles.
Vários autores, entre eles Gabriel Tarde e Alexis de Tocqueville, no século XIX, e Robert Darnton, Jürgen Habermas e Reinhart Koselleck, no século XX, já observaram as correlações entre os fundamentos do liberalismo e a construção material e simbólica do papel da imprensa a partir da modernidade, fundado sobre a centralidade que a "crítica" e a "opinião pública" assumem com o advento do iluminismo e da esfera pública burguesa.
Em Crítica e crise, o filósofo alemão Reinhart Koselleck analisa, em autores que compõem o pensamento iluminista, a relação que se estabelece entre a percepção da história como progresso e a visão que os intelectuais têm de seu papel e de sua ação no contexto da crise que marca a decomposição do regime absolutista, com suas formas materiais e simbólicas de legitimação. Algumas de suas hipóteses sobre a relação entre crítica, temporalidade e crise no pensamento iluminista parecem-nos particularmente interessantes para esta reflexão.
No processo histórico em que se estabelece a contestação da submissão da moral privada à autoridade do Estado, colocando em questão a divisão entre homem e cidadão que caracterizou o período absolutista, ganham relevância as noções de crítica, julgamento e opinião. A crítica se estabelece como o movimento da moral privada em direção à esfera pública, constituindo, paulatinamente, a legitimidade do ato de julgar as decisões do Estado. Dos súditos, cuja liberdade consistia na manutenção de seus julgamentos e valores em sigilo, passa-se ao cidadão como o portador dos valores que definem a autoridade pública.
Nesse caminho, complexo e não homogêneo, o segredo teria sido a chave por meio da qual se organizou a atividade crítica. Nas lojas maçônicas ou nos salões, a sensibilidade que nasceu da insatisfação com o regime absolutista protegeu-se do Estado pelo segredo, cuja função protetora "encontrava seu correlato espiritual na separação entre moral e política".5 A transição de uma liberdade interior moral para uma liberdade exterior política teria sido encoberta pelo segredo, não apenas para o Estado, mas também para aqueles que a viveram. Se foi por meio do segredo que a consciência privada pôde ampliar-se, foi também nesse movimento que se constituiu uma atividade crítica que se apresenta como fundada em juízos morais universais e em uma competência que deles nasceria para julgar, de fora, o domínio da política.
Desse modo,
a crítica política não reside somente no juízo moral enquanto tal. Está presente no momento em que se executa a separação entre uma instância moral e uma instância política, não só por submeter a política a um juízo severo, mas também, pelo contrário, por separar-se como uma instância que tem a faculdade de julgar o domínio da política. Esta separação já encerra a crítica ao Estado.6
Essa divisão, que é ao mesmo tempo pressuposto e conseqüência da crítica política tal como se constitui, sobretudo no século XVIII, está na base do pensamento liberal. O paradoxo destacado por Koselleck nos aparece, assim, como um dos nós desse mesmo pensamento: a composição de uma crítica política que se estabelece na medida em que nega seu caráter político, a materialização de uma crítica ao presente que constrói suas bases de legitimidade na medida em que obscurece seus liames com os conflitos presentes, situando no futuro o lócusde sentido da crítica e dos críticos.
A estrutura temporal da crítica corresponderia, assim, à noção de progresso. A obrigação do crítico seria em relação ao futuro. "A vinculação com o futuro, criada pelo próprio juiz racional", o teria emancipado para criticar o presente, "proporcionando ao executor da crítica, no presente, um espaço de absoluta liberdade".7 Segundo Koselleck, é esta vinculação com o futuro que, ao mesmo tempo, isenta os atores de sua responsabilidade política e encobre até o fim o fato de que existe crise política e que a crise, como tal, exige decisões políticas.
O autor explicita a relação entre crise e abertura/indeterminação:
Pertence à natureza da crise que uma decisão esteja pendente, mas ainda não tenha sido tomada. Também reside em sua natureza que a decisão a ser tomada permaneça em aberto. Portanto, a insegurança geral de uma situação crítica é atravessada pela certeza de que, sem que se saiba ao certo quando ou como, o fim do estado crítico se aproxima. A solução possível permanece incerta, mas o próprio fim, a transformação das circunstâncias vigentes – ameaçadora, temida ou desejada –, é certo. A crise invoca a pergunta ao futuro histórico.8
O estatuto paradoxal da crítica iluminista, porém, permite que, ao mesmo tempo, represente a crise como abertura, mas o faça em uma filosofia da história capaz de antecipar sua resolução como algo que se daria no plano moral, considerando-a, como tal, pré-determinada. Dizendo de outro modo, a "pergunta ao futuro" é feita apenas se e na medida em que se delimita ao leque de respostas possível em uma projeção homogênea do tempo, que procura dominar a alteridade que é constitutiva do social-histórico.
Voltando às palavras do autor,
a filosofia da história, mediante a qual o burguês antecipa o fim da crise, garantia que a decisão esperada expressava um juízo moral, pois 'a razão prática reinante', como dizia Kant, era capaz de fornecer a interpretação 'autêntica' da história – uma história como processo moralmente legal. Assim, a guerra civil foi invocada na medida em que seu desenlace já estava fixado. A crise, como crise política, permanecia encoberta.9
Ao dizer que a crise, como crise política, permanecia encoberta, Koselleck refere-se ao fato de que permanece encoberto o caráter indeterminado dos eventos humanos, que traz para o centro da complexidade dos eventos e crises as decisões tomadas pelos atores, sua ação em relação a um presente que não está definido e que não é uma etapa pré-significada de um tempo histórico homogêneo (do progresso ou da decadência).
A percepção do tempo histórico como tempo evolutivo-progressivo, situando a crise como uma espécie de intensificação do tempo em direção a um outro que é apenas o desdobramento do mesmo, faz com que a crítica se construa e se exerça apenas dentro dos limites que negam sua existência como crítica política. Se, inicialmente, a necessidade do segredo constrói essa representação, posteriormente, a construção de um lugar para o crítico no futuro delimita seus traços.
É central à análise de Koselleck a percepção de que a crítica e a desvinculação dos atores em relação ao tempo presente constituem uma mesma dinâmica. Nela, seria representada a superioridade de uma crítica que, de forada política e, como tal, do próprio presente, seria capaz de julgá-la e trazer à luz a verdade ocultada (pelo Estado, pela autoridade). A crise como instante de indeterminação seria, assim, ocultada pela crise vista como episódio de um desenvolvimento já previsto rumo ao futuro, que asseguraria ao crítico seu pertencimento aos "novos" tempos, na medida em que ele seria portador da ação que denuncia os obstáculos a uma verdade anunciada, localizada no futuro.
No âmbito deste trabalho, permitimo-nos relacionar a análise de
Koselleck à análise feita por Myriam Revault D'Allonnes sobre o "desaparecimento da política" como um lugar comum na representação das sociedades modernas e contemporâneas. Ou, como o entenderíamos seguindo Castoriadis, como um dos aspectos relevantes da significação social e da instituição das sociedades modernas ocidentais segundo valores e formas de sociabilidade peculiares.
