PROF. LUIZ BIVAR JR
BREVES CONSIDERAÇÕES:
O
estudo do tema concurso de pessoas importa uma análise das várias formas de
realização de uma infração penal quanto aos seus sujeitos. A forma mais simples
de cometimento de um crime e contravenção se dá por meio da intervenção,
positiva ou negativa, de uma só pessoa. A infração penal, entretanto, nem
sempre é obra de uma única pessoa. Com freqüência, os delitos e contravenções
são produto de várias condutas, ou seja, decorrem da conjugação de vontades de
duas ou mais pessoas.
Nesse
ponto, é imprescindível destacar, dentre as várias classificações que as
infrações penais recebem, aquela que separa os crimes unissubjetivos ou
monossubjetivos de outros denominados plurissubjetivos.
Os
crimes unissubjetivos, monossubjetivos ou de concurso eventual são aqueles que,
apesar de poderem ser cometidos por uma única pessoa, eventualmente são
cometidos por duas ou mais pessoas. É o caso, por exemplo, do homicídio, furto,
estupro, etc., que podem ser cometidos por uma só pessoa, ou por duas ou mais.
Nota-se que nesses crimes a pluralidade de agentes não é elementar do tipo. Já
os crimes plurissubjetivos ou de concursos necessário são aqueles que só podem
ser cometidos por mais de uma pessoa, como, por exemplo, os crimes de quadrilha
ou banco e rixa. A pluralidade de agentes é, assim, elementar do tipo. De
acordo com o renomado professor Damásio E. de Jesus:
“(...) Os crimes podem ser monossubjetivos ou plurissubjetivos.
Monossubjetivos são aqueles que podem ser cometidos por um só sujeito.
Plurissubjetivos são os que exigem pluralidade de agentes. Assim, o homicídio é
delito monossubjetivo, uma vez que pode ser praticado por uma só pessoa. A
rixa, ao contrário, exige a participação de mais de duas pessoas. (...) Como se
nota, existem hipóteses em que a pluralidade de agentes é da própria essência
do tipo penal. Daí falar-se em crimes de concurso necessário ou
plurissubjetivos. Os crimes monossubjetivos, ao contrário, podem ser cometidos
por um só sujeito. Todavia, eventualmente podem ser cometidos por mais de um
sujeito. Daí falar-se em concurso eventual.”[1]
Fala-se
em concurso de pessoas, portanto, quando duas ou mais pessoas concorrem para a
prática de uma mesma infração penal, sendo que tal colaboração pode ocorrer
tanto nos casos em que são vários os autores, como naqueles onde existam
autores e partícipes.
Assim,
uma pessoa pode participar de uma infração penal, como autor, co-autor ou
partícipe, institutos que serão analisados a seguir.
2. AUTORIA:
O Código
Penal Brasileiro não trouxe um conceito de autor e partícipe, razão pela qual
ficou a cargo da doutrina tal definição. Para Zaffaroni e Pierangeli autoria e
participação não são conceitos exclusivos do direito penal, podendo também ser
extraídos da natureza das coisas. Para esses autores:
“(...)
o concurso de várias pessoas num mesmo evento não é um fenômeno que se dá
somente no direito penal, mas que é algo cotidiano. Da mesma maneira dizemos,
diariamente, que fulano é autor de tal coisa, que beltrano é autor de tal
outra, que sicrano cooperou com fulano em tal coisa e que fulano incentivou
beltrano a fazer tal coisa.”[2]
Como se
pode perceber, autoria e participação, antes de serem conceitos jurídicos, são
conceitos cotidianos, inerentes ao homem. Ao longo dos tempos, então, surgiram
várias teorias buscando fixar um conceito de autor. A seguir, será feita uma
análise, das principais teorias referentes à autoria.
2.1 TEORIA EXTENSIVA OU
MATERIAL-OBJETIVA:
De
acordo com a teoria extensiva, autor é todo aquele que concorre, de alguma
forma, para a consecução do resultado, isto é, é todo aquele que dá causa ao
resultado. Para Damásio E. de Jesus:
“(...) O conceito extensivo de autor fundamenta-se na causação do
resultado: autor é quem dá causa ao evento. Assim, em princípio, é autor quem,
realizando determinado comportamento, causa a modificação do mundo externo. Não
é somente quem realiza as características do tipo penal, mas também aquele que,
de qualquer maneira, contribui para a produção do resultado.”[3]
A
crítica que se pode fazer a essa teoria é que ela não diferencia o autor do
partícipe. Como autor é todo aquele que contribui, de qualquer modo, para a
produção do resultado, então não haveria a figura do partícipe.
