Capítulo III – Tratamento
1.OBJETIVOS DO TRATAMENTO DA ASMA
Os objetivos principais do tratamento da asma são:
Controlar sintomas
Prevenir limitação crônica ao fluxo aéreo
Permitir atividades normais – trabalho, escola e lazer
Manter função pulmonar normal ou a melhor possível
Evitar crises, idas à emergência e hospitalizações
Reduzir a necessidade do uso de broncodilatador para alívio
Minimizar efeitos adversos da medicação
Prevenir a morte
2.MEDICAMENTOS MAIS UTILIZADOS
Os medicamentos para asma podem ser divididos em duas categorias, conforme o objetivo da sua utilização: 1) fármacos para melhora dos sintomas agudos (b2-agonistas com rápido início de ação, brometo de ipratrópio e aminofilina); 2) fármacos para manutenção, usados para prevenir os sintomas (corticosteróides inalatórios e sistêmicos, cromonas, antagonistas de leucotrienos, b2-agonistas de longa duração e teofilina de liberação lenta).
2.1.BRONCODILATADORES b2-AGONISTAS
Os broncodilatadores mais usados na prática clínica são os b2-agonistas, que podem ser classificados em de curta ação, como o salbutamol, a terbutalina e o fenoterol, cujo efeito broncodilatador dura aproximadamente quatro a seis horas, ou de longa ação, como o salmeterol e o formoterol, com efeito de até 12 horas.
A maioria dos efeitos dos b2-agonistas é mediada pela ativação da adenilciclase e da produção intracelular de AMP cíclico(1). O b-receptor é constituído de sete domínios inseridos na membrana celular, dispostos em círculo. Os b2-agonistas de curta duração estimulam domínios alcançados externamente, enquanto os de longa duração devem penetrar na membrana para estimular lateralmente o receptor, daí seu início retardado de ação(2). O formoterol exibe os dois mecanismos de ação, sendo de longa duração e de início rápido de ação.
O b-receptor é acoplado à proteína G e sua ligação leva a subunidade da proteína G a estimular a adenilciclase e a produção de AMP cíclico(2). Este ativa a proteína quinase A, que produz a maioria dos efeitos celulares do b-receptor.
Os b2-agonistas são parcialmente seletivos para os receptores b2, concentrando o seu efeito sobre a musculatura brônquica e poupando o sistema cardiovascular de paraefeitos indesejáveis.
Os broncodilatadores b2-agonistas de curta ação são as medicações de escolha para o alívio dos sintomas da asma, enquanto os b2-agonistas de longa ação são fármacos que, associados à terapia de manutenção com corticosteróides inalatórios, atuam para o melhor controle dos sintomas(3).
O emprego de b2-agonistas de curta duração como tratamento isolado de manutenção não é recomendado; o uso freqüente (mais de duas vezes por semana) indica necessidade de tratamento antiinflamatório(4).
Quando administrados por via inalatória, esses medicamentos resultam em menos taquicardia e tremor. Raramente desencadeiam arritmias graves. As opções disponíveis para uso inalatório são: solução para nebulização, aerossol dosimetrado e inaladores de pó. Em doses elevadas, podem contribuir para hipopotassemia. Efeitos centrais são incomuns e incluem cefaléia, ansiedade, sedação, fadiga, náuseas e vômitos. Pode haver hipoxemia, em geral discreta, por piora da relação ventilação/perfusão. Em tratamento intensivo, os b2-agonistas têm sido empregados por via endovenosa ou subcutânea.
Os b2 de longa duração têm efeito por até 12 horas. Duas preparações são disponíveis: salmeterol e formoterol. O início de ação do formoterol é rápido, semelhante ao dos b2 de curta duração (um minuto), ao passo que o salmeterol tem início de ação em 20 minutos, com pico de efeito entre duas e três horas, aproximadamente.
Esses medicamentos não têm ação antiinflamatória, não devendo ser usados isoladamente para o tratamento da asma(5-9).
Em caso de crise, um b2 de ação rápida deve ser preferido, não se reduzindo seu efeito se tiver havido uso prévio de b2 de ação prolongada (locais distintos de estimulação do b-receptor)(10). Entretanto, há evidências de que o formoterol induza melhor controle da asma que os b2 de curta ação, podendo ser também utilizado como droga de resgate(11).