Se, por um lado, D'Allonnes localiza essa problemática na conhecida contraposição entre "liberdade da política" e "liberdade para a política", que orientaria, com a dominância do primeiro pólo, as representações modernas sobre o político, por outro lado alerta para o fato de que a filosofia política não apresenta um caminho adequado para se pensar esse estatuto esvaziado do político na modernidade – e da ação humana nas formas modernas e contemporâneas de instituição da sociedade. O problema, nesse caso, estaria na divisão entre verdade e opinião; na incapacidade dos filósofos, destacada por Hannah Arendt, de "descer" ao mundo da cidade. O ponto que nos interessa diz respeito ao fato de que o "desaparecimento da política" estaria relacionado a uma vontade de dominar e a uma incapacidade essencial: "vontade de dominar a "fragilidade" das relações humanas e incapacidade de com ela se defrontar".10
Ao tratar da política, que entende subsumida, a partir da modernidade, à história ou à moral, indica uma problemática semelhante à de Koselleck. Para a autora, em uma interpretação calcada na de Hannah Arendt, a sobreposição de uma filosofia da história a uma filosofia política estaria relacionada a um desejo de remediar os embaraços e a imprevisibilidade da ação. Para tanto, a modernidade teria buscado "no conceito de 'processo' um remédio para a fragilidade do agir", teria substituído o agir pelo 'fazer', afirmando que os homens, mesmo sem o saber, mesmo sem o querer, 'fazem' a história".11 A crítica se dirige, explicitamente, a Hegel e Marx: neles, a filosofia da história englobaria a política, submetendo-a a um sentido – o sentido histórico do engrandecimento da razão, do direcionamento a uma história Total sob o signo da razão. A concepção hegeliana de história aboliria irremediavelmente a dimensão política do agir.
Como esclarece D'Allonnes, "não é a história como dimensão – ou como horizonte – da existência que coloca problemas à ação e à política, é a História como recapitulação e recoleção global de um Sentido. É a idéia de que há uma 'última palavra da história' que é seu julgamento final",12 em uma representação da história onde coincidiriam o resultado do devir e a realização da promessa. Está implícita nessa análise a concepção arendtiana de que a política se realiza como contingência, e não pode existir quando se abole, ou se procura abolir, a fragilidade que seria característica do agir político. Daí o foco na vinculação entre uma filosofia da história que procuraria abolir a contingência (seja naturalizando a política e fixando-a a partir de uma origem definida, seja submetendo-a a uma história que tem condições definidas e sentido esperado) e a noção de desaparecimento da política.

Dominar o tempo, garantir a eficácia do ethos
O recurso a essas reflexões se deve, especificamente, à hipótese de que existe uma correlação entre a noção iluminista de "crítica" (Koselleck),
o esvaziamento do político como dimensão da história (Koselleck e D'Allonnes) e a construção de um lugar neutro, apaziguado ou exterior aos conflitos, para a imprensa. Esse lugar, constitutivo do ethos assumido pelo jornalismo, implica na sobreposição de dois aspectos: um, supostamente técnico, refere-se à objetividade como valor, procedimento e forma de legitimação do trabalho e do discurso jornalístico; outro, reconhecido como político, refere-se ao liberalismo como um conjunto de valores não apenas associados à imprensa, mas que seriam sua condição de existência, marcando-se, entre outras coisas, por uma "defesa da liberdade de expressão que silencia sobre a relação intrínseca entre as formas de concentração de poder e as possibilidades e restrições ao exercício dessa liberdade". Ao longo do século XX, pode-se observar uma transposição, das referências à tradição liberal, para um conceito amplo (e de certo modo esvaziado) de democracia na construção de identidades e relevância para o jornalismo. De maneira correlata, a liberdade de expressão continuaria, predominantemente, a ser tematizada sem uma referência ao funcionamento das empresas jornalísticas, à concentração de recursos e poder que permite delimitar o que é "livremente" dito e publicizado.13
No período que delimita o objeto de análise dessa pesquisa, convivem de forma peculiar estratégias para a afirmação da objetividade e o recurso à democracia como "lugar comum", no sentido trabalhado por D'Allonnes, isto é, como clichê, como estereótipo, em formulações nas quais "o consenso é o correlato da imprecisão semântica e da diluição do conceito".14
Embora não seja objetivo deste trabalho tratar da atuação da imprensa brasileira na crise que antecedeu o golpe de 1964, mas discutir as representações recentes sobre o golpe e a ditadura nas páginas de jornais e revistas, é necessário indicar alguns aspectos relacionados àquela atuação.
Durante o chamado período democrático de 1945-64, a maior parte dos jornais e revistas da grande imprensa alinhou-se, em momentos-chave, a posicionamentos anti-getulistas que constituíram ações e opiniões golpistas. Isso pode ser observado durante os trabalhos da Constituinte de 1946, a campanha para as eleições de 1950, a CPI do jornal Última Hora (único jornal, entre os de maior circulação, ligado a Vargas durante todo o período), as semanas que antecederam o suicídio de Vargas, as eleições de 1955, e, sobretudo, o período entre a renúncia de Jânio Quadros e o golpe de 1964. Como se sabe, a polarização entre getulismo e anti-getulismo sobreviveu ao suicídio de Vargas e esteve relacionada a uma série de elementos que compuseram o debate e os conflitos políticos no período, e que não cabe aqui discutir. Quando o foco das críticas se voltou para Goulart, sobrepuseram-se anti-getulismo, anti-comunismo, resistência à centralidade cada vez maior dos sindicatos na política, resistência a mudanças sociais e à exposição ampliada de demandas dos trabalhadores; resistências, enfim, às transformações em curso, que poderiam reconfigurar os limites do debate público e da esfera política no Brasil. Os artigos publicados pelo jornalista e político udenista Carlos Lacerda na Tribuna da Imprensa naquele momento são, talvez, o exemplo mais forte dessas sobreposições.
É importante, para os objetivos deste trabalho, lembrar que os principais jornais do país posicionaram-se, naquele momento, a favor do afastamento de Goulart e, com ênfases e envolvimento diferenciados, a favor de um golpe que, ao afastá-lo, restauraria a "ordem" e protegeria o país da demagogia, do sindicalismo, do comunismo, da subversão dos valores, de uma suposta ditadura de esquerda. É importante, também, ressaltar que, se não era possível, então, compreender que o golpe se desdobraria em uma ditadura militar que duraria mais de 20 anos (a expectativa de muitos era de um retorno próximo a eleições que, expurgado o campo político, levariam ao poder seus candidatos), a aposta de que ele traria ganhos para algumas empresas e empresários da área de comunicação confirmou-se ao longo do regime (os casos da Rede Globo e do jornal Folha de S. Paulo são os mais conhecidos).
Em trabalho anterior,15 pudemos observar que muitos dos textos escritos após a intensificação do arbítrio e da violência, que caracterizaram desde o início a ditadura, recorrem a elisões que têm como efeito uma caracterização do jornalismo dos anos 50 como atividade democrática, em defesa da democracia, em estratégias de planificação que objetivam conservar um status de credibilidade para o jornalismo e para os grandes jornais nas décadas recentes, após o término do regime militar. Pouco ou nada se diz sobre a crise como momento não determinado, em que decisões e posições diferenciadas puderam ou poderiam ter sido assumidas.