2.2 TEORIA RESTRITIVA OU
FORMAL-OBJETIVA:
É
a teoria adotada pelo nosso Código Penal após a reforma de 1984. Essa teoria
distingue autor de partícipe, estabelecendo como critério distintivo a prática
ou não de elementos do tipo.
Assim,
autor é aquele que concorre para a realização do crime, praticando elementos do
tipo. Co-autor é aquele que concorre para a realização do crime, praticando
parte do tipo, ou seja, ele presta uma ajuda considerada essencial, dividindo
tarefas essenciais ao crime (divisão de tarefas em sede de tipo). Já o partícipe
é aquele que contribui, de qualquer outro modo, para a realização de um crime,
sem realizar elementos do tipo. É de se destacar que na participação também
existe uma divisão de tarefas, no entanto, tais tarefas são consideradas
acessórias. O partícipe auxilia de forma secundária, sem realizar qualquer ato
de execução do crime (divisão de tarefas em sede de crime).
Segundo
o professor Rogério Greco:
“(...) Para aqueles que adotam um conceito restritivo,
autor seria somente aquele que praticasse a conduta descrita no núcleo do tipo
penal. Todos os demais que, de alguma forma, o auxiliassem, mas que não viessem
a realizar a conduta narrada pelo verbo do tipo penal seriam considerados
partícipes.”[4]
Duas
críticas, entretanto, podem ser feitas à presente teoria. Em primeiro lugar, de
acordo com essa teoria, o mandante de um crime seria mero partícipe, já que ele
não realiza qualquer elemento do tipo. Além disso, ela não explica
satisfatoriamente a autoria mediata ou direta. Esta ocorre quando o agente se
utiliza de um terceiro, em estado de irresponsabilidade penal, para a prática
um crime. Nesse último caso, o agente não pratica nenhum elemento do tipo,
conseqüentemente, seria, para a teoria restritiva, mero partícipe.
É de se
notar, portanto, que a teoria restritiva, apesar de ter sido a adotada pelo
Brasil, possui falhas. Buscando corrigir tais falhas, surge uma terceira teoria
denominada teoria do domínio do fato.
2.3 TEORIA DO DOMINIO DO
FATO:
Com
o intuito de corrigir eventuais falhas da teoria anterior, surge, em 1939, na
Alemanha, a teoria do domínio do fato, criada por Hans Welzel. Para o professor
Luis Luisi é a teoria eminentemente finalista. Essa teoria também diferencia
autor de participe, porém o critério distintivo não é a prática ou não de elementos
do tipo, e sim ter ou não o domínio do fato. Autor é, então, quem possui o
domínio do fato, enquanto o partícipe não possui tal domínio. Para essa teoria
haveria três espécies de autor:
a)
Autor intelectual: é aquele que organiza, coordena a
atividade criminosa (é o mandante de um crime);
b)
Autor material, direito ou imediato: é o executor
material do tipo. É aquele que realiza diretamente o núcleo do tipo penal. Tem,
assim, o domínio final do fato;
c)
Autor mediato ou indireto: ocorre quando o agente se
utiliza de um terceiro, em estado de irresponsabilidade penal, para praticar um
crime. Esse terceiro é normalmente um inimputável.
Já o
co-autor é aquele que, possuindo o domínio do fato, divide tarefas, auxiliando
o autor. Para o professor Rogério Greco:
“(...) Se autor é aquele que possui o domínio do fato, é o senhor de suas
decisões, co-autores serão aqueles que têm o domínio funcional dos fatos, ou
seja, dentro do conceito de divisão de tarefas, serão co-autores todos os que
tiverem uma participação importante e necessária ao cometimento da infração,
não se exigindo que todos sejam executores, isto é, que todos pratiquem a
conduta descrita no núcleo do tipo.”[5]
O
co-autor pode ser de duas espécies:
a) Co-autor
propriamente dito: surge quando existe uma divisão de tarefas em sede de tipo,
ou seja, o co-autor realiza tarefas tidas como essenciais ao crime;
b) Co-autor
funcional: é todo aquele cuja conduta reste imprescindível à consecução do
evento, mesmo que não tenha praticado qualquer elemento objetivo do tipo.