À semelhança dos agentes de curta duração, pode-se demonstrar tolerância em nível laboratorial, com perda do efeito broncoprotetor, com o uso contínuo destes agentes, porém a importância clínica não foi estabelecida.
Os efeitos adversos dos b2 de ação prolongada são semelhantes aos dos b2 de curta duração e incluem tremor, taquicardia e hipocalemia(12,13).
Vários estudos demonstraram que a adição de b2-agonistas de ação prolongada ao corticosteróide inalado leva a melhor controle da asma do que a duplicação da dose do corticosteróide(14-17).
2.2.ANTICOLINÉRGICOS
O brometo de ipratrópio é o único anticolinérgico disponível para uso inalatório no Brasil. Seu efeito broncodilatador se deve à redução do tônus colinérgico intrínseco das vias aéreas. Possui início lento de ação, com efeito máximo entre 30 minutos e uma hora após a administração(18). Sua ação broncodilatadora é inferior à dos b2-agonistas e sua utilização é limitada no manejo da asma a longo prazo. Na asma aguda grave, tem efeito adicional aos b2-agonistas com comprovada relação custo-efetividade(19). O brometo de ipratrópio é o tratamento de escolha para broncoespasmo induzido por betabloqueadores.
2.3.XANTINAS
A teofilina e a aminofilina são broncodilatadores de baixa potência e elevado risco de efeitos colaterais(20). Todavia, além de broncodilatadoras, as xantinas parecem ter alguma ação antiinflamatória, equiparável à dose baixa de beclometasona inalatória ou equivalente(21).
A aminofilina é uma opção secundária de broncodilatador para alívio imediato dos sintomas da asma(22). Seu uso como medicação de alívio deve restringir-se a pacientes hospitalizados, de preferência em infusão contínua.
As teofilinas de liberação lenta podem ser administradas como fármacos de controle, para evitar exacerbações(21,23). São superiores às de ação curta por determinarem menor oscilação dos níveis séricos, melhorarem a adesão e oferecerem melhor proteção contra a asma noturna. Entretanto, sua eficácia para o controle de sintomas noturnos é inferior à obtida com uso dos b2-agonistas de longa duração, por via inalatória(24).
A margem terapêutica das xantinas é muito estreita, isto é, a dose tóxica é próxima da dose terapêutica. Por outro lado, seus níveis séricos, devido ao seu metabolismo hepático, podem ser marcadamente afetados por diversos fatores, incluindo idade, dieta, doenças e interações com outras drogas, tudo contribuindo para a complexidade no uso seguro destas medicações(20). Entre as drogas utilizadas para tratamento da asma, as xantinas têm o maior potencial para toxicidade grave. Sintomas gastrointestinais podem ser intoleráveis para alguns pacientes, mesmo nas doses terapêuticas usuais. No início do tratamento os efeitos colaterais podem ser reduzidos por elevação gradual das doses. Náuseas, diarréia, vômitos, cefaléia, irritabilidade e insônia são comuns quando a concentração sérica excede 20mcg/ml, e convulsões, encefalopatia tóxica, hipertermia, dano cerebral e morte podem ocorrer em concentrações séricas maiores(20). Hiperglicemia, hipocalemia, hipotensão e arritmias cardíacas podem também ocorrer, especialmente após superdosagem aguda. Pacientes idosos e lactentes têm maior risco de toxicidade.
A bamifilina é uma xantina com menor incidência de efeitos colaterais (exceto reações de pele), mas faltam estudos comparando sua eficácia em relação à teofilina.
2.4.CORTICOSTERÓIDES
São os fármacos de escolha no tratamento de manutenção dos pacientes com asma persistente. Após penetrar na célula, o corticosteróide une-se a um receptor, sendo então transportado ao núcleo, onde se liga a seqüências do DNA, resultando em indução ou supressão de diversos genes envolvidos na produção de citocinas, moléculas de adesão e receptores relevantes no processo da inflamação(25). Estudos de biópsias brônquicas em pacientes com asma demonstraram que os corticosteróides inalados reduzem o número e a ativação das células inflamatórias e a HR das vias aéreas. Enquanto a redução dos sintomas é rápida, melhora significativa da inflamação e da função pulmonar ocorrem em dias ou semanas, e a modificação da HR, ao longo de vários meses.