Jornalistas ligados ao Correio da Manhã e a O Estado de S. Paulo, estudados de maneira mais atenta, descrevem esses jornais como combativos, vinculando a imprensa à derrocada do Estado Novo e ao clima de liberdade (pouco problematizada, já que delimitada por percepções liberais bastante estáveis) do período que se encerrou com o golpe de 1964, para então, em um salto significativo, vinculá-la ao combate à censura do pós-64, sobretudo a partir de 1968. O silêncio, crucial à construção da memória, deve-se ao envolvimento de jornais e jornalistas com a queda de governos (Vargas em 1954, João Goulart em 1964), em ligações mais ou menos estreitas com articulações golpistas (contra Vargas, Juscelino e Goulart) e com o elitismo autoritário da União Democrática Nacional (UDN). Silenciam, assim, sobre o fato de que as relações entre imprensa e política emtempos de democracia se caracterizaram, inúmeras vezes, por práticas negadoras de aspectos centrais à política democrática, como a não aceitação das opções contidas no voto, a não aceitação do confronto como constitutivo da política e das sociedades e, para fazer uma referência explícita às discussões em Koselleck e D'Allones, a não aceitação da indeterminação que constitui a política e a democracia.
O caderno comemorativo dos 125 anos do jornal O Estado de S. Paulo, publicado no ano 2000, é um exemplo significativo das construções de memória às quais acabo de me referir. O título do texto que expõe a trajetória do jornal, "O Estadão faz 125 anos, mas só conta 120. Erro de cálculo? Não, intervenção mesmo", refere-se aos cinco anos, entre 1940 e 1945, durante os quais o jornal esteve sob intervenção da ditadura de Vargas. No decorrer da ditadura do pós-64, e depois dela, o Estado procurou fixar uma imagem de agente favorável à democracia, construída por meio de afirmações e silêncios:
Em 1940, a ditadura Vargas, incomodada com a postura editorial do Estadão, invade sua sede e expulsa diretores e jornalistas. Durante 5 anos, o Estadão não foi o Estadão. Só a partir de 1945, novamente sob a direção da família Mesquita e tendo à frente Júlio de Mesquita Filho e Francisco Mesquita, o Estadão voltou a ser um jornal livre. E voltou a denunciar. Mas em 1971, com os militares no poder, censores são instalados nas redações dos jornais, vetando quaisquer notícias sobre prisões e protestos ou declarações contrárias ao regime ditatorial. Para fazer resistência, o Estadão usou uma arma bastante poderosa: a poesia. 660 trechos de Os Lusíadas, de Camões, foram usados no lugar das matérias censuradas. Era uma forma de mostrar aos leitores que alguma coisa estava errada. E de mostrar aos generais que era impossível fazer calar nossos jornalistas.
É particularmente significativo o salto da intervenção durante o Estado Novo e da liberalização, em 1945, quando o jornal retorna à família Mesquita, para o ano de 1971, quando o Estadão passa a sofrer censura sistemática do regime que Júlio de Mesquita Filho ajudara a criar. Aproximadamente 16 anos estão ausentes da narrativa.
São vários os elementos que constituem essa lacuna, relacionados aos movimentos da memória e à adesão à democracia como "lugar comum", nas décadas recentes. Seguem algumas hipóteses a respeito. Parece haver dois (ou mais) Vargas constituídos nas memórias predominantes. A um deles, o Vargas ditador, do Estado Novo, parece ser mais viável a oposição (apesar de este Vargas misturar-se ao das leis trabalhistas, trazido à memória de maneiras diversas). A um outro, ao Vargas que, eleito democraticamente em 1950, teria sido pressionado por forças oposicionistas, ou antipatrióticas, como foram definidas na carta-testamento, a oposição, mesmo que nas teias das histórias e memórias, é assunto delicado. No caso de Juscelino Kubitschek, um vencedor na memória política brasileira, associado a palavras-chave do circuito de valores do campo político presente, como desenvolvimento, crescimento e democracia, figurar na oposição se torna ainda mais complicado. A estes terrenos perigosos e escorregadios da experiência política brasileira e das lideranças consagradas pelo tempo é que o Estadão esquivou-se no texto comemorativo dos 125 anos. Esquivou-se também em relação ao início dos anos 60 e à articulação do golpe, na qual Júlio de Mesquita Filho teve um papel importante.16
Um dos pronunciamentos do então governador da Guanabara, Carlos Lacerda, nos dias posteriores ao golpe, faz referência a essa atuação de Mesquita Filho, expondo percepções sobre a atuação de O Estado de S. Paulo e a biografia de seu diretor que seriam, posteriormente, cultivadas pelo jornal – devidamente lapidadas, como se discutirá mais adiante. Em seu pronunciamento à TV Rio, em 04/04/1964, Lacerda saúda Júlio de Mesquita Filho, que entra no palácio da Guanabara durante o pronunciamento:
Não haveria nada disto no Brasil se o dr. Júlio Mesquita, que perdeu o seu jornal, que perdeu anos de vida na prisão e no exílio (...) que teve tão grande parte de sua vida aperfeiçoada pelo sofrimento por amor ao Brasil, não haveria nada disso se novamente, com a mesma coragem daqueles tempos de mais jovem (...) ele não houvesse jogado, não só o que construiu, o seu grande jornal, que é talvez a maior universidade do Brasil, o Estado de São Paulo, se não jogasse tudo isto (...) num só esforço, o esforço de salvar os Brasileiros, a liberdade e a honra.17
Se em 1964, logo após o golpe, foi possível associar a atuação de Mesquita nos anos 60 à oposição do jornal ao Estado Novo, décadas depois, como se viu, o caderno comemorativo do jornal expõe a cisão entre as duas atuações, constituindo um silêncio que permite a projeção de um ethos homogêneo de defesa do liberalismo e da democracia, silenciando sobre crises das décadas de 50 e 60 e o golpe de 1964.
Dois dos textos que compõem a pesquisa atual, publicados no jornal O Estado de S. Paulo em 31/03/1994, como parte de um conjunto de matérias intitulado "30 anos depois...", referem-se à atuação do Estado e a Júlio de Mesquita Filho já nos marcos desse discurso repleto de lacunas relativas ao golpe.
Um deles, assinado por Oliveiros Ferreira,18 enfoca a censura sofrida pelo jornal como núcleo de uma narrativa que expõe a empresa, os Mesquita e os jornalistas em geral ora como vítimas da ditadura, ora como heróis de um combate em tempos difíceis. A crise, nesse caso, se constitui justamente nessa oposição entre censura e livre expressão, tendo, por isso mesmo, sua força, seus elementos trágicos, sua indeterminação esvaziados e controlados. A crise de fato, com seus muitos elementos vinculados aos conflitos acerca dos rumos que o país tomaria na década de 60 ou, posteriormente, durante o regime, é marginal ao discurso. Os destaques na matéria (linha fina e olho, como são chamados nas redações) confirmam o discurso assumido: "O arbítrio da censura contra o Estado foi uma luta da qual a Redação saiu vitoriosa" e "um tempo difícil e digno para todos nós".