De acordo com Rogério Greco:
“(...)
Em últimas palavras, podemos falar em co-autoria quando houver a reunião de
vários autores, cada qual com o domínio das funções que lhe foram atribuídas
para a consecução final do fato, de acordo com o critério de divisão de
tarefas.”[6]
Finalmente,
para essa teoria do domínio do fato, partícipe é todo aquele cujo comportamento
na cena criminosa não reste imprescindível à consecução do evento.
3. AUTORIA COLATERAL:
A autoria
colateral não se confunde com o concurso de pessoas. Como se verá a seguir, um
dos requisitos do concurso de agente é a existência do vínculo psicológico
entre os envolvidos, ou seja, o liame de vontades. Já a autoria colateral se
caracteriza justamente por não haver tal vínculo entre os agentes. Esta ocorre
quando duas pessoas buscam a dar causa a determinado resultado, convergindo
suas condutas para tanto, sem estarem unidos pelo liame subjetivo. Nas palavras
do professor Damásio E. de Jesus:
“(...) A inexistência do vínculo subjetivo entre os participantes pode
levar à autoria colateral. Ocorre quando os agentes, desconhecendo cada um a
conduta do outro, realizam atos convergentes à produção do evento a que todos
visam, mas que ocorre em face do comportamento de um só deles.”[7]
Pode-se
citar o clássico exemplo em que duas pessoas, desejando causar a morte de um
terceiro, por mera coincidência, se colocam de emboscada à espera da vítima. No
momento em que avistam esta última, os dois agentes efetuam um disparo, sem que
um soubesse da presença do outro. Como não há o vínculo psicológico entre os
sujeitos, não será o caso de concurso de pessoas, isto é, os agentes não serão
co-autores, mas sim autores colaterais.
No
exemplo citado pode ocorrer de ser possível identificar qual dos agentes deu
causa ao resultado morte. Nesse caso, aquele que tiver provocado a morte
responderá por homicídio consumado, ao passo que o outro responderá por
tentativa de homicídio. Pode ocorrer, entretanto, que a perícia não seja capaz
de identificar qual dos dois deu causa ao resultado. Nessa situação, entende a
doutrina que ambos deverão ser responsabilizados por tentativa de homicídio. A
autoria colateral pode ser classificada, então, em dois tipos:
a)
autoria colateral certa: ocorre quando, pelo conjunto
probatório, é possível identificar qual dos agentes deu causa ao resultado.
Nessa hipótese, aquele que produziu o resultado morte responderá por homicídio
consumado, enquanto o outro responderá por tentativa de homicídio;
b)
autoria colateral incerta: ocorre quando, pelo conjunto
probatório, não é possível saber qual dos sujeitos produziu o resultado morte.
Nesse caso, ambos responderão por tentativa de homicídio.
Importante
ainda ressaltar que autoria colateral não se confunde com autoria desconhecida.
Na primeira sabe-se quem são os autores do crime, apenas não se sabe, ao certo,
qual deles deu causa ao resultado. Na autoria incerta os autores do crime são
desconhecidos. Segundo o professor Rogério Greco:
(...) Quando não se conhece a autoria, ou seja, quando
não se faz idéia de quem teria causado ou, ao menos, tentado praticar a
infração penal, surge uma outra espécie de autoria, chamada agora de
desconhecida. Esta forma de autoria difere da incerta, visto que nesta última
sabe-se quem praticou as condutas, sendo que somente não se conhece, com
precisão, o produtor do resultado. Na autoria desconhecida, os autores é que
não são conhecidos, não se podendo imputar os fatos a qualquer pessoa.”[8]
4. AUTORIA DE
DETERMINAÇÃO E AUTORIA DE ESCRITÓRIO:
4.1 AUTORIA DE
DETERMINAÇÃO:
Os
professores Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli fazem menção,
ainda, ao autor de determinação. Trazem à colação a seguinte hipótese:
“(...) alguém que se valha de outro, que não realiza
conduta para cometer um delito de mão própria: uma mulher dá sonífero a outra e
depois hipnotiza um amigo, ordenando-lhe que com aquela mantenha relações
sexuais durante o transe. O hipnotizado não realiza conduta, ao passo que a
mulher não pode ser autora de estupro, porque é delito de mão própria. Tampouco
é partícipe, pois falta o injusto alheio em que cooperar ou a que determinar.”[9]
Essa
modalidade de autoria trazida pelos renomados doutrinadores visa a não deixar
impune o agente que criou toda essa situação. Como o estupro, para esses
autores, é delito de mão própria, então não se admite co-autoria. Também não
seria o caso de participação, pois de acordo com a teoria da acessoriedade
limitada da participação, esta só ocorreria se o fato do autor fosse típico e
ilícito. Como o homem que manteve a conjunção carnal com a mulher estava
hipnotizado, então não há que se falar em conduta dolosa ou culposa. A hipótese
ficaria, portanto, sem aparente solução. Para evitar essa situação é que o
mencionados doutrinadores enfatizam:
“(...) Não
se trata de autoria de delito, mas de um tipo especial de concorrência, em que
o autor só pode ser apenado como autor de determinação em si e não do delito a
que tenha determinado. A mulher não é apenada como autora de estupro, mas lhe
será aplicada a pena deste crime por haver cometido o delito de determinar para
o estupro.”[10]
4.2 AUTORIA DE
ESCRITÓRIO:
Trata-se de
uma outra modalidade de autoria trazida por Zaffaroni e Pierangeli:
“(...) pressupõe uma ‘máquina de poder’, que pode
ocorrer tanto num Estado em que se rompeu com toda a legalidade, como numa
organização paraestatal (um Estado dentro do Estado), ou como uma máquina de
poder autônoma ‘mafiosa’, por exemplo.”[11]
A
autoria de escritório seria o caso, então, em que alguém cumpre ordens de um
grupo criminoso organizado. Não se trata de hipótese de autoria mediata, pois
aquele que cumpre as ordens emanadas do chefe da organização, o faz tendo o
domínio funcional do fato que lhe fora atribuído.
5. REQUISITOS DO
CONCURSO DE PESSOAS:
Para que se
possa concluir pelo concurso de pessoas, será preciso verificar a presença dos
seguintes requisitos:
a)
pluralidade de condutas (ou de agentes): para que haja
o concurso de pessoas é indispensável que se tenha, pelo menos, duas ou mais
pessoas concorrendo para a prática de um crime;
b)
relevância causal de cada conduta: é preciso que a
conduta exteriorizada pelo agente, de fato, contribua para a realização de um
crime. Caso a conduta praticada pelo agente não possua relevância para o
cometimento da infração, deve-se desconsiderar tal conduta e concluir que o
agente não contribuiu para essa infração;
c)
liame subjetivo entre os agentes: o terceiro requisito
necessário à caracterização do concurso de pessoas é o chamado liame subjetivo,
ou seja, o vínculo psicológico que existe entre os sujeitos da infração. Caso
não exista esse liame de vontades, cada agente responderá, isoladamente, pelo
seu crime;
d)
identidade de infração para todos os participantes: o
último requisito do concurso de pessoas é a identidade da infração penal. Isso
significa que os sujeitos de um crime, unidos pelo vínculo psicológico, devem
querer praticar a mesma infração penal.
De
acordo com o professor Damásio E. de Jesus, a identidade de infração não seria
nem mesmo um requisito do concurso de pessoas, mas sim uma conseqüência do fato
de o Brasil ter adotado a Teoria monista com relação ao concurso de pessoas.
6. TEORIAS SOBRE O
CONCURSO DE PESSOAS:
Existem três teorias que surgiram com relação ao
concurso de agentes:
a)
teoria monista ou unitária;
b)
teoria dualista;
c)
teoria pluralística.