2.4.1.CORTICOSTERÓIDES INALATÓRIOS
Os corticosteróides inalatórios são os fármacos que oferecem melhor relação custo/risco/benefício para o controle da asma persistente. Sua utilização tem sido associada à redução da mortalidade e das hospitalizações por asma(3,4,26).
A terapia inalatória com corticosteróides na asma só foi possível com a introdução de agentes que reuniram máxima potência tópica e mínima biodisponibilidade sistêmica. Estas características foram alcançadas com os agentes lipossolúveis de alta afinidade ao receptor e rápida inativação na primeira passagem pelo fígado, após absorção sistêmica. Logo após o uso do corticosteróide inalado, parte da droga depositada na orofaringe é deglutida e absorvida. A biodisponibilidade sistêmica total é a soma das frações absorvidas do pulmão, trato digestivo e mucosa oral(25).
Existem, entretanto, diferenças de potência clínica quando as doses nominais das diversas preparações são comparadas: flunisolida @ triamcinolona < beclometasona < budesonida < fluticasona (Quadro 1)(3). Budesonida e fluticasona têm melhor índice terapêutico que os demais. Os dispositivos para administração podem afetar a potência terapêutica dos corticosteróides inalatórios. A budesonida por sistema Turbuhaler® tem deposição duplicada em relação ao aerossol dosimetrado, aumentando a eficácia clínica(27).
Consideram-se doses baixas/médias de corticosteróides inalatórios as inferiores a 800mcg de beclometasona/dia em adultos e 400mcg/dia em crianças, e, doses altas, acima desses valores(3).
Os corticosteróides inalatórios são usualmente utilizados duas vezes ao dia. Em pacientes graves, ou durante exacerbações, a freqüência poderá ser elevada para três ou quatro vezes ao dia(28,29).
2.4.2.CORTICOSTERÓIDES SISTÊMICOS
Prednisona ou prednisolona são os corticosteróides mais utilizados e, por terem meia-vida intermediária, induzem menos efeitos colaterais.
Os corticosteróides orais para controle podem ser necessários em alguns pacientes com asma persistente grave, não estabilizados com outros medicamentos. Deve-se buscar a dose mínima suficiente para controlar cada paciente e administrá-la de uma só vez. Uso em dias alternados pode reduzir os efeitos adversos.
Os corticosteróides sistêmicos são essenciais nas exacerbações quando não há resposta satisfatória aos broncodilatadores, devem ser usados precocemente, e preferencialmente por via oral. A dose, a duração do seu uso e a via de administração dependem da gravidade da crise, da história prévia de exacerbações graves, do uso prévio de corticosteróide e da dose do corticosteróide inalatório em uso corrente. Em pacientes com exacerbações leves, em uso de doses baixas de corticosteróide inalatório, a dose pode ser apenas aumentada. Em crises graves ou em pacientes já em uso de doses elevadas de corticosteróide inalatório, corticosteróide oral ou parenteral deve ser empregado.
2.4.3.EFEITOS COLATERAIS LOCAIS
Candidíase oral é infreqüente quando os corticosteróides inalatórios são administrados com espaçadores e quando os pacientes lavam a boca imediatamente após o uso. Rouquidão é comum e reversível e deve-se à miopatia dos músculos da laringe, não sendo reduzida por espaçadores. Tosse e irritação na garganta, algumas vezes acompanhadas de broncoconstrição, podem ocorrer com os aerossóis dosimetrados devido aos propelentes ou detergentes associados. Este fenômeno não costuma ocorrer com os inaladores de pó.
2.4.4.EFEITOS COLATERAIS SISTÊMICOS
A supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal pelos corticosteróides depende da dose, duração, forma de uso e formulação empregada. Não existe efeito supressor significativo com doses de beclometasona ou equivalente £1.500mcg/dia em adultos e £ 400mcg/dia em crianças, se cursos de corticosteróide oral não forem prescritos com freqüência(30). O teste mais sensível para sua detecção é a dosagem do cortisol na urina de 24 horas ou o teste de estimulação com o ACTH. A medida do cortisol sérico tem baixa sensibilidade (50%). Em pacientes em uso crônico de corticosteróide oral que iniciam a substituição pelo inalatório, a suspensão das doses orais deve ser cuidadosa, pois a recuperação adrenal pode ser lenta (até três anos). Indivíduos em uso contínuo de corticosteróide oral que sofrem trauma maior (cirurgia ou doença grave) podem necessitar de doses suplementares dessa medicação.