Ao longo do texto, Ferreira fala da presença dos censores no jornal, a partir de 13 de dezembro de 1968, e das agressões e censuras sofridas pelos jornalistas, entre os quais inclui Júlio de Mesquita Filho e Júlio de Mesquita Neto: "foi uma época feita para os que sabiam jogar o jogo da guerra", "foi uma época em que se investigava tudo – e aí começou a ser demolido o braço empresarial do Estado e começaram as denúncias da miséria, do descalabro do meio ambiente, da situação dos índios". Os pólos censura versus liberdade de informação, que orientam o discurso, são, então, coroados pelo seguinte enunciado: "Foi uma luta em que triunfamos, nós da Redação".19
No âmbito do discurso assumido, uma vitória teria sido anunciada previamente, a da liberdade. O discurso se constitui por uma separação clara entre "dois lados", o da ditadura e o da liberdade – o jornalismo estaria, necessariamente, do lado da liberdade, como ator destacado na concretização daquilo que os tempos fatalmente trariam.
Logo abaixo do texto assinado por Oliveiros Ferreira, um outro, assinado por Paulo Francis, se propõe a falar sobre um "enigma" não explicado nas publicações sobre o golpe. Está presente nesse texto uma das temáticas importantes no material da presente pesquisa, a do golpe dentro do golpe, que aparece como uma defesa de Castelo Branco e daqueles que, a seu redor, teriam tentado conduzir o regime diferentemente, resistindo ao aprofundamento da repressão. As pressões da "linha dura", no entanto, teriam levado Castelo a extinguir os partidos (AI-2) e, especialmente, a estender seu mandato para um período de dois anos, não realizando as eleições presidenciais previstas para 1965. Esta seria uma das versões sobre a ditadura que, como sustenta Carlos Fico (2004a, p. 32), "por repetição, fixaram-se no senso comum como aceitas". A legenda da foto que está no centro da matéria é um exemplo claro da afirmação desse senso comum, que se constitui como memória: "Castelo, chefe do 'grupo da Sorbonne', tinha intenção de manter o regime democrático, mas perdeu espaço para a 'linha dura".20
Voltando a Francis, o "enigma" tratado no texto diz respeito ao fato de que dois dos poderosos civis que apoiaram o golpe, e tinham pretensões a se candidatarem às eleições, não tenham conseguido impedir que Castelo Branco obtivesse a aprovação do Congresso Nacional para a extensão de seu mandato. Os poderosos aos quais se refere são Carlos Lacerda e Magalhães Pinto. Segundo Francis, eles teriam força, na época, para manipular ao menos 50 votos no Congresso e impedir a vitória de Castelo, mas se omitiram. "Seus partidários da imprensa – diz – cobraram deles essa omissão. Nada disseram. Por que? Por que sabiam que era inútil resistir ao rolo compressor militar? Por que não quiseram enfrentar o risco de se declarar contra os vitoriosos de uniforme de 1964? Nunca se soube". E finaliza o texto, dizendo:
Se Carlos Lacerda, com a sua conhecida fúria polêmica e capacidade de articulação, e Magalhães Pinto, com a sua reconhecida destreza em manobras políticas, tivessem se oposto à extensão do mandato de Castelo Branco, talvez o Brasil de hoje fosse bastante diferente do que se tornou nos 30 anos, entre 1964 e 1994.21
Além dos silêncios que permitem a afirmação das intenções legalistas de Castelo, há outros, aqui, mais centrais ao tema deste artigo (o da participação da imprensa no golpe e das representações posteriores acerca dessa participação) e à sustentação do discurso assumido por Francis. Que "partidários da imprensa" cobraram de Lacerda e Magalhães Pinto uma outra posição, uma confrontação com Castelo?
Enunciado imediatamente abaixo de um texto em que Júlio de Mesquita Filho aparece como vítima e herói do embate entre ditadura e liberdade de expressão, o "enigma" apresenta muitas pistas que permitiriam solucioná-lo, entre elas o apoio de Mesquita à manutenção de Castelo no poder.22
Em carta datada de 12 de maio de 1964, dirigida a Carlos Lacerda e assinada pelo próprio Júlio de Mesquita Filho, o diretor do Estadão elogia a atuação de Lacerda na Europa, enviado para a divulgação da nova ordem que se constituíra com o golpe. Mesquita fala nas proporções assumidas pelo "nosso movimento", elogia Castelo Branco ("finalmente pusemos a mão numa personalidade de primeira ordem") e expressa seu apoio à intenção de Carlos Lacerda de suceder Castelo na presidência da República ("da sua eleição dependerá, segundo estou convencido, o resultado final do nosso movimento"). Mesquita expressa, no entanto, sua opinião de que a presidência de Castelo não deveria estender-se apenas até a data, estabelecida inicialmente, de outubro de 1965 – assunto ao qual Francis se referiu, no próprio jornal dos Mesquita, em 1994. Essa posição é relativamente conhecida: o mandato do primeiro presidente militar deveria ser prorrogado por três anos. O que chama a atenção é a maneira como a explicita, com a intenção de convencer Lacerda de que a prorrogação não comprometeria sua candidatura, como "líder incontestável da nova democracia". Suas palavras: "precisamos queimar até o último cartucho em defesa de uma oportunidade como a vitória de 31 de março, que não se repetirá nestes próximos cinqüenta anos".

Um lugar garantido para o jornalismo no presente
No material pesquisado, há poucas referências à participação de jornais e jornalistas no golpe. A maior parte das reportagens e artigos sobre a atuação da imprensa assume o discurso de que falávamos há pouco, ao tratar de O Estado de S. Paulo, opondo repressão à busca pela liberdade de expressão e informação. Em 1984, no material relativo aos 20 anos do golpe, e em 1985, no material relativo à campanha pelas diretas e à eleição do primeiro civil pelo Colégio Eleitoral após 21 anos de ditadura, nenhuma matéria explicita esse envolvimento. Em 1994, aFolha de S. Paulo o faz, ainda que em representações que não desestabilizam a polarização entre censura e liberdade de imprensa, ditadura e resistência. Em meio aos lugares comuns sobre o combate entre ditadura e imprensa e sobre a publicação de receitas de bolo em lugar de material jornalístico, afirmando que "a censura imposta à imprensa" era mais rígida quando se tratava de "defender o aparelho de segurança ou ocultar rachaduras no monolítico sistema instaurado pelo regime militar", o texto traz a seguinte passagem:
Otávio Frias Filho, atual diretor de Redação da Folha, diz que 'durante o período inicial, o regime militar teve apoio de praticamente toda a mídia. Seguiu-se um período intermediário, que coincidiu com o endurecimento do regime, em que algumas publicações, entre elas O Estado de S. Paulo, tiveram uma atitude de resistência. A Folha não tinha condições de levar adiante uma resistência desse tipo, mas teve uma participação realmente importante no terceiro período do regime militar, a partir do final do governo Médici e início do governo Geisel, quando o jornal contribuiu muito para a redemocratização.23
Nenhuma palavra sobre o que significa "não ter condições" ou sobre o apoio à repressão. Menos de um mês depois, uma reportagem sobre a campanha pelas diretas reforça o discurso anterior. "Folha apoiou primeiro" é o título do Box, no qual se lê não apenas que a Folha foi o primeiro veículo de imprensa a apoiar eleições diretas para a sucessão de Figueiredo, mas também que foi o que "se empenhou mais abertamente pela aprovação da emenda Dante de Oliveira", publicando vários editoriais nesse sentido e lançando "a idéia de se utilizar a cor amarela como a expressão do desejo de se votar para presidente".24
No material do ano de 2004, dois jornais tratariam explicitamente do apoio ao golpe (O Globo e, novamente, Folha de S. Paulo) e um deles (Jornal do Brasil) trataria do assunto indiretamente, por meio de uma entrevista com a historiadora Beatriz Kushnir.
