domingo, 20 de abril de 2014

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DO TRABALHO

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1. Introdução

Os princípios são “as idéias fundamentais sobre a organização jurídica de uma comunidade, emanados da consciência social, que cumprem funções fundamentadoras, interpretativas e supletivas, a respeito de seu total ordenamento jurídico”.[1]
Os princípios gerais do direito são fontes subsidiárias de direito e assim acontece no Brasil, como preconiza a Lei de Introdução ao Código Civil no seu artigo 4º.
No campo do direito do trabalho, os princípios são a base, a fundamentação, a diretriz que deve ser seguida para a interpretação da norma trabalhista.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) inclui os princípios entre as fontes a que a Justiça do Trabalho deve recorrer para sanar omissões no campo das relações de trabalho, ou seja, os princípios são enunciados deduzidos do ordenamento jurídico pertinente, destinados a iluminar tanto o legislador, ao elaborar as leis, como o interprete, ao aplicar as leis. [2]
No campo do direito do trabalho, os princípios exercem papel fundamental, dando aos dispositivos legais uma interpretação muitas vezes diversa daquela que seria natural pela sua simples leitura. Como ocorre hoje em outras áreas do direito, especialmente quando se identifica uma parte hipossuficiente (um bom exemplo é a área do direito do consumidor), no direito do trabalho as normas são flexibilizadas em nome da proteção e respeito a princípios fundamentais. Isso será notado na análise dos temas mais relevantes na área do direito do trabalho.

2 Principio da Irrenunciabilidade de Direitos

O princípio da irrenunciabilidade de direitos, consagrado nos artigos 9º e 468 da CLT, surge como conseqüência das normas cogentes, que visam a proteção do trabalhador e são a base do contrato de trabalho. Do princípio da irrenunciabilidade de direitos, decorre a mais marcante peculiaridade do direito do trabalho brasileiro, que é a ausência quase total de autonomia da vontade quando se trata do trabalhador.

Os direitos trabalhistas como um todo, sejam decorrentes de lei, acordo ou convenção coletivos, ou mesmo de ajuste direto entre empregado e empregador, não podem ser objeto de renúncia por parte do empregado, a não ser em situações excepcionalíssimas, cercadas de formalidades que sempre têm por objetivo garantir que a manifestação de vontade do empregado não está viciada.
Ou seja, a renúncia de direitos somente será possível se feita de forma expressa e dentro das situações previstas em lei, inexistindo, no Direito do Trabalho, o que ocorre nos demais ramos do Direito Privado, ou seja, a possibilidade de renúncia tácita. O direito ao aviso prévio, por exemplo, é irrenunciável pelo empregado, conforme entendimento jurisprudencial sumulado no Enunciado nº 276 do TST.
Alguns autores defendem, ainda, que o princípio da irrenunciabilidade decorreria do vício presumido do consentimento do trabalhador a renunciar aos seus direitos, uma vez que o mesmo não teria total liberdade para emitir a sua vontade em razão da subordinação a que está sujeito. O trabalhador sempre estaria, portanto, sob coação psicológica ou econômica, ou, ainda, em determinados casos estaria na condição de quem desconhece seus reais direitos.
Independentemente da teoria adotada, verifica-se que a nulidade de pleno direito atribuída às alterações contratuais que possam ser entendidas como prejudiciais ao empregado, leia-se, que impliquem em renúncia a direito garantido por lei ou contrato acaba por engessar as relações de trabalho.
Embora este princípio tenha como finalidade a proteção ao empregado, o mesmo acaba por ser um entrave à flexibilização do Direito do Trabalho, vista como uma moderna solução para o problema do desemprego, pelo menos em algumas camadas da sociedade.
Um exemplo interessante é a obrigação de pagamento de horas extras a todos os empregados que não possam ser qualificados como ocupantes de cargos de gestão ou exercentes de atividades externas, nos termos do artigo 62 da CLT. Como estas exceções legais são demasiadamente limitadas, a lei acaba por exigir que a maioria esmagadora dos empregados, independentemente do seu nível de educação ou da independência que possam usufruir no desempenho de suas funções, estejam sujeitos ao controle de horário e ao conseqüente pagamento de horas extras.
Como de nada adiantaria aos empregadores convencionar com seus empregados de nível superior e ocupantes de cargos estratégicos (que mesmo assim não se qualificam como cargos de confiança para os efeitos do art. 62 da CLT) a renúncia ao controle de jornada e ao recebimento de horas extras, estas empresas normalmente optam pelo simples descumprimento da lei. Não é incomum que empresas que possuem um grupo de empregados de nível elevado e alto grau de comprometimento no desempenho das atividades isente estes empregados do controle de horário. Estas empresas acabam por constantemente administrar um potencial passivo trabalhista consistente na possibilidade de estes empregados postularem horas extras com significativas chances de sucesso. Interessante notar que este passivo pode muitas vezes inviabilizar ou significativamente influenciar operações de compra e venda de empresas, já que o comprador facilmente identifica o risco e tenta afastá-lo de si através da prestação de garantias por parte do vendedor, ou mesmo pela simples redução do preço ajustado.[3]

