Anna Tereza de Aquino Siqueira
Sumário: Introdução; 1 Dinamismo da culpabilidade; 2 Teorias da culpabilidade; 2.1 Teoria psicológica da culpabilidade; 2.2 Teoria psicológica normativa da culpabilidade; 2.3 Teoria normativa pura da culpabilidade; Conclusão;Referencias.
RESUMO
O presente artigo trata da evolução da culpabilidade até se alcançar o seu atual conceito. Realizando um apanhado histórico de como e porque o conceito se desenvolveu, chega-se as teorias da culpabilidade, que explicam o caminho percorrido pelo conceito, os elementos que existiam e os que compõem a culpabilidade atualmente. O artigo mostra as teorias como uma forma de fazer um apanhado do que foi e do que agora significa a culpabilidade.
PALAVRAS- CHAVE
Culpabilidade. Teorias da culpabilidade.
Introdução
Diante das evoluções ocorridas nas sociedades, o ordenamento jurídico, juntamente com seus conceitos, fundamentos e pressupostos, também se modificou. Um dos conceitos que instigou e continua instigando a atenção de estudiosos é o conceito de culpabilidade. Assim como ocorreu o dinamismo nas civilizações e no ordenamento, conseqüentemente ocorreram modificações nos conceitos de culpabilidade.
Com o desenvolvimento das sociedades, novas características foram atribuídas à culpabilidade, tornando necessário o perfeito esclarecimento do papel que possui. Os doutrinadores não são unânimes com o papel que ela exerce como requisito do crime: alguns consideram que ela representa um requisito, enquanto outros consideram apenas que são requisitos do crime a antijuridicidade e o fato típico. A discussão entre doutrinadores ainda se estabelece na necessidade de determinar se a culpabilidade é um pressuposto da pena ou um elemento do crime.
Para se ter um esclarecimento e uma resposta para essas discussões, primeiramente faz-se necessário entender como se deu a evolução do conceito de culpabilidade, como as teorias que envolvem esse requisito se desenvolveram, foram sustentadas e posteriormente substituídas por outras até chegar à atual teoria da culpabilidade.
1 Dinamismo da culpabilidade
Desde o início da organização dos homens em pequenos agrupamentos, existiam normas que regulamentavam como os indivíduos deveriam se comportar. Tais normas não eram positivadas, mas sim baseadas em costumes e na moral. Mesmo não havendo a fixação de regras do Direito Penal, as transgressões eram punidas, só que de maneira privada: cabia ao próprio individuo (ou àquele envolvidos na lesão) realizar a punição. Existia a confusão entre responsabilidade do agente e a pena vingativa aplicada a ele. Nessa época, a responsabilidade era exclusivamente objetiva: para o agente ser responsabilizado bastava apenas haver um nexo de causa entre a conduta praticada pelo agente e o resultado obtido.
A culpa não representava proporcionalidade alguma com a punição, pois esta, como já mencionado, era exercida de forma indiscriminada pelo particular, apenas importando o dano causado, e não a conduta do agente.
Inicialmente a punição era feita por autotutela, em que os indivíduos agiam por conta própria para reparar o dano causado, independentemente da culpabilidade do agente. Com o desenvolvimento da sociedade, essa forma de punição e a responsabilidade do agente modificaram-se. A responsabilidade passou a ser pessoal: começou a ser instituída a responsabilidade subjetiva, com os conceitos de culpa e dolo. Nesse tipo de responsabilidade, a pena era proporcional a conduta do agente, e não somente ao dano.
No Direito Penal da Antiguidade, a responsabilidade penal decorria, contudo, do simples fato lesivo, sem que se indagasse da “culpa” do autor da conduta. Percebeu-se, porém, no decorrer da evolução cultural, que somente podem ser aplicadas sanções ao homem causador do resultado lesivo se, com o seu comportamento, poderia tê-lo evitado. ( MIRABETE, 1991, p.187)
Com a maior complexidade das civilizações e com o advento de inúmeras revoluções que modificaram o cenário mundial, tanto política quando socialmente, o Direito Penal sofreu algumas inovações. Foi o período em que ideais de justiça rondavam o âmbito jurídico e que a pena tinha como fundamento a vontade que o agente impunha ao realizar a conduta, e não somente ao nexo causal entre a conduta e o resultado.