O jornal O Globo é o que chega mais perto de uma ruptura ou deslocamento em relação aos discursos mais estáveis (censura versus liberdade de expressão). O título – Militares assumiram com apoio da imprensa – e a linha-fina – "Desde o começo do golpe a mídia teve uma relação amistosa com a ditadura" – abrem o texto, no qual se lê:
O traço mais forte da relação com o poder, em 21 anos de regime, não foi exatamente o de confronto, embora eles tenham existido em alguns momentos. Desde o início, marcado por um apoio unânime e entusiasmado, a chamada grande imprensa teve um convívio amistoso com os militares, razão pela qual até a censura prévia foi irregular e localizada no período.
A reportagem trata, inclusive, do apoio do Globo ao golpe. Transcreve trechos de editoriais, reproduz capas de alguns dos principais jornais no mês de abril de 1964, faz referências ao apoio da Folha ao regime já durante o governo Médici e transcreve um trecho do Dicionário Histórico-Biográfico da FGV em que O Globo é descrito como "o mais governista dos jornais". A discussão não se restringe a essa edição do jornal, estando presente também em outras edições nos meses de março e abril de 2004.
Nossa hipótese é de que esse posicionamento crítico se sustenta e é possível na medida em que se assume a existência de uma ruptura entre passado e presente, de uma ruptura entre autoritarismo e democracia que constituiria os modos de agir da mídia no presente. Assim, mesmo quando se assume que a polarização entre ditadura e imprensa não corresponde à complexidade desse processo e às ações de jornais e jornalistas, como nas matérias do jornal O Globo, há uma clara associação entre crise, autoritarismo e um passado já encerrado que se abriria para a democracia como realidade consensual. Daí a possibilidade de se assumir erros, expor o envolvimento com o regime: hoje, implícita ou explicitamente propõem os discursos, somos todos democratas e a imprensa assume seu papel.
Um artigo de Carlos Heitor Cony, publicado na Folha também em 2004, expõe justamente esse aspecto das representações predominantes. No artigo, fala, inicialmente, do apoio amplo ao golpe. O Correio da Manhã, onde trabalhava e onde foram publicados os famosos editoriais pedindo o afastamento de Jango, é caracterizado, no entanto, não por esse apoio, mas por ter sido o primeiro jornal a colocar-se contra "a maioria dominante que incluía militares, empresários, igreja e povo em geral. E a própria mídia". O mais interessante é que o artigo caminha de um "todos a favor do golpe", passando pelos primeiros atos de resistência, a um "todos contra o regime ditatorial". Quando o Correio passou, mais tarde, a denunciar a tortura, a violência e a "burrice" do "movimento" de 64, diz Cony, não ficou sozinho na denúncia crítica, "que logo se tornou aspiração de todos e pela qual tantos morreram".25
O jornal O Estado de S. Paulo, de maneira correlata ao caderno dos 125 anos, discutido antes, em nenhum momento menciona sua participação. Em 2004, como em 1994, o jornal tematiza a censura sofrida e destaca a atuação de Júlio de Mesquita Filho e a repressão contra o jornal. O marco inicial das narrativas não é 64, mas 68, quando o Estado passa a sofrer a censura do regime. No texto, 12 de dezembro de 1968 marca o início de "um dos piores períodos de censura à imprensa no país". Durante o governo Castelo Branco, a censura e a repressão teriam sido focadas em "jornais de tendência política mais à esquerda", mas teria prevalecido "uma certa liberdade": "na oficina do Estado, naquela madrugada [de 12/12/1968], até ela começava a desmoronar".26
Assim, predominantemente, as referências ao tema, em 1994 e 2004, oscilam, assim, entre a negação e o reconhecimento da participação da imprensa no golpe de 1964 e da complexidade de suas relações com o regime, mas sem romper com uma oposição simplista entre repressão e liberdade, que orienta sua inserção no presente. Há dois textos, apenas, que de maneiras diferenciadas ultrapassam a oposição simples entre ditadura/passado e democracia/presente.
Um deles é o artigo publicado em 1994 pelo jornalista Fernando Pedreira, no Jornal do Brasil. É menos interessante para a discussão feita neste trabalho, por não tocar na relação específica entre veículos de imprensa e a ditadura, ou nos limites estruturais à liberdade de expressão e à liberdade de informação, mas trata criticamente a liberdade que teria sido conquistada.
Trocamos a liberdade pela aparência da liberdade; pelo seu fantasma colorido. As pessoas se vestem como querem, mas se vestem todas com as mesmas roupas. Pensam o que querem, mas pensam todas as mesmas coisas. É uma 'liberdade' de massas, para as massas, regulada e administrada pelo marketing, pela mídia e pela moda.27
O outro é mais relevante para este trabalho. Foi publicado na revista Carta Capital e assinado por Aloysio Castelo de Carvalho, autor de tese de doutorado sobre a CPI do jornal Última Hora.28 Destoa do discurso predominante porque, ao expor a participação da imprensa no golpe, levanta hipóteses sobre as razões dessa participação, ao invés de apresentá-la como uma espécie de equívoco corrigido pelo tempo. Segundo a análise de Carvalho, jornais da grande imprensa teriam atuado na reestruturação do poder em 1964 como braço ideológico da burguesia, em associação com o capital internacional (o que alinha o autor à tese de René Armand Dreifuss, 1987). Ele problematiza, ainda, a projeção que posiciona a imprensa no "papel de autêntica representante da sociedade", valorizando a "imprensa privada como espaço público para direção do processo político", em detrimento de outras formas de representação e participação. Nesse sentido, segundo o jornalista, "a concepção liberal de valorizar o papel mediador da imprensa na crise das instituições representativas teve um conteúdo conservador".29
Aponta, pois, para uma análise que trata da atuação da imprensa superando a oposição simplista entre censura de Estado e liberdade, conferindo a essa atuação caráter político, ao mesmo tempo em que aponta para explicações de caráter estrutural. As perspectivas que constituem esse discurso, como foi dito, não obtiveram espaço em outros veículos e reportagens que compõem o material pesquisado.

Crítica e refúgio no passado
A maior parte das matérias que compõem nosso objeto de análise constrói-se na contraposição entre censura de Estado e luta em prol da liberdade de imprensa, ditadura e resistência. Além das discussões já citadas, são muitas as matérias que tratam da atuação de jornalistas individualmente, sem referência à posição das empresas para as quais trabalhavam, construindo-os como heróis de um tempo que se foi, politicamente ativos em um tempo de polaridades e conflitos dos quais o presente se teria esvaziado. Indicamos, nessas formulações, a convivência entre uma relação heroicizada com o passado e o esvaziamento do presente como tempo de conflitos, aberto a decisões e a formas de comprometimento.
O material é povoado por testemunhos de jornalistas sobre momentos de tensão associados à crise, ao golpe, à ditadura, ao exílio forçado. Diferentemente da questão anterior, a da participação das empresas no golpe e na ditadura, este aspecto do material aparece de maneira bastante homogênea em 84, 85, 94 e 2004.