A
teoria monista, também conhecida como unitária, preceitua que todos os
participantes (autores ou partícipes) de uma infração penal responderão pelo
mesmo crime, isto é, o crime é único. Haveria, assim, uma pluralidade de
agentes e unidade de crimes. Nas palavras de Damásio E. de Jesus:
“(...) É predominante entre os penalistas da Escola
Clássica. Tem como fundamento a unidade de crime. Todos os que contribuem para
a integração do delito cometem o mesmo crime. Há unidade de crime e pluralidade
de agentes.”[12]
Já a teoria
dualista estabelece que haveria um crime único entre os autores da infração
penal e um crime único entre os partícipes. Há, portanto, uma distinção entre o
crime praticado pelos autores daquele cometido pelos partícipes. Haveria, assim,
uma pluralidade de agentes e uma dualidade de crimes. Manzini, defensor desta
teoria, sustentava que:
“(...) se a participação pode ser principal
e acessória, primária e secundária, deverá haver um crime único para os autores
e outro crime único para os chamados cúmplices stricto sensu. A
consciência e vontade de concorrer num delito próprio conferem unidade ao crime
praticado pelos autores; e a de participar no delito de outrem atribui essa
unidade ao praticado pelos cúmplices.”[13]
Por fim, para
a teoria pluralística haverá tantas infrações quantos forem o número de autores
e partícipes. Existe, assim, uma pluralidade de agentes e uma pluralidade de
crimes. Para Cezar Roberto Bitencourt:
“(...) a cada participante corresponde uma
conduta própria, um elemento psicológico próprio e um resultado igualmente
particular. À pluralidade de agentes corresponde a pluralidade de crimes.
Existem tantos crimes quantos forem os participantes do fato delituoso.”[14]
O Código Penal
Brasileiro adotou a teoria monista ou unitária que, para o professor Luiz Regis
Prado seria uma teoria monista de forma “matizada ou temperada”.[15]
De acordo com o professor Damásio, entretanto, apesar de o nosso Código Penal
ter adotado a teoria monista ou unitária, existem exceções pluralísticas a essa
regra. É o caso, por exemplo, do crime de corrupção ativa (art. 333 do CP) e
passiva (art. 317 do CP); do falso testemunho (art. 342 do CP) e corrupção de
testemunha (art. 343 do CP); o crime de aborto cometido pela gestante (art. 124
do CP) e aquele cometido por terceiro com o consentimento da gestante (art. 126
do CP); dentre outros.
7. PARTICIPAÇÃO:
Partícipe,
para a teoria restritiva da autoria, adotada pelo Código Penal Brasileiro, é
todo aquele que contribui, de qualquer modo, para uma determinada infração
penal, sem praticar elementos do tipo. Trata-se, assim, de uma atividade
acessória. A participação pode ser:
a)
moral ou intelectual: pode se dar na modalidade do
induzimento ou determinação (o agente cria, implanta a idéia criminosa na cabeça
de outro) ou da instigação (o sujeito reforça, estimula, incentiva uma idéia
pré-existente);
b)
material: é o auxílio material. O partícipe facilita
materialmente a prática da infração penal, cedendo, por exemplo, a arma para
aquele que deseja se matar.
7.1 TEORIAS SOBRE A
PARTICIPAÇÃO:
Duas
teorias principais surgiram para tentar definir a natureza jurídica da
participação:
a)
teoria causal: essa teoria surgiu no século XIX, com
Von Buri. Parte do princípio da equivalência das condições antecedentes, não fazendo
qualquer distinção entre autoria e participação. Como o resultado é
conseqüência de um conjunto de causas necessárias para a sua ocorrência, então
não haveria por que distinguir autores de partícipes, uma vez que todos os
co-delinqüentes são causas do crime;
b)
teoria da
acessoriedade: de acordo em essa teoria, o ato do partícipe é acessório em
relação ao ato do autor. Existem, entretanto, quatro classes de acessoriedade.
Para a acessoriedade mínima, para que haja participação no fato do autor, basta
que este seja típico. De acordo com a acessoriedade limitada, para que haja
participação no fato do autor é preciso que este seja típico e antijurídico. A
acessoriedade extrema ou máxima, por sua vez, defende que só haveria
participação no fato do autor se esse fosse típico, antijurídico e culpável.
Por fim, para a hiperacessoriedade, para que haja participação no fato do autor
é preciso que este seja típico, antijurídico, culpável e punível.
De
acordo com o professor Damásio E. de Jesus:
“(...) Passamos a adotar a teoria da
acessoriedade limitada. Como dizia Welzel, para a punibilidade da participação
basta que o fato principal seja típico e antijurídico, não se exigindo que seja
culpável. Assim, a participação não requer que o autor principal tenha atuado
culpavelmente.”[16]
7.2
COOPERAÇÃO
DOLOSAMENTE DISTINTA OU DESVIOS SUBJETIVOS ENTRE OS PARTICIPANTES:
Dispõe
o art. 29 do Código Penal:
“Art. 29 – Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos
grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até a metade,
na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.”