Após toda uma mudança no seu conceito, a culpabilidade é entendida atualmente como o “juízo de reprovação que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente” (GRECO, 2006, p. 407). Muitos doutrinadores entendem que ela é o pressuposto da pena, como ocorre com a maioria dos estudiosos do Brasil, não constituindo um elemento direito do crime (este representado pelo fato típico e pela antijuridicidade).
2 Teorias da culpabilidade
Como a sociedade está sempre em mudança, o ordenamento jurídico também sofre alterações e assim as ideias existentes sobre os conceitos do Direito (neste caso o Direito Penal) são conseqüentemente transformadas. Com as teorias da culpabilidade, busca-se explicar como ocorreu a evolução do conceito, até se chegar à noção atual de culpabilidade.
Como antigamente a responsabilidade era objetiva, pautada unicamente na relação causa-efeito entre a conduta e o resultado, as penas eram estabelecidas privativamente e sem relação de culpa ou dolo. Com o desenvolvimento dos ordenamentos jurídicos, as penas começaram a ser explicadas e fundamentadas de acordo com a conduta do antes que poderia tê-la evitado.
Nesse contexto, surge a responsabilidade subjetiva, em que a conduta com culpa ou dolo define a culpabilidade. Diante dessa transformação no conceito de culpabilidade, e do surgimento do dolo e da culpa, algumas teorias foram criadas para explicar o conceito e traduzir a realidade de cada tempo e sociedade. Entre as teorias estão as teoria psicológica, a teoria normativa psicológica e a normativa pura.
2.1 Teoria psicológica da culpabilidade
A teoria psicológica expressa a relação existente entre o fato cometido e o autor (com sua consciência). É o posicionamento que o autor assume frente à ação cometida. Essa teoria recebeu forte influência do positivismo. Ela tem como fundamento a teoria causal ou naturalística da ação. Para essa teoria, a culpabilidade é entendida como elo psicológico, e conseqüentemente subjetivo, que liga o autor ao resultado. “Enfim, a culpabilidade, era para essa teoria, a relação psicológica, isto é, o vínculo subjetivo entre a conduta e o resultado, assim como no plano objetivo, a relação física era a causalidade” ( BITTENCOURT, 2008, p. 339).
Segundo essa teoria, dolo e culpa eram espécies de culpabilidade e ao mesmo tempo as partes constitutivas dela, defendendo a idéia de que todos os elementos da culpabilidade são subjetivos.
Diante de seus fundamentos, a teoria apresentou inúmeros erros, principalmente no que concerne a explicação do dolo e da culpa como espécies da culpabilidade, constituindo elementos da mesma natureza. Sendo a culpa normativa e o dolo um conceito psíquico eles não deveriam definir conjuntamente a culpabilidade. A doutrina apresentou insuficiências para explicar a culpa consciente e os casos em que existe a extinção ou diminuição da responsabilidade.
O erro dessa doutrina consiste em reunir como espécies fenômenos completamente distintos: o dolo e a culpa. Se o dolo é caracterizado pelo querer e a culpa pelo não querer, conceitos positivo e negativo, não podem ser espécies de um denominador comum, qual seja, a culpabilidade. Não se pode dizer que entre ambos, o ponto de identidade seja a relação psíquica entre o autor e o resultado, uma vez que na culpa não há esse liame, salvo a culpa consciente. ( DAMÁSIO, 2002, p. 460)
2.2 Teoria Psicológico-normativa da culpabilidade
Após análises, ficou claro que dolo e culpa não poderiam ser espécies da culpabilidade, já que um é conceito psíquico e outro normativo e a partir dessa percepção, uma nova doutrina surge buscando conceituar a culpabilidade. Se desvinculando dos fundamentos da teoria causal ou naturalística da ação, essa nova doutrina aparece com fundamentos da teoria neokantiana do delito.
Tal teoria desconsidera que dolo e culpa sejam espécies únicas da culpabilidade. Passa a admitir que eles, juntamente com outros conceitos, são elementos da culpabilidade. Segundo Cezar Roberto Bittencourt (2008, p. 343), essa teoria “vê a culpabilidade como algo que se encontra fora do agente, isto é, não mais como um vínculo entre este e o fato, mas como um juízo de valoração a respeito do agente.”