Textos publicados pelo Correio Braziliense na edição de 31 de março de 1985, focados em depoimentos, compõem-se de representações bastante semelhantes, por exemplo, àquelas que constituem o caderno especial sobre o golpe publicado pelo Jornal do Brasil em 11/04/2004. Neste último, o artigo "Aventura em campo minado" relata a experiência de um jornalista do Última Hora em 31 de março de 1964, em busca de uma entrevista com o general Olímpio Mourão Filho, enquanto um outro, "A história pela lente de uma Rolleyflex", relata a experiência do jornalista Alberto Jacob, no Palácio da Guanabara, durante a noite de 1º de abril: "Como profissional, Alberto Jacob cumpriu sua função, documentando cada lance, cada fato. Como cidadão, revela, sentiu-se triste, profundamente triste por estar diante de um futuro incerto, ainda inatingível pelas lentes da sua Roleyflex".
Nos vários artigos, notas e reportagens publicados, baseados em testemunhos, não há qualquer discussão mais abrangente ou minimamente contextualizada sobre a as relações entre a imprensa e a queda de Jango, entre a imprensa e o regime. Em geral, a estrutura é: "fulano" esteve presente a tais "fatos", "beltrano" arriscou-se para conseguir informações durante a repressão exercida pelo regime.
A edição de 04/04/1984 da revista Isto é publicou 24 depoimentos sobre o golpe e a ditadura, dados por políticos, jornalistas, poetas, militares, artistas. São, em geral, críticos ao golpe e à ditadura, como os do jornalista Raul Ryff ("a revolução de 1964 inviabilizou o Brasil"), do poeta Carlos Drummond de Andrade ("A vida pública nesses vinte anos deteriorou-se (...) a revolução prejudicou todos os brasileiros (...) foi um grande erro histórico"), de Miguel Arraes ("eles elitizaram o país. Interromperam o avanço para a horizontalidade da renda (...) temem o reclamo das grandes massas marginalizadas"), do comediante Renato Aragão ("quero escolher o presidente do meu país e não deixam") e do jogador de futebol Sócrates ("nosso povo perdeu tudo").
Entre eles, chama a atenção o depoimento da mais jovem entre as "personagens" da matéria, um rapaz de 20 anos, nascido em 31 de março de 1964. O título, "Sem culpar ninguém", reflete o tom dos enunciados que compõem o depoimento publicado: "Não sei se todos esses governos foram chefiados por militares ou civis (...). Os militares são todos meio furados (...). Não creio que a Revolução tenha influído na minha vida" e, finalmente, "Não quero responsabilizar ninguém".30
Essa percepção, contrastante com o cultivo da imagem de engajamento – sobretudo dos próprios jornalistas – no passado recente, reapareceria em outros momentos. Em 1994, uma matéria publicada no jornal O Globo traz umbox assinado pelo jornalista Luciano Trigo, nascido em 1964 (informação que consta no final do texto), discutindo criticamente um suposto saudosismo de jovens que não viveram a ditadura e suas percepções sobre o presente e o passado recente. A partir de uma pergunta, que teria sido feita por um jovem em um encontro sobre a ditadura realizado na PUC-Rio, falando da "inveja" que sua geração sentia daqueles que viveram a ditadura, o jornalista levanta hipóteses para explicar esse saudosismo. Uma série de lugares comuns sobre o período constrói o discurso – uma riqueza impar da cultura brasileira, a definição de uma identidade coletiva pela confrontação com o "inimigo comum"; depois, uma crescente "alergia à política", acompanhada de uma crise econômica que teria levado toda uma geração a um "individualismo materialista" e a uma ausência de expressão artística autêntica.
A parte final do texto interessa particularmente a esta discussão, na medida em que expõe uma concepção esvaziada de democracia, muito presente nas representações que se constituem da contraposição simplista entre ditadura e democracia. Após levantar hipóteses para o "fascínio" dos jovens pelo passado recente, alerta para o risco de se viver "problemas e angústias de segunda mão" ou transformar "a ditadura em uma idade de outro", uma "Arcádia verde-oliva onde buscam refúgio os que num regime de liberdade não encontram pretextos para o marasmo cultural". A sentença, então, é dada:
A democracia pela qual se lutou está aí faz tempo. Não existe mais censura, a não ser a da falta de talento. Já é hora de parar de culpar a ditadura pela crise de criatividade e ousadia. Ou então admitir que neste país a cultura não se dá bem com a democracia.31
A ênfase na democracia conquistada é, sem dúvida, parte das representações sobre o passado presentes nos textos. Nesse caso, os silêncios em relação ao presente correspondem a representações homogêneas e esvaziadas sobre o passado recente.

Crítica e representação homogênea do tempo histórico
Estamos em uma democracia, chegamos a ela. A censura no passado é a liberdade no presente. Somos todos, afinal, democratas. Os meios de comunicação podem, agora, livres da censura, colaborar para a consolidação democrática. Essas afirmações compõem percepções centrais à construção de um ethos para a imprensa e os jornalistas no material pesquisado.
São exemplos importantes as publicações, no Correio Braziliense, em março de 1984, de discussões e artigos relacionados à mesa-redonda promovida pelo jornal para discutir telejornalismo e política, com a presença de Antonio Brito, então editor regional da Rede Globo, e Alexandre Garcia, na época editor regional da Rede Manchete. À transcrição do debate, o Correio adiciona artigos e reportagens escritos pela equipe do jornal e uma entrevista com Carlos Henrique Santos, então diretor de jornalismo do SBT.
Os problemas discutidos dizem respeito, sobretudo, às informações políticas (possibilidades e obstáculos), à relação entre telejornalismo e transição e às peculiaridades do jornalismo televisivo em relação ao radiofônico e ao impresso.
Um dos principais marcos dos discursos que compõem os debates consiste na afirmação de que não há mais censura por parte do Estado e, portanto, há liberdade de imprensa, uma vez que seriam quase inexistentes as restrições por parte das empresas. Alexandre Garcia afirma que "pode haver insinuação, mas não chega ao ponto de ser caracterizada como censura".
A TV Manchete hoje, desde que foi ao ar, não tem sentido restrições de espécie alguma para a sua cobertura. O que há são recomendações de ordem geral que mais dizem respeito à responsabilidade da TV do que outra coisa (...) Na cobertura política se evita fazer proselitismo das coisas. Trazer o comício para dentro da televisão, isso não. Existe uma campanha para eleições diretas, muito bem. Existe, há notícia e vamos noticiar. Agora, não vamos fazer proselitismo disso.32
Apesar de a postura ser ancorada em uma noção de objetividade que legitima o não-posicionamento ("não vamos fazer proselitismo disso" poder ser lido como não vamos nos posicionar em relação ao isso, vamos noticiar "os fatos"), a TV e o telejornalismo, especificamente, são vistos como parte de um processo amplo de politização. As pessoas estariam descobrindo que "existe lá um negócio chamado política que é o que dirige o País", "iniciando-se nessa confusão toda...", como diz Garcia.