O princípio da irrenunciabilidade não cuida apenas da renúncia de direitos, mas também da intransigibilidade. Três são tipos de direito que podem ser encontrados no Direito do Trabalho: (i) com conteúdo imperativo, cujo alcance é geral; (ii) com natureza imperativa, decorrente, por exemplo, do contrato de trabalho; e (iii) dispositivos ou supletivos. Os dois primeiros não poderão ser objeto de transação, mas somente o terceiro. Não pode o empregado, por exemplo, optar por ter anotada sua CTPS para não sofrer descontos de INSS. Mesmo que acordado entre o empregador e o empregado, o empregador seria intimado a pagar as cotas previdenciárias caso sofresse fiscalização, independentemente daquilo que havia acordado pelo empregado, por se tratar de norma cogente, cuja observância é obrigatória.
Um outro caso interessante e real é o de um executivo que foi contratado por uma empresa estrangeira para trabalhar em sua subsidiária no país e teve o seu salário definido em moeda estrangeira.  Assim, a cada mês, o seu salário em reais era calculado tomando-se por base a taxa de conversão da moeda estrangeira para reais.  Passados alguns anos, com a alta da moeda estrangeira, o salário desse executivo em reais se tornou excessivamente alto, a ponto de se sugerir a sua demissão e a contratação de outro executivo para o seu lugar por não ser possível a redução do seu salário para níveis de mercado. 

Neste caso, o próprio executivo concordava que seu salário deveria ser reduzido em reais e queria poder manter o seu emprego.  Entretanto, as partes sabiam que qualquer documento assinado pelo empregado nesse sentido seria inválido e  criar-se-ia uma contingência em potencial para a empresa, caso o executivo viesse a questionar essa redução salarial no futuro.  Este é um caso no qual a proteção aos diretos do empregado funcionou contra ele e contra a empresa, impedindo uma solução simples para o que poderia ser um problema simples.

3 Principio da Continuidade da Relação de Emprego


Embora a Constituição Federal de 1988 não tenha assegurado a estabilidade absoluta do trabalhador, a interpretação das normas referentes às indenizações devidas, quando da dispensa do empregado sem justa causa, sugere a presunção da duração do contrato de trabalho por tempo indeterminado.
O contrato por prazo determinado (obra certa, escopo limitado no tempo, etc) é uma exceção e, como tal, encontra uma série de restrições na legislação trabalhista, como, por exemplo, o limite máximo de 2 (dois) anos e a possibilidade de uma única renovação, estabelecido no artigo 445 da CLT. O contrato de experiência é sem dúvida o mais usual dos contratos por tempo determinado, e tem duração limitada de 90 dias (artigo 445, parágrafo único), prazo após o qual teria início o contrato por prazo indeterminado.
O princípio da continuidade do contrato de trabalho também está presente nos artigos 10 e 448 da CLT, que tratam, respectivamente, das alterações na estrutura da empresa e na mudança de sua propriedade, que não irão afetar os direitos adquiridos e o contrato de trabalho. Ou seja, o legislador procurou proteger o trabalhador com a garantia de continuidade de seu contrato de trabalho e das condições do mesmo, independentemente da venda, fusão ou incorporação, ou qualquer outra alteração no controle da empresa em que trabalha.