Como
se pode perceber, o legislador pretendeu punir os concorrentes de um crime nos
exatos limites da finalidade de sua conduta. Em outras palavras, se o agente
tinha o seu dolo voltado para a produção de determinado resultado, não poderá
ele responder pelo desvio subjetivo da conduta do outro sujeito. Para Damásio
E. de Jesus:
“(...) Esse dispositivo cuida da
hipótese de o autor principal cometer delito mais grave que o pretendido pelo
partícipe. (...) a regra da disposição tem aplicação a todos os casos em que
algum dos participantes quis realizar delito de menor gravidade.”[17]
E
acrescenta o professor Rogério Greco:
“(...) Merece destaque o fato de que o § 2º do art. 29 do Código Penal
permite tal raciocínio tanto nos casos de co-autoria como nos de participação
(moral e material). O parágrafo começa sua redação fazendo menção a ‘alguns dos
concorrentes’, não limitando a sua aplicação tão somente aos partícipes. (...)
Deve ser frisado, portanto, que a expressão ‘quis participar de crime menos
grave’ não diz respeito exclusivamente à participação em sentido estrito,
envolvendo somente os casos de instigação e cumplicidade, mas sim em sentido
amplo, abrangendo todos aqueles que, de qualquer modo, concorrem para o crime,
estando aí incluídos autores (ou co-autores) e partícipes.”[18]
7.3 PARTICIPAÇÃO DE
PARTICIPAÇÃO E PARTICIPAÇÃO SUCESSIVA:
Ocorre
a participação da participação nos casos de induzimento de induzimento,
instigação de instigação, mandado de mandado, etc. Exemplo: A induz B a induzir
C a matar D.
Já a
participação sucessiva se dá quando presente o induzimento ou instigação do
executor, se sucede outro induzimento ou instigação. Ocorre, por exemplo,
quando A instiga B a matar C, sendo que D, sem saber da previa participação de
A, também instiga B a matar C.
7.4 PARTICIPAÇÃO
IMPUNÍVEL:
O art.
31 do Código Penal estabelece:
“Art. 31 – O ajuste, a determinação ou instigação, e o auxílio, salvo
disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo
menos, a ser tentado.”
Para o professor Rogério Greco:
“(...) Sendo a participação uma atividade acessória, a
sua punição dependerá, obrigatoriamente, da conduta do autor. Assim, se o autor
der inicio à execução de um crime para o qual fora determinado ou auxiliado
materialmente pelo partícipe, a partir desse instante permite-se a
responsabilização penal da participação. Caso contrario, ou seja, se o fato
praticado pelo autor permanecer tão-somente na fase de cogitação, ou mesmo
naquela correspondente aos atos preparatórios, a participação não será
punível.”[19]
Vê-se,
assim, que se o agente não ingressa na fase executória do crime não será
punido, salvo se o próprio tipo penal dispõe em contrário. É o caso, por
exemplo, do crime de quadrilha ou bando (art. 288 do CP) em que o agente que se
reúne a outros três ou mais sujeitos, com o fim permanente de praticar crimes,
estará incurso nas penas do art. 288 do CP, ainda que não chegue a concretizar
qualquer delito.
7.5 PARTICIPAÇÃO DE MENOR
IMPORTÂNCIA:
Tal
situação encontra-se prevista no art. 29, § 1º do Código Penal, in verbis:
“Art. 29 – (...)
§ 1º
- se a participação for de menor importância, a pena poderá ser diminuída de um
sexto a um terço.”
Trata-se,
assim, de uma causa geral de diminuição da pena quando verificado ser de menor
importância a participação. Importante apenas ressaltar que esse parágrafo
segundo do art. 29 do CP só tem aplicação em relação à participação, não
incidindo aos casos de co-autoria. Isso, porque, como na co-autoria existe uma
divisão de tarefas essenciais ao crime, toda atuação do co-autor é considerada
importante para a prática do delito, não se podendo, portanto, falar-se em
participação de menor importância.