Nesse caso a culpabilidade é entendida como um “sentimento” levado pelo agente do fato, porém que advém da ordem jurídica. O autor que comete um fato típico e antijurídico leva consigo o “peso” do resultado que obteve, e é esse o conceito de culpabilidade que a teoria defende. Nela o dolo e a culpa são elementos da culpabilidade, sendo certo que, de acordo com Damásio de Jesus (2002, p. 460), para a teoria psicológico-normativa são elementos da culpabilidade a imputabilidade, o elemento psicológico normativo – dolo ou a culpa e a exigibilidade da conduta diversa.
Nota-se que essa teoria trouxe certo desenvolvimento ao conceito de culpabilidade, ao extinguir dolo e culpa como espécies únicas da culpabilidade, ao defender e indicar elementos que a compõe (imputabilidade e exigibilidade). Porém ainda traz a noção de dolo (um conceito psicológico), contraditoriamente ao conceito de culpabilidade que é um fenômeno normativo.
2.3 Teoria normativa pura
A teoria normativa pura surge com o intuito de superar os erros iniciados pela teoria psicológica e incorporados posteriormente pela teoria psicológico-normativa. Ela é fundamentada pela teoria finalista da ação e exclui da culpabilidade o conceito de dolo, esse recaindo agora apenas sobre a pena, não mais sobre a reprovação de juízo.
Com essa nova teoria, elementos que eram próprios do dolo foram incorporados como elementos da culpabilidade, e a culpa, assim como o dolo, deixou de ser elemento dela.
Da culpabilidade foram extraídos o dolo e a culpa, sendo transferidos para a conduta do agente, característica integrante do fato típico. O dolo, após a sua transferência, deixou de ser normativo, passando a ser um dolo tão-somente natural. Na culpabilidade, contudo permaneceu a consciência sobre a ilicitude do fato (extraída do dolo) (GRECO, 2006, p. 418)
Destarte, passam a constituir elementos da culpabilidade a imputabilidade, a potencial consciência sobre a ilicitude do fato e a exigibilidade da conduta diversa. A culpabilidade assume então a representação de um “juízo de valor que existe sobre um ato psicológico que existe ou falta” (JESUS, 2002, p. 462). Essa teoria encerra as teorias e é a que comumente é usada no caso brasileiro.
Conclusão
Assim, como tudo na sociedade, o direito também se modificou e dessa forma os fundamentos dele também. A culpabilidade inicialmente era vista como uma responsabilidade objetiva, em que a culpa ou o dolo do agente não tinham proporção com a pena. Com o passar dos anos notou-se a necessidade de mudar a direção dessa responsabilidade, então ela passou a ser subjetiva, quando a conduta do agente tinha proporção com a pena.
Foi no contexto da responsabilidade subjetiva que surgiram as teorias sobre a culpabilidade, com o intuito de conceituar a culpabilidade e estabelecer sua inclusão como pressuposto da pena ou característica do crime. Passando pela teoria psicológica, pela teoria psicológica-normativa e finalizando na teoria normativa pura, o conceito de culpabilidade foi exposto e fixado, sendo esta um juízo de valor que reprova uma atitude típica e ilícita, não sendo caracterizada como característica do crime, mas sim como pressuposto da pena.
REFERÊNCIAS
BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. vol.1. 13ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 7º ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2002.
MIRABETE, Júlio Fabrinni. Manual de direito penal. 6º ed. São Paulo: Atlas, 1991.
Principio da Culpabilidade / Culpa - Continuação escrito em sexta 23 janeiro 2009 17:48
Explicação do Caderno: significa que ninguém será punido se não tiver agido com DOLO ou CULPA, no sentido estrito (negligência, imprudência ou imperícia). Não deve a culpabilidade ou culpa em sentido amplo ser confundida com o crime culposo, que se apresenta sob as modalidades de negligência, imprudência ou imperícia, pois quem age negligentemente também é culpado. Toda vez que se cometa um fato típico o sujeito é submetido a um grau e censura. Assim, a culpabilidade é um pressuposto para imposição da pena.
Requisitos para o juiz aplicar a pena na medida da culpabilidade e culpa (pressuposto para a condenação)
· Culpa no sentido estrito: CRIME CULPOSO: quando age por negligência, por imprudência ou imperícia (quando não tem a intenção).