Osteoporose é observada em 30% a 50% dos indivíduos em uso crônico de corticosteróide sistêmico, variando com a dose e o tempo de utilização. O controle da asma com corticosteróides inalatórios com conseqüente retirada dos orais é atualmente a estratégia mais efetiva para prevenir perda óssea significativa. A osteoporose pode ser minimizada com atividade física regular, exposição controlada ao sol, alimentação rica em cálcio e uso oral de bifosfonatos ou reposição de estrógenos em mulheres na pós-menopausa(31).
Estudos populacionais sugerem que pode haver risco de catarata e glaucoma em idosos em uso de altas doses de corticosteróide inalatório por tempo prolongado(32).
Adelgaçamento da pele e equimoses são dependentes da dose e do tempo de uso, tendo maior prevalência em idosos.
Estudos de longa duração demonstraram que os corticosteróides inalatórios podem desacelerar o crescimento de crianças, mas não teriam efeito sobre a estatura final(33,34).
Miopatia aguda pode ocorrer com altas doses de corticosteróides no tratamento da crise, particularmente se forem associados a bloqueadores neuromusculares. Miopatia crônica é rara, sendo mais comum com o emprego dos corticosteróides fluorados.
Diabete melito é mais freqüente em pacientes em uso de corticosteróides sistêmicos.
Não há aumento no risco de infecções em pacientes recebendo corticosteróides inalatórios ou prednisona em doses abaixo de 10mg/dia.
2.5.CROMONAS
Embora consideradas antiinflamatórias, a redução da hiper-responsividade brônquica observada com a utilização das cromonas é modesta(35). O nedocromil e o cromoglicato bloqueiam os canais de cloro da membrana celular dos mastócitos, eosinófilos, nervos e células epiteliais(36). Os canais de cloro são usualmente fechados, mas abrem-se quando existe ativação celular, com entrada de cálcio e degranulação dos mastócitos. As cromonas restauram os canais para a posição fechada, aumentando o limiar para sua ativação.
Ambas as drogas são seguras e têm raros efeitos colaterais. O nedocromil não está mais disponível em nosso meio e o cromoglicato tem como maior desvantagem a necessidade de ser administrado quatro vezes ao dia.
2.6.ANTAGONISTAS DOS LEUCOTRIENOS
Os antileucotrienos bloqueiam a síntese ou as interações com os receptores dos leucotrienos. Os agentes em uso clínico no Brasil são montelucaste e zafirlucaste (antagonistas dos receptores).
Seu efeito broncodilatador é modesto, lento, e inferior ao obtido com os b2-agonistas, embora possa ser aditivo a estes.
Os antileucotrienos têm efeito antiinflamatório e, com uso prolongado, reduzem a hiper-responsividade das vias aéreas(37,38). Têm também efeito protetor na broncoconstrição induzida pelo exercício. Sua indicação deve ser considerada em pacientes com asma persistente ou sintomas induzidos por exercício(38,39).
Alguns estudos demonstraram que, em pacientes com asma de maior gravidade, os antileucotrienos podem permitir a redução do corticosteróide inalado, sem perda do controle da doença, particularmente em asmáticos com sensibilidade à aspirina(40).
Embora alguns casos de vasculite de Churg-Strauss tenham sido descritos com o emprego de antileucotrienos em pacientes que interromperam o uso de corticosteróides orais, não há muitas referências de outros efeitos adversos importantes(41).
3.TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO
A introdução precoce de tratamento antiinflamatório pode resultar em melhor preservação da função pulmonar a longo prazo, prevenindo o remodelamento das vias aéreas. Por outro lado, a asma leve pode permanecer inalterada por muitos anos.
Alguns pacientes desenvolvem obstrução irreversível após muitos anos de atividade da doença. A percentagem é pequena e, provavelmente, os com formas mais graves têm risco maior. Igualmente, faltam dados definitivos demonstrando que a terapia antiinflamatória proteja completamente contra lesões irreversíveis das vias aéreas. O tratamento atual é dirigido para controlar os sintomas e prevenir crises.