Vale observar a grande ênfase no "novo", que convive, na matéria, com o silêncio em relação às relações entre as emissoras de TV, em especial a Rede Globo, e a ditadura. Os seguintes enunciados, proferidos por Brito, funcionam nesse sentido:
Se a gente tem um país novo, uma TV nova, a gente tem também, é óbvio, um público novo. (...) o público tem cada vez mais participação crítica: quer dizer, aumenta o número de pessoas que telefonam para elogiar, para criticar, para sugerir. Você tem cada vez mais pessoas interessadas em descobrir o Brasil, e ver o Brasil na TV, o Brasil nos meios de comunicação.33
Além dos aspectos já destacados, o discurso se constitui da oposição entre censura e livre expressão, repressão e conscientização, já indicada nos textos anteriores. O interesse crescente pelo telejornalismo, diagnosticado pelos jornalistas que fazem parte das reportagens, é vinculado à politização da população, que seria decorrente da abertura política. Pouco ou nada se diz sobre o assunto, no entanto, caracterizando, apenas, os meios de comunicação, e em especial a televisão, como agentes relevantes desse processo.
Carlos Henrique Santos, então editor do SBT em Brasília, é bastante enfático:
A última vez que tivemos livre imprensa no País, a TV era muito incipiente. Passados estes anos de arbítrio, de sufoco político, o processo (político) começou a se oxigenar e encontrou a televisão já num ponto importante e avançado de desenvolvimento. Hoje o que nós vivemos é a abertura em rede. Sempre se viveu no Brasil uma situação onde tudo era dado por um acordo de elites. E o que esta rede nacional permite é a horizontalização da informação: a democratização da informação do País que está sendo conquistada em todos os níveis e sobre todos os problemas. A partir do momento em que a informação é que possibilita a formação de uma consciência sobre tudo, a TV passa a ocupar um espaço de muita responsabilidade neste processo. Assim, fica mais difícil que tudo se resolva na cúpula, numa reunião de elites.34
Como se pode observar, o jornalismo (no caso, o televisivo) seria a grande "vedete" de um movimento de abertura, democratização, descoberta. Pode-se, assim, indicar, como parte dessas representações, a projeção de um lugar de destaque para os jornalistas como atores nesse processo, em uma progressão que esvazia os conflitos, limites e restrições que constituem não só a transição para a democracia, em sentido amplo, mas a atuação dos meios de comunicação de massa, mesmo com o enfraquecimento da censura de Estado. Talvez possamos ler a afirmação "a TV deve ter consciência de sua responsabilidade como veículo de massa" como "a TV deve ser a consciência" da democratização. É interessante, ainda, a correspondência entre informar-se e participar, traçada por Antonio Brito: "as pessoas estão buscando cada vez mais notícias e estão querendo cada vez mais participar (...) tem que haver um mercado da notícia e esse mercado só haverá se houver participação, pelo menos isso".
Formulações semelhantes sobre o papel do jornalismo fazem parte de uma reportagem publicada na revista Veja, também em 1984, a partir de uma pesquisa do Instituto Gallup sobre o nível de confiança nas instituições, com dados que revelariam um nível baixo de confiança na imprensa.
Na reportagem, a discussão sobre as razões para a baixa credibilidade se constitui de discursos fundados na oposição entre censura e livre expressão, associada à oposição entre manipulação e objetividade, neutralizando algumas possibilidades tímidas de uma discussão crítica sobre o funcionamento da mídia e as pressões e influências sofridas.35 Essa crítica é feita pontualmente, como nas declarações de Luís Inácio Lula da Silva ("os órgãos de comunicação ainda estão muito subordinados à questão econômica e à ideologia dos seus proprietários") e de Leonel Brizola (tudo é editado como convém ao órgão de imprensa, "a imprensa se tornou muito empresarial, desapareceram os jornais de opinião").
A revista, no entanto, assume o discurso da superação da censura, da manipulação e dos equívocos por meio do aprimoramento da imprensa, indicando, inclusive, que as percepções das pessoas que responderam à pesquisa estariam incompletas e distorcidas.36 Dedica vários parágrafos ao aprimoramento técnico e profissional, visto como fator importante rumo a uma menor "distorção" da realidade. "Libertada da censura em 1976", a imprensa poderia, então, exibir seu "vigor em defesa do bem comum e à custa de embates com o poder".37
A estrutura temporal da crítica, como na análise de Koselleck, parece corresponder à noção de progresso. Ancora-se, predominantemente, em um passado de embates – esvaziando a complexidade da crise que levou a 1964, na medida em que suprime conflitos e opções, apresentando as posições assumidas como "equívocos" superados por um processo supostamente homogêneo de abertura e democratização. Ancora-se, ainda, em um futuro delimitado por uma noção vaga de democracia, na medida em que o presente é representado como o contraponto da repressão. A democracia caracterizaria o momento "novo", materializando a superação dos obstáculos à liberdade e localizando a crise, definitivamente, no passado.
Sem assumir um paralelo entre os conflitos que marcaram o final do século XVIII e os que correspondem ao período pesquisado, que sabemos não existir, indicamos a existência de elementos comuns entre as representações que compõem o pensamento iluminista (aqui, de acordo com as análises de Koselleck) e representações de longa duração sobre a imprensa e o jornalismo que constituem os discursos no material analisado. Neles, essas representações nos remetem ao pensamento liberal clássico, a suas estruturas temporais e à relação entre progresso e razão, assumindo um funcionamento peculiar na construção de memórias sobre o passado recente e, sobretudo, de memórias e projeções sobre a atuação de jornais e jornalistas.
Como na análise de Koselleck, nas representações sobre o golpe e a ditadura aqui discutidas, a crítica política parece estabelecer-se na medida em que nega seu caráter político. Materializa-se como crítica apenas na medida em que obscurece seus liames com os conflitos presentes, situando ora no passado, ora no futuro o locus de sentido para a crítica. No caso específico do jornalismo, essas representações, associadas à valorização da isenção e de noções correlatas, isentam os atores de sua responsabilidade política e encobrem o fato de que a crise não é uma determinação localizada no passado e ligada a uma superação enunciada a priori pelos movimentos de uma história progressiva. Ao contrário, as decisões tomadas estendem-se sobre o presente e constituem seus conflitos, ainda que o "desfecho" não esteja claro, nem seja previsível.



* Uma versão anterior deste artigo foi discutida no 3º Congresso da Associação Latino-Americana de Ciência Política – Democracia e Desigualdades, ocorrido na Unicamp, em setembro de 2006.
1 O texto é parte de uma pesquisa mais ampla, que analisou textos escritos nos meses de março e abril de 1984, 1994 e 2004 (relacionados aos aniversários do golpe de 1964) e 1985 (relacionados à eleição do primeiro presidente civil, pelo Colégio Eleitoral). O material coletado consiste em 1314 matérias, das quais 72 foram agrupadas sob a temática "imprensa". Foram analisados os jornais O GloboFolha de S. PauloO Estado de S. PauloJornal do Brasil e Correio da Manhã e as revistas VejaÉpoca, Carta Capital e Isto É. Não teria sido possível sem o trabalho das alunas Anali Cristino Figueiredo, Michelle Fernandez e Samantha Albano Amorim (Pibic, CNPq) e Manoela Hartz.