4 Principio da Primazia da Realidade


No Direito do Trabalho, a força dos documentos escritos é muito relativa e estes sucumbem às evidencias que o contrariem, que demonstrem que a realidade foi diferente do que estava no papel. A relação jurídica definida pelos fatos define a verdadeira relação jurídica. Isto significa que as relações jurídicas trabalhistas se definem pela situação de fato, isto é, pela forma como se realizou a prestação de serviços. Ensina Arnaldo Sussekind que o princípio da primazia da realidade é aquele “em razão do qual a relação objetiva evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulada pelos contraentes, ainda que sob capa simulada, não corresponde à realidade”.
Trata-se, portanto, de um princípio bastante peculiar do Direito do Trabalho, em razão do sistema jurídico brasileiro privilegiar a forma e o conteúdo dos documentos escritos, em lugar da realidade das relações.
Tome-se, por exemplo, um contrato no qual as partes estabelecem que uma intermediará vendas para a outra e que esta relação será uma relação de representação comercial, regida por lei específica, sendo o representante registrado perante o competente órgão de classe dos representantes comerciais. Imagine-se que este contrato é firmado e, por anos a fio, as partes cumprem-no à risca, até que o representado resolve rescindir o contrato, o que faz nos termos da lei aplicável a esta modalidade de relação jurídica. Se, neste momento, o representante, sentindo-se lesado ou infeliz, resolver propor ação trabalhista contra o representado, alegando que a relação que havia entre eles era, de fato, uma relação de emprego, na qual estava ele sujeito a um nível de subordinação típico de um empregado, e o juiz do trabalho, ao analisar a conduta das partes durante a vigência do contrato, concordar que estavam presentes os elementos da relação de emprego, condenará o representado a pagar ao representante as verbas de natureza trabalhista aplicáveis, desconsiderando totalmente os termos do contrato firmado e executado pelas partes por anos e anos[4].

5 Princípio da Prevalência da Norma Mais Benéfica


O princípio da proteção ao trabalhador se concretiza em três outros princípios: (i) in dúbio pro operario; (ii) aplicação da norma mais favorável; e (iii) condição mais benéfica.  O princípio do in dúbio pro operario significa dizer que sempre que houver dúvida acerca do alcance ou interpretação de determinada norma, ela deverá ser interpretada favoravelmente ao empregado, que seria a parte mais frágil da relação de emprego. O princípio da aplicação da norma mais favorável traduz a idéia de que a norma a ser aplicada será sempre aquela que for mais benéfica para o trabalhador, independentemente de sua posição hierárquica. Em termos práticos, isto equivale a dizer que prevalecerá sempre a condição mais benéfica ao trabalhador, seja ela decorrente da Constituição Federal ou de um regulamento interno da empresa. A condição mais benéfica se traduzirá naquele que se reverter em maior benefício para o empregado.
As normas de hierarquia mais elevadas acabam por estabelecer pisos de direitos, e não os seus limites. As normas de hierarquia inferior e mesmo os contratos individuais de trabalho prevalecem quando se trata de definir direitos dos trabalhadores.

6. Aplicação e Interpretação das Normas de Direito do Trabalho


Uma norma jurídica, quando é criada, não visa à regulação de um caso concreto. O objetivo da criação da norma é antecipar, mediante um processo de abstração, as classes de relações interindividuais que exijam a intervenção do Estado. As leis, portanto, são meios de comandos abstratos e gerais.
Mas é necessário que o direito seja aplicado. Para que o direito cumpra sua missão, é necessária, também, a “efetividade social”, que se traduz na sua vigência, na sua aplicação.[5]
A aplicação do direito é a adaptação da norma abstrata a um caso concreto, o aplicador do direito tira a lei abstrata do papel e aplica a um caso real, existe uma passagem do geral para o particular.

6.2. Interpretação

Interpretar a lei é aplicá-la a um caso concreto; é atribuir-lhe um significado, determinando um sentido, ou seja, descobrindo a vontade da lei. Pelo sistema tradicional, o intérprete seria um simples explicador da lei; ele aplicaria exatamente o que está na lei. Por esse método, todo direito está na lei, sendo esta  a expressão da vontade do legislador.
Existe também o método histórico evolutivo de interpretação de leis, que parte da premissa que a norma tem uma vida própria, ela pode ter uma interpretação na época de sua criação e outra na época de sua aplicação, ou seja, a mesma norma pode ter um sentido na sua formação e outro sentido no momento que é aplicada.

