1) Origem. [1]
Também conhecida como representação interventiva, o controle de constitucionalidade da intervenção federal adentrou no regime jurídico nacional a partir da Constituição de 1934, em seu art. 12,§2º.
Rodrigo Lourenço explica que, a partir da Constituição de 1946, o Procurador Geral da República ganhou competência para impugnar a constitucionalidade de atos locais por violação aos princípios constitucionais sensíveis, sendo da competência do Supremo Tribunal Federal o respectivo julgamento.[2]
O autor do Rio de Janeiro observa que, mesmo surgindo 19 anos antes da ação direta de inconstitucionalidade, a ação interventiva perdeu importância no cenário jurídico nacional. Isto se deveu ao fato de que a ação direta de inconstitucionalidade sujeitar um número maior de atos normativos e não gerar os inconvenientes da primeira.
2) Autonomia dos entes federados.
Ao tratar da organização do Estado brasileiro, a Constituição da República determina que a organização político-administrativa compreende todos os entes federativos, ou seja, União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, todos autônomos. Sendo a autonomia a regra, a constituição mesmo, nos sete incisos do art. 34, prevê os casos nos quais poderá ocorrer a intervenção da União nos Estados e no Distrito Federal.[3]
O fato lembrado por Lourenço é que a intervenção representa gravíssima situação de exceção à autonomia de um ente da Federação.[4]
3) Procedimento.
A violação dos princípios sensíveis da Constituição da República (art. 34,VII) pode causar a ação direta interventiva. O Procurador-Geral da República deve ajuizá-la e o Supremo Tribunal Federal processá-la e julgá-la (art. 36,VI).
Após ajuizamento da representação pelo chefe do Ministério Público da União, segundo o Regimento Interno do STF, o seu Presidente deve procurar eliminar a causa do pedido. Lourenço classifica, de acordo com o citado regimento essa atuação do ministro-presidente como materialmente administrativa.
Infrutíferos os contatos entre as autoridades envolvidas e o Presidente do STF, serão requisitadas informações às primeiras.
Recebidas as informações, o Procurador-Geral da República receberá vistas ao processo para a emissão de parecer.
O Presidente do STF será o relator do pedido de intervenção. O Plenário deverá julgá-lo.
Procedente o pedido, a intervenção será requisitada ao Presidente da República.
4) Princípios sensíveis.
O que Moraes explica é que, em uma das possibilidades de decretação da intervenção federal nos Estados e nos Municípios, a do art. 34, VII, há fundamento na defesa e observância dos princípios constitucionais sensíveis, ou seja:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos humanos;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta;
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
Tais princípios são assim chamados em razão de sua inobservância poder acarretar a intervenção federal sobre a autonomia política do Estado ou Distrito Federal que mau exercer suas competências legislativas, administrativas ou tributárias.
Desta forma, quaisquer leis ou atos normativos do poder público, na realização de sua competência constitucional, que viole um dos princípios sensíveis constitucionais, poderá sofrer controle concentrado de constitucionalidade, por meio da ação interventiva.[5]
5) Intervenção normativa.
Para Moraes, no entanto, “...a chamada intervenção normativa dependerá de provimento pelo STF, da ação direta de inconstitucionalidade interventiva, proposta pelo procurador-geral da República, que detém legitimação exclusiva. (...) o fato de a Constituição Federal referir-se à representação do procurador geral da República, não altera sua natureza jurídica de ação”.[6]
6) Finalidade.
A ação direta interventiva tem dupla finalidade,ou seja, objetiva a declaração de inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo estadual e a decretação de intervenção federal no Estado-membro ou no Distrito Federal. Segundo Moraes, a primeira delas seria de natureza jurídica e a última de natureza política.´
7) Procedência da ação.
Ao julgar procedente a ação interventiva, o STF declara que existiu violação de princípio constitucional sensível e, transitada em julgado,comunica a autoridade interessada e o Presidente da República para as providências constitucionais.
8) Decreto do Presidente da República.
A intervenção federal deverá ser decretada pelo Presidente da República, devendo se limitar a suspender a execução do ato impugnado, se esta medida for suficiente para se restabelecer a normalidade.
Em não sendo suficiente a medida, efetivar-se-á a intervenção e romper-se-á autonomia do Estado-membro.
9) Controle político e duração da intervenção.