2 Para um mapeamento das perspectivas predominantes nas ciências sociais e na história sobre o golpe e a ditadura recente, cf. FICO, Carlos. Além do golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2004 e DELGADO,         [ Links ] Lucília. 1964: temporalidade e interpretações. In: RIDENTI, Marcelo; MOTTA, Rodrigo Patto Sá. (orgs.) O golpe e a ditadura militar: 40 anos depois. Bauru: Edusc, 2004, p.15-28.         [ Links ]
3 CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da sociedade. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982, p.412-13.         [ Links ]
4 CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da sociedade, p.243.         [ Links ]
5 KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise. Rio de Janeiro: Contraponto/Editora da UERJ, 1999, p.66.         [ Links ]
6 KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise, p.92.         [ Links ]
7 Para Koselleck, este seria o modus operandi da crítica mesmo quando o progresso não se apresenta como movimento ascendente, mas aponta para o futuro como destruição e decadência, o que observa por meio da análise do pensamento de Pierre Bayle. KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise, p.97.         [ Links ]
8 KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise, p.111.         [ Links ]
9 KOSELLECK, Reinhart. Crítica e crise, p.138.         [ Links ]
10 D'ALLONES, Myriam Revault. Le dépérissement de la politique: généalogie d'un lieu commun. Paris: Alto-Aubier, 1999, p.12-13.         [ Links ]
11 D'ALLONES, Myriam Revault. Le dépérissement de la politique: généalogie d'un lieu commun, p.142.         [ Links ]
12 D'ALLONES, Myriam Revault. Le dépérissement de la politique: généalogie d'un lieu commun, p.146.         [ Links ]
13 Para análises do tema a partir de debates das décadas de 1940-50, cf. BIROLI, Flávia. Liberdade de imprensa: margens e definições para a democracia durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-60). Revista Brasileira de História, São Paulo, v.24, n.47, p.213-240, 2004 e BIROLI,         [ Links ] Flávia. Técnicas de poder, disciplinas do olhar: aspectos da construção do 'jornalismo moderno' no Brasil. História, Unesp/Franca, São Paulo, v.26, n.2, p.118-143, 2007.         [ Links ]
14 D'ALLONES, Myriam Revault. Le dépérissement de la politique: généalogie d'un lieu commun, p.269. (tradução da autora)         [ Links ]
15 BIROLI, Flávia. Com a corrente – modernidade, democracia e seus sentidos no jornalismo brasileiro dos anos 1950. Campinas: Unicamp/IFCH, 2003 (História, tese de doutorado), 2003.         [ Links ]
16 A esse respeito, cf. BENEVIDES, Maria Vitória. A UDN e o udenismo: ambiguidades do Liberalismo brasileiro, 1945-1965. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981 e KUCINSKI,         [ Links ] Bernardo. Os cem anos de vida do jornalO Estado de S. Paulo: Liberal, conservador, antifascista. Opinião, p.4-5, 3 de Janeiro de 1975.         [ Links ]
17 Arquivo Carlos Lacerda, UnB. Pronunciamento do governador Carlos Lacerda através de uma cadeia de rádio e televisão (TV Rio e Rádio Roquette Pinto no comando da cadeia, 04/04/1964, p.16-17.
18 Oliveiros Ferreira, jornalista no Estado desde 1952, foi secretário de Redação a partir de 1967 e assumiu cargo de direção no jornal a partir de 1976.
19 FERREIRA, Oliveiros. Que jornal subversivo estávamos fazendo. O Estado de S. Paulo, p.X3, 31/03/1994.         [ Links ]
20 Para essa discussão, FICO, Carlos. Além do golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar.         [ Links ] Vale lembrar que os expurgos e a tortura tiveram início durante o governo de Castelo Branco, e com a sua conivência, foram decretados o AI-2, a Lei de Segurança Nacional, a Lei de Imprensa, para destacar algumas das medidas que definiram, desde então, o caráter repressivo e autoritário do regime. A hipótese que sustento, a partir da análise das representações presentes na imprensa, é que a "operação-salva-Castelo" é parte de esforços e estratégias para justificar a atuação de civis e militares que apoiaram o golpe e os primeiros anos da ditadura, tornando-se, depois, opositores ou mesmo vítimas do regime.
21 FRANCIS, Paulo. Grande enigma em torno de dois poderosos civis. O Estado de S. Paulo, p.X3, 31/03/1994.         [ Links ]
22 Em carta datada de 12/05/1964, Júlio de Mesquita Filho procura convencer Carlos Lacerda de que a presidência de Castelo não deveria estender-se apenas até outubro de 1965, deveria ser prorrogada por três anos. A Lacerda, "líder incontestável da nova democracia", diz: "precisamos queimar até o último cartucho em defesa de uma oportunidade como a vitória de 31 de março, que não se repetirá nestes próximos cinqüenta anos". Arquivo Carlos Lacerda, UnB.
23 Censores proibiam até noticiário sobre a epidemia de meningite. Folha de S. Paulo, Especial p.B-10. 27/03/1994.         [ Links ]
24 Folha apoiou primeiro. In: O Brasil nas ruas. Folha de S. Paulo, Caderno Mais!, p.6, 24/04/1994.         [ Links ]
25 CONY, Carlos Heitor. 40 anos depois. Folha de S. Paulo, p.A2, 28/03/2004. (grifo da autora).         [ Links ]
26 É permitido proibir – A liberdade de imprensa sumiu, entre 68 e 75, e os jornais reagiram com receitas, poesia e outros truques. O Estado de S. Paulo, p.H8, 31/03/2004.         [ Links ]
27 PEDREIRA, Fernando. O funil da liberdade. Jornal do Brasil, p.11, 13/03/1994.         [ Links ]
28 CARVALHO, Aloysio Castelo de. A opinião pública e a CPI da Última Hora: o governo Vargas (1951-54). São Paulo: USP/FFLCH, 2000 (História, tese de doutorado).         [ Links ]
29 CARVALHO, Aloysio Castelo de. A imprensa golpista: o papel dos jornais cariocas da Rede da Democracia na queda de Jango. Carta Capital, 31/03/2004.         [ Links ]
30 A revolução revisitada. Isto É, 04/04/1984.         [ Links ]
31 Anos verde-oliva seduzem os jovens. In: Os vivos e os mortos de 64, O Globo, Segundo Caderno, p.1.         [ Links ]
32 Vivemos uma lua-de-mel com a abertura. Correio Braziliense, p.17-18, 27/03/1984.         [ Links ]
33 Vivemos uma lua-de-mel com a abertura. Correio Braziliense, p.17-18, 27/03/1984.         [ Links ]
34 É preciso consciência e responsabilidade. Correio Braziliense, p.24-25, 28/03/1984.         [ Links ]
35 Os entrevistados pelo Instituto Gallup acham que a imprensa é benevolente com os políticos ligados ao governo, com o próprio governo e também com as empresas (...) acreditam que os jornais ignoram ou atacam em demasia a polícia, os sindicatos, os políticos da oposição e os criminosos". Não se diz nada, no entanto, sobre as relações complexas entre imprensa e política, entre imprensa e poder econômico. A imprensa julgada, Veja, p.42, 11/04/1984.         [ Links ]
36 A partir da pesquisa, "resulta lógico supor que, para o brasileiro, a imprensa está mais perto dos fortes do que dos fracos. Pode ser uma visão incompleta, até mesmo distorcida, mas, sem dúvida, trata-se de uma má notícia". A imprensa julgada, Veja, p.50, 11/04/1984.         [ Links ]
37 A imprensa julgada, Veja, p.46, 11/04/1984.         [ Links ]

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