O sistema teleológico visa buscar a finalidade da norma. O intérprete deve aplicar a norma de acordo com as necessidades práticas que o direito busca atender. Portanto, da leitura desses sistemas, nota-se que os sistemas interpretativos oscilam entre dois extremos: a busca da vontade do legislador ou a busca por se atender as necessidades sociais do momento.
Para alcançar o sentido da lei, devem ser usados vários meios de interpretação, como a interpretação gramatical, a interpretação lógica e a interpretação sistemática. Esses meios devem ser usados em conjunto, e não isoladamente, somente assim o interprete pode conduzir a interpretação da lei a um resultado satisfatório.
Pode acontecer de não existir uma lei para uma certa relação da vida social, isto é, o legislador pode não ter previsto um caso que o Estado será chamado para resolver. Nesses casos, o juiz poderá usar a analogia, doutrina e os princípios gerais para conseguir solucionar o caso concreto que a lei não previu.
Analogia é um processo de indução pelo qual se extrai o princípio a aplicar-se ao caso concreto não previsto. Então a analogia consiste na aplicação ao caso concreto não contemplado pela norma jurídica de um dispositivo de lei ou princípio do direito previsto para uma hipótese semelhante. Se a razão da lei é a mesma, idêntica há de ser a solução.
A doutrina conceitua-se como o conjunto de trabalhos científicos que traduzem a opinião dos autores sobre o direito. Se o objeto de seu estudo é um tema especifico, dela surgirão várias correntes e pensamentos.
Os princípios gerais do direito são, como dito anteriormente, enunciados genéricos, explicitados ou deduzidos do ordenamento jurídico pertinente que visam ajudar o interprete a aplicar as normas ou a sanar omissões.
O intérprete do direito deve, na aplicação da norma, visar atender os fins sociais a que elas se dirigem, por isso, no Direito do Trabalho, esse intérprete deve se guiar pelos princípios específicos dessa área para aplicar a norma.

 

7. Eficácia no tempo e no espaço

A aplicação das normas do direito do trabalho é de caráter imediato. Porém, deve-se respeitar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. O artigo 912 da CLT preceitua que “os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência desta Consolidação”.

As normas trabalhistas têm efeito imediato, mas, como se pode observar do artigo 912 da CLT, não têm efeito retroativo. A Constituição brasileira não admite a retroatividade da lei conforme artigo 5º, XXXVI.
A lei não pode retroagir para mudar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Quanto à aplicação da lei trabalhista no espaço, no Direito do Trabalho, é aplicado o principio da territorialidade, isto é, a norma aplicada é a do local onde aconteceu a relação trabalhista. O artigo 651 da CLT e o Enunciado 207 do TST consagram o principio da territorialidade nas relações trabalhistas. Essa norma se aplica também no caso de conflito internacional de normas trabalhistas.

8. Caso

“Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário em que são partes: FRANCISCO JOSE SERRADOR E TURNER INTERNATIONAL DO BRASIL LTDA como recorrentes e OS MESMOS como recorridos.
Inconformados com a r. sentença de 1º grau proferida pela MM 1ª Vara do trabalho às fls. 1141/1162, complementada pela decisão dos embargos às fls. 1194/1197, recorrem ordinariamente ambas as partes, o reclamante através das razões de fls. 1201/1226 e a reclamada às fls. 1227/1257.
Sustenta o reclamante o seu inconformismo em relação ao não acolhimento das teses de existência de sucessão empresarial e unicidade contratual, bem como no reconhecimento da justa causa. Pretende que a reclamada seja condenada no pagamento em dobro das férias relativas ao período aquisitivo de 87/88 e 91/91, na integração à sua remuneração do salário pago no exterior, do benefício concedido em razão de passagens aéreas que deve ser reconhecido como salário in natura, assim como o direito de participar de um programa de compra de ações de qualquer empresa do grupo, por preço subsidiado, devendo tais parcelas integrar a remuneração e repercutir nas parcelas legais e o pagamento em dobro das férias relativas aos períodos de 87/88 e 91/92.
A reclamada em seu apelo demonstra seu inconformismo, sustentando em síntese em preliminar à inépcia da petição inicial e, no mérito, entende que devem ser excluídas da condenação as parcelas deferidas no julgado a quo, tais como: as comissões “programa de FS”, a integração na remuneração do reclamante dos benefícios concedidos a título de automóvel e combustível, já que as mesmas não se caracterizam salário in natura, a integração do bônus por ter caráter eventual, a não aplicação do benefício produtividade em razão das cláusulas específicas do contrato de trabalho do reclamante, que prevêem aumento real de remuneração, o pagamento das férias relativa ao período de 20 dias do ano de 1982, 20 dias do ano de 1990 e 5 dias do ano de 1991, bem como a condenação das diferenças relativas aos depósitos fundiários.” (trecho do acórdão proferido pela 3a. Turma do TRT da 1a. Região no RO No. 6387/00).