Em razão da Constituição não exigir a apreciação pelo Congresso Nacional da intervenção, não haverá controle político da mesma.
A sua duração deve ser suficiente para a volta da normalidade do pacto federativo.[7]
10) Efeitos.
Moraes explica os efeitos jurídicos da ação direta interventiva como decorrentes de sua dupla finalidade.[8]
No sentido jurídico, a lei ou o ato normativo inconstitucional será nulo e excluído da ordem jurídica com os efeitos retroativos e de observância obrigatória por todos.
Politicamente, a declaração de inconstitucionalidade gera efeitos políticos consistentes na possibilidade de intervenção federal em um Estado-membro ou no Distrito Federal.
Para Elival da Silva Ramos, os efeitos da decisão na ação interventiva consistem em autorizar o ato de intervenção.[9]
Ressalta Moraes, com base no Regimento Interno do STF, que julgada procedente e transitada em julgado, a ação interventiva deve ser comunicada pelo STF à autoridade interessada e requerido ao Presidente da República a decretação da intervenção.[10]
Enrique Ricardo Lewandowski ressalta que após o provimento da representação ministerial e requisitada a intervenção,é incumbência do Presidente da República decretá-la sem demora em razão de ser a mesma um ato vinculado.[11]
11. Jurisprudência.
Intervenção no Município.
Julgado pela Segunda Turma do STF em 14/03/1989 o Recurso Extraordinário nº 115684 de São Paulo foi relatado pelo Ministro Carlos Madeira gerou o seguinte extrato de ementa: Ação direta interventiva. Intervenção no Município. Decisão judicial descumprida por prefeito. Ilegitimidade "ad causam" de particular. Legitimidade ativa do procurador-geral de Justiça.[12]
Já a sua ementa foi ditada nos seguintes termos: “Intervenção no Município. Representação interventiva com fulcro em descumprimento, pelo prefeito, de ordem judicial, dirigida diretamente ao Tribunal de Justiça, em face do arquivamento de idêntico pedido ao Procurador-Geral de Justiça. Impossibilidade na ação direta interventiva, o Ministério Público não é substituto processual, mas parte,deduzindo em juízo pretensão própria (Art. 15, § 3º, 'D' da Constituição de 1967/1969; Art. 106, VI da Constituição do Estado de São Paulo). O interessado no cumprimento da decisão não tem legitimidade para propor ao Poder Judiciário a intervenção no Município. Arquivamento do pedido feito ao Procurador-Geral de Justiça em virtude de não se configurar, no Município, situação que exija o restabelecimento da normalidade pela intervenção. Recurso extraordinário conhecido e provido”.
O que houve no caso foi o descumprimento de decisão judicial por um prefeito municipal pela ausência de pagamento de precatório. Restou declarada a ilegitimidade do particular para a ação direta interventiva.
Representação de inconstitucionalidade de Lei Municipal
O Recurso Extraordinário 100097, relatado pelo Ministro Soares Muñoz, trata da representação de inconstitucionalidade de Lei municipal. Utilizou-se como fundamento constitucional a previsão da Constituição de 1967/69, art. 15, §3º, “d”.[13]
Consultados mais outros quatro resultados obtidos na pesquisa na página eletrônica do Supremo Tribunal Federal, o que se verificou foi a reafirmação por parte dos Ministros Thompson Flores, Cordeiro Guerra, etc, que somente o Procurador Geral de Justiça é quem tem legitimidade para propor a ação direta interventiva nos Tribunais de Justiça de cada Estado onde se situar o Município que produzira normas inconstitucionais.
Notas
[1]MORAES, Alexandre de, Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2004, Pp. 773-776.
[2] LOURENÇO, Rodrigo Lopes. Controle da Constitucionalidade à Luz da Jurisprudência do STF. 2ª edição revista e atualizada, nº 1032, Rio de Janeiro: Forense, 1999,.P.115.
[3] P.773
[4] Idem.
[5] P. 774.
[6] Idem.
[7] Pp. 774-775.
[8] Pp. 775-776.
[9] Apud MORAES (2004:775).
[10] MORAES (2004:775)
[11] Apud MORAES (2004:775-776).
[12] Publicação: DJ DATA-21-04-89 PG-05857 EMENT VOL-01538-02 PG-00278.
RTJ 130 /1 PAG-415
[13] RTJ 109 /1 PAG-379.
Informações Sobre o Autor
Francisco Mafra
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.
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