7.6 MOMENTO DA
PARTICIPAÇÃO:
A
adesão do partícipe ao fato do autor principal deve ser dar antes ou durante a
prática do delito e não depois. Caso essa adesão se dê após a realização do
crime, o fato ou será um irrelevante penal ou um crime autônomo. Para o
professor Damásio E. de Jesus:
“(...) uma das conseqüências de configurar a participação partindo da
relação de causalidade é a exclusão de qualquer conduta que não realize ou
contribua para a produção do crime. Em face disso, o fato que constitui a
participação deve ser cometido antes ou durante a realização do delito. Se
posterior, não é participação no crime anterior, mas sim delito autônomo.”[20]
7.7 ARREPENDIMENTO DO
PARTÍCIPE:
Pode
acontecer de o partícipe desistir ou se arrepender de praticar um crime. No
entanto, o partícipe só não será responsabilizado penalmente se, tendo
desistido ou se arrependido, conseguir fazer com que o autor não pratique a
conduta criminosa. Do contrário, isto é, se não tiver sucesso na tentativa de
evitar o cometimento do delito, o seu arrependimento não será eficaz e,
conseqüentemente, responderá penalmente pelo ato acessório que praticou.
De
acordo com o eminente professor Rogério Greco:
“(...) Endentemos que se o partícipe houver induzido ou instigado o
autor, incutindo-lhe a idéia criminosa ou reforçando-a a ponto de este
sentir-se decidido pelo cometimento do delito, e vier a se arrepender, somente
não será responsabilizado penalmente se conseguir fazer com que o autor não
pratique a conduta criminosa. Caso contrário, ou seja, se não tiver sucesso na
sua missão de evitar que o delito seja cometido, depois de ter induzido ou
instigado inicialmente o autor, o seu arrependimento não será eficaz e,
portanto, não afastará a sua responsabilidade penal como ato acessório ao
praticado pelo autor.”[21]
8. CONCLUSÃO:
O
concurso de pessoas constitui assunto corriqueiro e de vital importância no
Direito Penal moderno. O presente trabalho teve por objetivo dissertar, ainda
que brevemente, sobre o tema na tentativa de facilitar a sua compreensão. Para
tanto, analisaram-se temas correntes em sede de concurso de agentes, tais como
autoria e suas teorias, participação em suas diversas modalidades, dentre
outros.
9. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS:
Bitencourt, Cezar
Roberto. Manual de direito penal. Parte geral. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997.
Ferraz, Esther de
Figueiredo. A co-delinquência no direito penal brasileiro. São Paulo:
Bushatsky, 1976.
Greco,
Rogério. Curso de direito penal. Parte Geral. 3ª ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2003.
Jesus, Damásio E. de. Curso
de direito penal. 1º volume. Parte Geral. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
Prado, Luiz Regis. Curso
de direito penal brasileiro. Parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1999.
Zaffaroni, Eugenio
Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual
de direito penal brasileiro. Parte Geral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999.
[1] Jesus, Damásio E. de. Curso
de direito penal. 1º volume. Parte Geral. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997,
p. 402.
[2] Zaffaroni, Eugenio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual
de direito penal brasileiro. Parte Geral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, pp. 663-664.
[3] Jesus, Damásio E. de. Op. Cit., p. 403.
[4] Greco, Rogério. Curso
de direito penal. Parte Geral. 3ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2003, p.
475.
[5] Greco, Rogério. Op. Cit.,
p. 481.
[6] Greco, Rogério. Op. Cit., p. 482.
[7] Jesus, Damásio E. de. Op. Cit., p. 418.
[8] Greco, Rogério. Op. Cit., p. 494.
[9] Zaffaroni, Eugenio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual
de direito penal brasileiro. Parte geral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, p. 676.
[10]
Idem, p. 678.
[11]
Idem, p. 672.
[12] Jesus, Damásio E. de. Op. Cit., p. 406.
[13]
In Ferraz, Esther de
Figueiredo. A co-delinquência no direito penal brasileiro. São Paulo:
Bushatsky, 1976, p. 30.
[14] Bitencourt, Cezar Roberto. Manual
de direito penal. Parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p.
424.
[15] Prado, Luiz Regis. Curso
de direito penal brasileiro. Parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1999, p. 265.
[16]
Jesus, Damásio E. de. Op. Cit., p. 410.
[17]
Idem, p. 427.
[18]
Greco, Rogério. Op. Cit., p. 510.
[19]
Greco, Rogério. Op. Cit., p. 507.
[20]
Jesus, Damásio E. de. Op. Cit., p.
428-429.
[21]
Greco, Rogério. Op. Cit., p. 502.
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