A partir do relatório do acórdão transcrito no caso gerador, mais especificamente no que concerne ao recurso do reclamante, Francisco José Serrador, dispensado quando exercia a função de Presidente de Vendas para a América Latina da empresa Turner International do Brasil Ltda., pode-se identificar a aplicação dos os seguintes princípios:

·   Primeiramente, o princípio da continuidade do contrato de trabalho, identificado pelo acórdão no seguinte trecho:

“A resposta aos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito a fls. 1004, onde consta que encontram-se acostados às fls. 164/173, cópias reprográficas da AÇÃO CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO, sendo certo que o item 3 da mesma tem o seguinte teor:
“3 – O co-réu Francisco serrador (doravante denominado simplesmente ’SERRADOR‘), começou a prestar serviços à TURNER INTERNATIONAL TELEVISION LICENSING COMPANY, INC., em 1986, ocasião em que a UNITED ARTISTS TV INTERNATIONAL, empresa na qual SERRADOR trabalhava desde 1973, foi adquirida pelo GRUPO TURNER”.

É, por si só, suficiente para afastar qualquer dúvida que pudesse existir quanto à existência de sucessões trabalhista e de empregador único (o Grupo Turner).
Devidamente provado que houve a aquisição de uma empresa pela outra, tal alteração na estrutura jurídica da empresa não afeta os direitos adquiridos pelos empregados, nem seus contratos de trabalhos, tudo consoante o disposto nos arts. 10 e 448 da CLT.”
Aqui se nota a utilização do princípio da continuidade do contrato de trabalho, embora não de forma típica, que seria a proteção do ajuste por prazo indeterminado em detrimento do ajuste por prazo certo. No caso do acórdão em estudo, desconsidera-se a existência de dois contratos distintos para declarar, com base em dispositivos específicos que regulam a sucessão de empregadores, a continuidade de um só contrato de trabalho (o chamado “contrato único”).

·  Logo a seguir, quando o reclamante/recorrente requer o reconhecimento de parcelas não constantes de seu contato de trabalho e não quitadas no Brasil, como, por exemplo, o salário pago no exterior, constata-se a utilização de outro princípio. Nesse caso, temos que, em função do princípio da primazia da realidade no Direito do Trabalho: restando demonstrado (i) que o reclamante percebia determinados valores no exterior, não importando se estes valores constavam de seu contrato de trabalho, e (ii) que os mesmos eram decorrentes dos serviços prestados pelo empregado no país, nos termos do contrato firmado com a sua empregadora aqui, o tribunal declarou que esses pagamentos deveriam ser considerados como integrantes do contrato de trabalho com a empresa local, independentemente de estarem previstos em contrato de prestação de serviços firmados com a sua coligada no exterior, como se denota do seguinte trecho:

DO SALÁRIO PAGO NO EXTERIOR
Declarado pela Reclamada que o Reclamante trabalhava para o Grupo Turner (itens 2 a 4 da Ação de Indenização proposta pela Reclamada no Juízo Cível, a fls. 478), além de serem devidas as diferenças de FGTS, férias e 13o salário em razão das comissões e bônus pagos pela empresa estrangeira, como decidido pelo d. Juízo a quo, devidas são também as diferenças de FGTS (observada a prescrição trintenária, na forma do Enunciado no. 295 do C. TST), e de férias e 13o salário (observada, para ambos, a prescrição qüinqüenal) em razão dos salários pagos no exterior, consoante documentos a fls. 47/52, 667/73, 84/87, e fls. 191 (item 5).”