3.1.PRINCÍPIOS DO TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO
Todos os pacientes com asma devem receber orientação sobre sua doença e noções de como eliminar ou controlar fatores desencadeantes, especialmente domiciliares e ocupacionais.
A educação dos pacientes e familiares pode ser feita em bases individuais ou em grupos.
As diferenças entre tratamento broncodilatador sintomático e tratamento de manutenção regular devem ser enfatizadas.
O paciente deve entender a doença e seu tratamento; em casos graves, um medidor de pico de fluxo deve ser utilizado para melhor auto-controle.
Todos os pacientes com asma persistente moderada ou grave devem ter um plano de ação escrito para uso em caso de exacerbações.
A terapia deve focalizar de forma especial a redução da inflamação, evitando-se o contato com alérgenos e enfatizando o uso precoce de agentes antiinflamatórios na asma persistente.
Deve-se iniciar o tratamento de acordo com a classificação da gravidade da asma. Havendo dúvida, inicia-se por uma etapa mais elevada.
Uma vez obtido o controle por período aproximado de três a seis meses, podem-se reduzir as doses das medicações, mantendo-se o paciente monitorizado.
Tentativas para reduzir a dose dos corticosteróides inalatórios são apropriadas se o paciente alcançou estabilidade, indicada por sintomas esporádicos, normalização da função pulmonar e uso ocasional de b2-agonistas para alívio. Por outro lado, a cessação completa dos corticosteróides inalatórios provavelmente resultará em deterioração clínica, em tempo variável, estando relacionada ao grau de HR(42).
Sempre que o controle esperado não for obtido, antes de quaisquer mudanças deve-se considerar:
–a adesão do paciente ao tratamento;
–a técnica de uso dos dispositivos inalatórios;
–a presença de fatores desencadeantes e/ou agravantes, como sinusite crônica, refluxo gastroesofágico, exposição a novos alérgenos, distúrbios psicossociais e outros.
Curso breve de corticosteróide oral (cinco a 10 dias) pode ser necessário em qualquer etapa em caso de exacerbação (prednisona 1 a 2mg/kg/dia ou 40mg/dia ou equivalente), sem haver necessidade de redução gradual(43).
3.2.ETAPAS DO TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO
I – Asma intermitente
Utilizar b2 de curta duração por via inalatória para alívio dos sintomas.
II – Asma persistente leve
Utilizar b2 de curta duração por via inalatória para alívio dos sintomas.
Iniciar terapia antiinflamatória de manutenção. A primeira escolha é corticosteróide inalatório, por exemplo, beclometasona (400 a 800mcg/dia em adultos e 200 a 400mcg/dia em crianças) ou outro corticosteróide inalatório em doses equivalentes. Alternativas:
–antileucotrienos para quem prefere a via oral ou
–cromoglicato dissódico, especialmente para crianças.
III – Asma persistente moderada
Utilizar b2 de curta duração por via inalatória para alívio dos sintomas.
Manter as mesmas doses de corticosteróide inalatório da etapa II associando a b2 de longa duração ou duplicar a dose de corticosteróide inalatório.
Quando os sintomas persistirem com os tratamentos anteriores, utilizar doses elevadas de corticosteróide inalatório, associado a b2 de longa duração com ou sem antileucotrienos e/ou teofilina.
IV – Asma persistente grave
Utilizar corticosteróide por via oral na menor dose necessária para controle dos sintomas, mantendo as medicações da etapa anterior.
No Quadro 2 estão indicados os esquemas de tratamento em cada etapa.
3.3.DISPOSITIVOS PARA ADMINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS POR VIA INALATÓRIA
A deposição pulmonar dos medicamentos depende dos tipos de dispositivos inalatórios. A escolha do dispositivo mais adequado depende da análise de vários aspectos tais como(27,44-49):
1.A satisfação e a adesão do paciente ao tratamento pode ser melhorada se for respeitada, dentro do possível, sua escolha pessoal por determinado dispositivo.
2.A escolha deve ser baseada na otimização do custo/benefício considerando fatores ligados ao paciente, à droga e aos dispositivos disponíveis.
3.A maioria dos pacientes, quando bem orientados, consegue usar eficientemente os aerossóis dosimetrados.
4.Em pacientes com dificuldade de uso dos aerossóis dosimetrados, inclusive quando acoplados a espaçadores, a melhor alternativa são os inaladores de pó.