· Culpa em sentido amplo: CRIME DOLOSO E CULPOSO
· Crime doloso: em decorrência de um fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, que compreende : o dolo.
· OBS: Culpa em sentido amplo NÃO se condunfe com o crime culposo.
Caracteriza a Culpabilidade – ELEMENTOS
- Imputabilidade Penal: refere – se à capacidade do agente de se lhe atribuir o fato e de ser penalmente responsabilizado. Exemplo: Agente com 18 anos ou mais.
- Possibilidade da Ilicitude da Conduta: saber se a conduta é criminosa. Deve – se chegar à conclusão de que o agente, com algum esforço ou cuidado, poderia saber que o fato é ilícito.
- Exigibilidade da Conduta de Outra Conduta (conduta diversa): refere – se ao fato de saber se, nas circunstâncias, seria exigível que o acusado agisse de forma diversa. Não haverá pena se, nas circunstâncias , foi impossível para o acusado agir de outra forma.
· Exemplo: Coação
o Erro de tipo: erro invencível (não poderia evitar)
poderia ter evitado
EXPLICAÇÃO DO CADERNO – ELEMENTOS
· Imputabilidade Penal: só há culpabilidade se o sujeito de acordo com as suas condições psíquicas poderia estruturar sua consciência e vontade de acordo com o direito.
· Possibilidade de Conhecimento a ilicitude: se estava em condições de compreender o caráter ilícito de sua conduta.
· Exigilbilidade de Conduta diversa: se era possível exigir nas circunstâncias, conduta diferente que o agente teve.
Não haverá culpa
· Inimputabilidade penal: incapacidade absoluta
1 – doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado;
2 – menoridade;
3- embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior;
4- dependência de substância entorpecente.
· Inimpossibilidade de conhecimento de caráter ilícito da sua conduta: se ao agente “falta discernimento ético para entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se com esse entendimento.”
· Inexigibilidade de Outra Conduta: Exemplo: "Em todos os casos de necessidade exculpante, o deve ser uma necessidade, isto é, devem ser situações em que não se possa juridicamente exigir do autor a realização de uma conduta menos lesiva".
· Coação irresistível; obediência hierárquica.
· Causas de Exclusão da Culpabilidade ou dirimentes: Na parte geral do código tem – se legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito. Excluem – se a culpabilidade e, em conseqüência, excluem a pena, sem excluir, porém a existência do crime. Usa – se a expressão “isento de pena” ou “não é punível”.
*exclui – se a culpa, mas não o crime.
A exclusão da pena ocorre em 3 situações:
Inimputabilidade penal – art. 26 caput, 27 e 28 § 1º.
Impossibilidade de conhecimento – art. 20, 21, e 22 segunda parte.
Inegibilidade de outra conduta – art. 22 primeira parte.
Causas de Exclusão da Ilicitude ou da antijuricidade: Na parte especial tem – se:
- coação para impedir suicídio – art. 146, §3º., II
- ofensa praticada em juízo na discussão da causa – art. 142, I
- aborto para salvar a vida da gestante – art. 128
- violação de domicílio quando um crime está ali sendo praticado – art. 150, §3º., II
- *exclui – se o crime.
Escusas absolutas: são causas pessoais que isentam de pena quando:
- praticado um crime contra o patrimônio em que não haja violência ou grave ameaça, envolvendo as pessoas descritas no art. 181.
- Fatores pessoais que excluem a pena de modo objetivo, por mera política criminal.
- Não exclui o crime e nem a culpabilidade.
Exemplo: Art. 348, §2º do CP. - CRIMES QUE NÃO TENHAM GRAVES AMEAÇAS OU VIOLÊNCIAS.
Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal – art. 5º., XXXiX da CF: Só o Estado tem o poder de elaborar leis penais, somente por meio de Leis Ordinárias e não por Medidas Provisórias.
Constituindo uma efetiva limitação ao poder punitivo do Estado, significa que não haverá crime se não houver lei escrita definindo a infração penal e impondo-lhe conseqüente pena.
Faz da lei penal fonte exclusiva de aplicação, onde seus fundamentos são de ordem formal pela expressa previsão legal da infração penal. “Verifica-se que a lei é a fonte única de criação dos delitos e das penas.”
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