·  Há aqui, também, a contribuição dos princípios da aplicação da norma mais benéfica, bem como da irrenunciabilidade de direitos. No caso concreto que gerou o acórdão, o empregado firmara contrato de prestação de serviços através do qual receberia parte de sua remuneração de uma empresa estrangeira coligada da sua empregadora local. Este contrato previa a prestação de serviços a esta empresa e a remuneração do empregado nos termos das leis aplicáveis no país da contratação no exterior. A decisão de que este contrato deveria ser desconsiderado e que os pagamentos realizados sob a sua tutela deveriam ser agregados aos pagamentos decorrentes do contrato com a empresa brasileira decorreram certamente do entendimento de que: (i) a aplicação da lei brasileira a estes pagamentos, além de condizente com o princípio da aplicação da lei do local da prestação de serviços, decorre também do fato inegável de que a lei brasileira era mais benéfica ao trabalhador; e (ii) a desconsideração do contrato firmado pelo empregado com a empresa no exterior, sob o qual pagamentos foram feitos a ele, equivale à declaração de invalidade de um documento firmado pelo empregado através do qual estaria renunciando a direitos seus decorrentes da aplicação da lei brasileira aos pagamentos por ele recebidos também no exterior.

Interessante notar a aplicação destes princípios, sem ressalvas, mesmo num caso em que o empregado ocupava a mais elevada posição dentro da hierarquia da empresa. No Direito do Trabalho, a proteção aos empregados, que se baseia em muito nos princípios antes citados, não é aplicada de forma discriminatória dependendo do nível social do empregado: todos são protegidos da mesma forma, ficando qualquer possibilidade de relativização desta norma a cargo de cada julgador, variando caso a caso.

9. Questões de Concurso


OAB/Goiás 2003  (1ª fase – 1º exame)   
047) -  No julgamento da ação trabalhista, inexistindo normas legais, o Juiz recorrerá:
a) (       )  à solução mais favorável ao hipossuficiente.
b) (      ) à legislação revogada.
c) (       )  ao ser livre arbítrio.
d) (      )  à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de Direito.

OAB /MATO GROSSO 2003 (1ª fase, 1º exame)
53.  Pelo princípio da norma mais favorável, aplicável ao direito do trabalho, havendo duas ou mais normas jurídicas trabalhistas sobre a mesma matéria, será hierarquicamente superior, e, portanto, aplicável ao caso concreto, a que oferecer maiores vantagens ao trabalhador, dando-lhe condições mais favoráveis. Todavia, esse princípio possui exceções. A saber:

I - na hipótese das leis proibitivas do Estado;
II - quando a norma decorre de negociações coletivas para dar atendimento a situações emergenciais;
III - nas cláusulas normativas que cedem à necessidade de flexibilização, pactuando reduções transitórias de direitos dos trabalhadores;
IV - quando o conflito de leis ocorrer entre norma de origem profissional e norma estatal, hipótese em que prevalece esta.

Responda:
a) (       ) Todas as opções acima atendem ao enunciado da questão.
b) (      ) Somente a opção IV não atende ao enunciado da questão.
c) (       )  Somente a opção I atende ao enunciado da questão.
d) (      ) As opções I e II atendem ao enunciado da questão, enquanto que as opções III e IV    não atendem ao enunciado da questão.



[1] FLÓREZ-VALDÉS apud BASTOS, Celso Ribeiro. Op. cit., p. 145.
[2] Süssekind, Arnaldo, Instituições de Direito do Trabalho, pág. 141.
[3] MIGLIORA, Luiz Guilherme e VEIGA, Luiz Felipe, Apostila sobre Princípios Fundamentais e Natureza Tutelar do Direito do Trabalho.
                                                                                                                       
[4] MIGLIORA, Luiz Guilherme e VEIGA, Luiz Felipe, Apostila sobre Princípios Fundamentais e Natureza Tutelar do Direito do Trabalho.
[5] Süssekind, Arnaldo, Instituições de Direito do Trabalho, pág. 191.

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