5.Nebulizadores de jato são reservados para crises de asma grave, crianças com menos de três anos e idosos debilitados ou com dificuldade cognitiva que não conseguem usar corretamente ou não se adaptam aos aerossóis dosimetrados acoplados ou não aos espaçadores ou inaladores de pó.
6.Sempre que possível, usar apenas um tipo de dispositivo para facilitar o aprendizado da técnica e melhorar a adesão ao tratamento.
7.A escolha deve levar em consideração a apresentação dos medicamentos/dispositivos disponíveis e facilidade de transporte (os pacientes podem ter dificuldade de carregar espaçadores de grande volume).
8.Para reduzir os efeitos adversos, pacientes que necessitam de altas doses de corticosteróides inalatórios devem acoplar espaçador ao aerossol dosimetrado e lavar a boca após o uso de inaladores de pó.
9.Independentemente do grau de dificuldade de aprendizado da técnica, é essencial conferir e reorientar periodicamente o uso adequado de cada dispositivo.
Nos Quadros 3 e 4 estão relacionadas as técnicas de utilização e as vantagens e desvantagens dos dispositivos.
3.4.IMUNOTERAPIA
A imunoterapia deve ser administrada por especialista treinado no manejo de reações anafiláticas graves e deve ser indicada apenas na asma atópica, demonstrada por IgE específica aumentada e testes cutâneos de hipersensibilidade imediata positivos.
Pacientes com sensibilização múltipla (vários alérgenos) podem não se beneficiar do tratamento imunoterápico. É importante verificar cuidadosamente se a profilaxia ambiental está sendo realizada e demonstrar outros desencadeantes que possam estar envolvidos.
A imunoterapia é mais efetiva em crianças e adolescentes do que em adultos. Não deve ser indicada para indivíduos com menos de cinco ou com mais de 60 anos.
Por razões de segurança, o paciente deverá estar fora de crise no momento da aplicação da injeção (efeitos colaterais graves têm sido observados em indivíduos com asma grave em crise aguda).
Para pacientes em terapia farmacológica, antes de administrar a injeção, é aconselhável verificar se o VEF1 está acima de 70% do previsto.
Asmáticos leves ou muito graves devem ser excluídos.
Não está indicada para os pacientes que respondem bem à profilaxia ambiental e ao tratamento farmacológico.
Contra-indicá-la para pacientes com outras doenças imunológicas ou auto-imunes associadas, nos que recebem drogas betabloqueadoras e para aqueles sem adesão ao tratamento.
Avaliar a relação custo/benefício/adesão ao tratamento frente ao poder aquisitivo do paciente.
Avaliar a confiabilidade dos extratos disponíveis.
3.5.ACOMPANHAMENTO
Pacientes com asma persistente devem ser avaliados regularmente. Nos classificados como moderados e graves, especial atenção deve ser dada ao crescimento e à função pulmonar (PFE, espirometria) a cada consulta, com avaliação oftalmológica e densitometria óssea anualmente. Nos pacientes graves é aconselhável a utilização do PFE matinal antes do uso de broncodilatadores.
A espirometria deve ser realizada para avaliação do controle da asma e sempre que houver mudança no esquema terapêutico.
3.6.ENCAMINHAMENTO AO ESPECIALISTA
Os pacientes devem ser encaminhados ao especialista nas seguintes situações:
dúvida sobre o diagnóstico da doença (ex.: asma vs. DPOC, tosse persistente, dispnéia de causa inaparente)
provável asma ocupacional
asma de difícil controle – asma instável, sintomas contínuos apesar de altas doses de corticosteróide inalatório ou necessidade de uso de corticosteróide sistêmico para controle
piora da asma na gravidez
adesão pobre ao tratamento e problemas psicossociais
alta hospitalar recente
entidades clínicas complicando a asma (ex.: sinusite crônica, refluxo gastroesofágico persistente grave).
4.TRATAMENTO DA CRISE
As crises de asma devem ser classificadas segundo sua gravidade (Quadro 5) e o tratamento instituído imediatamente(50-52).
4.1.IDENTIFICAÇÃO DO ASMÁTICO DE RISCO
A causa da morte por asma é asfixia na quase totalidade dos casos. Tratamento excessivo, como causa de óbito, é raro. Por isso, é preciso identificar os seguintes aspectos que indicam maior risco para os pacientes(53):
três ou mais visitas à emergência ou duas ou mais hospitalizações por asma nos últimos 12 meses
uso freqüente de corticosteróide sistêmico
crise grave prévia, necessitando intubação
uso de dois ou mais tubos de aerossol dosimetrado de broncodilatador/mês
problemas psicossociais (ex.: depressão)
co-morbidades – doença cardiovascular ou psiquiátrica
asma lábil, com marcadas variações de função pulmonar (> 30% do PFE ou do VEF1 previstos)
má percepção do grau de obstrução
No Quadro 6 estão mostradas as indicações para a realização de exames complementares.
4.2.TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
O tratamento deve ser baseado no quadro clínico e, quando possível, na avaliação objetiva da limitação ao fluxo aéreo pela espirometria ou PFE. Em crianças com menos de seis anos de idade, utilizam-se os critérios de Wood-Downes(54,55).
Doses adequadas e repetidas de b2-agonista por via inalatória a cada 10-30 minutos na primeira hora constituem a primeira medida(22).
O tratamento inicial pode envolver o uso de oxigênio, doses altas repetidas de b2-inalatório (associado ou não a anticolinérgico) e corticosteróide sistêmico. Todos os pacientes com SaO2 £ 95% devem receber oxigênio(54).
O efeito do b2-agonista por nebulizador de jato é o mesmo que o obtido por aerossol dosimetrado acoplado a espaçador. A administração por aerossol dosimetrado com espaçador valvulado de grande volume é eficaz mesmo em casos de crise muito grave (VEF1 < 30%) e pode resultar em reversão mais rápida da obstrução(56).
Em adultos, o efeito máximo é obtido, em geral, com 8-16 jatos do aerossol dosimetrado, devendo ser fornecidos 4-5 jatos a cada 15 minutos; em crises graves podem ser fornecidos até oito jatos a cada 10-15 minutos ou umjato/minuto. Em crianças as doses são de 2-3 jatos a cada 20 minutos. O limite de dose deverá ser estabelecido observando-se aumento exagerado da FC > 140bpm, tremor grosseiro e arritmias(56).
Na crise grave, a primeira escolha deve ser a associação dos anticolinérgicos aos b2-agonistas(57-60).
Aminofilina não tem indicação como tratamento inicial. Em pacientes muito graves, hospitalizados, ela poderá ser considerada como tratamento adjuvante(22,61,62).
Corticosteróides reduzem a inflamação, aceleram a recuperação e diminuem o risco de crise fatal. Os pacientes atendidos na emergência devem usar corticosteróides sistêmicos precocemente, embora estudos tenham demonstrado que sua ação não é imediata e que os corticosteróides inalatórios podem ter efeito protetor mais rápido(43,63-65).
O uso de corticosteróide por via oral ou endovenosa tem efeito equivalente. Os pacientes com alta da emergência que necessitam de corticosteróides devem ser dispensados com prescrição de corticosteróide oral por cinco a 10 dias (para adultos, 40-60mg/dia e, para crianças, 1-2mg/kg/dia, máximo 40mg/dia)(65-68).
4.3.AVAILAÇÃO DA RESPOSTA AO TRATAMENTO
A resposta ao tratamento inicial (entre 30-60min) e a reclassificação do paciente quanto à gravidade representam os critérios mais úteis para determinar o prognóstico com respeito à admissão e alta e à necessidade de medicação posterior.
4.4.ERROS E DEFICIÊNCIAS MAIS COMUNS DURANTE O TRATAMENTO NO PRONTO-SOCORRO
História e exame físicos inadequados
Falta de medidas funcionais para avaliação da gravidade e da resposta ao tratamento
Não identificação de asma de risco
Uso de aminofilina como tratamento principal
Subdoses de b2-agonistas ou grande intervalo entre as doses
Dose insuficiente ou demora na administração de corticosteróides
Na alta:
ºLiberação precoce do pronto-socorro
ºFalta de orientação da técnica de uso dos aerossóis
ºNão orientar tratamento a longo prazo
ºNão orientar sobre retorno e sinais de piora
ºNão prescrever prednisona ou equivalente
ºNão encaminhar aos serviços de maior complexidade ou ao especialista os casos necessários.
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