É de fácil constatação a neurose de abandono numa criança quando seu pai ou mãe se afasta por alguns instantes. O desespero que esta demonstra parece nos dizer o quanto tem medo de que venha a ser abandonada por estes.
Pergunta-se: estaria isso ligado a incerteza de não ser amada? Um outro fator que poderíamos considerar seria se esta criança é filha de pais, que por razões variadas, acabam se tornando muito ausentes. E,ainda deve ser considerado o próprio trauma do nascimento, ocasião em que se deu a expulsão do útero, que num parto não tão tranquilo seria mais agravado talvez ocasionando essa neurose de abandono. Muitas são as possibilidades, mas é fato a evidência dessa neurose em muitas crianças.
AVALIAÇÃO DAS NEUROSES INFANTIS, SEGUNDO ANNA FREUD
De acordo com Anna Freud, a presença ou a ausência de sofrimento não pode ser tomada como fator decisivo quando se decide acerca de um tratamento de uma criança. E, alega que há muitos distúrbios neuróticos sérios que as crianças suportam com ânimo firme; além de outros menos sérios que provocam sofrimento.
Segundo ela, somente quando os sintomas da criança são conturbadores para o meio em que vive e, afetam diretamente os pais, há uma probabilidade maior destes procurarem um profissional da psicanálise para tratar de seus filhos ( a exemplo das crianças que urinam na cama, pois são levadas mais regularmente às clinicas do qualquer outra categoria de casos).
E, completa dizendo que os pais se mostram mais preocupados, por exemplo, com os estados de agressividade e de destrutividade dos filhos do que com as inibições; os atos obsessivos são considerados mais leves do que as crises de ansiedade, embora, na verdade, representem eles, um estágio mais avançado do mesmo distúrbio; os estágios iniciais da passividade feminina nos meninos, embora frequentemente decisivos para sua futura anormalidade, são quase que invariavelmente deixados despercebidos.
Em virtude disso, Anna Freud sugere que o analista avalie a seriedade de uma neurose infantil, não em virtude da criança de uma forma especial qualquer, ou em um dado momento, mas em virtude do grau em que não permita à criança o seu desenvolvimento posterior.
A CRIANÇA E SEU LUGAR EQUIVOCADO NO SEIO FAMILIAR
Prazer no desprazer e a necessidade da intervenção paterna
Ocorre que muitas mães não se desvincularam de seu papel de filha e ainda não assimilaram sua condição materna; por consequência, o filho acaba por não ter espaço para ser filho. Essa situação traz um desconforto e também um certo prazer, visto que o filho passa a desempenhar uma função de companheiro. Prazer porque lhe é agradável tal posição e, desprazer, justamente por não lhe ser dado o direito de desempenhar sua condição de filho.
Com isso o filho acaba por se tornar objeto da mãe, um vínculo que para ser quebrado depende da atuação paterna, desempenhando seu papel de pai e marido.
O sintoma da criança como revelador da estrutura familiar
O sintoma é a expressão de um desejo que foi reprimido, por outro lado, pode demonstrar algo que ficou bloqueado no desenvolvimento da relação inconsciente da criança com seus pais. E, durante o processo terapêutico, o terapeuta deve permitir que sobrevenha tudo o que o sujeito em formação não teve no curso do seu desenvolvimento.
São inúmeras as razões que levam pais ou responsáveis a procurar terapia para suas crianças, dentre as quais, destacamos:
Ø Baixo rendimento escolar;
Ø Comportamentos agressivos;
Ø Timidez;
Ø Enurese noturna;
Ø Hiperatividade;
Ø Dificuldades de interagir com outras crianças ou familiares;
Ø Depressão;
Ø Obesidade.
Caso tais comportamentos estejam associados à falta de habilidade para lidar com situações adversas difíceis,como a separação dos pais ou mudança de escola, a terapia, valendo-se de uma metodologia adequada, irá auxilia-la na aquisição de novos comportamentos eficientes para lidar com as situações geradoras do estresse emocional.
É importante que o analista observe por meio de uma atenção flutuante os sintomas apresentados pela criança, o que significa dizer que deve procurar captar tudo que o analisando quer dizer sem se focar num único tema.
Ainda na hora de analisar os sintomas apresentados pela criança, o analista deverá abster-se de pré-julgamentos, a fim de, seja possível uma interpretação condizente ao caso e, deverá ter o cuidado de nunca ver seu paciente como a um filho, além é claro, de atentar para o fato de que as crianças possuem grande sensibilidade para assumirem os sintomas e a angústia específica de seu grupo familiar e, os confrontará juntamente com seus próprios conflitos.
A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO DOS PAIS NO PROCESSOTERAPÊUTICO DA CRIANÇA
O fato é que a escolha do profissional e a decisão pelo tratamento do filho se dão em razão de uma transferência dos pais em relação ao terapêuta e, é em razão dessa transferência que surge nos pais a confiança de entregar sua criança aos cuidados desse profissional.
O analista pode se tornar um objeto transferencial dos próprios pais de seu paciente, isto se deve ao fato de que para muitos pais, procurar um tratamento psicológico para seus filhos significa que eles falharam em sua paternidade e maternidade. Eles passam a atacar suas próprias falhas que criticaram em seus pais e suas mães. O fato é que as transferências dos pais em relação ao analista podem ser facilitadora do trabalho analítico ou pode vir a dificultá-la, ocorrendo até mesmo uma retirada inesperada da criança da análise, caso o analista não identifique e considere a transferência dos pais do paciente, estabelecendo uma escuta do que esses pais trazem e do que lhe é tão difícil de ser elaborado. Por outro lado, a transferência dos pais pode ser utilizada na reorganização dos lugares na dinâmica familiar.
É, portanto, de fundamental importância que os pais estejam incluídos no processo terapêutico da criança, visto que possibilitará ao terapeuta perceber os sentimentos destes em relação à criança. Se assim não for, o tratamento da criança torna-se praticamente inviável.
Ao envolvimento dos pais no processo terapêutico da criança através de sessões de orientações, dá-se o nome de modelo triádico. Dentre outros motivos, destacamos as seguintes razões, pelas quais, a participação efetiva dos pais é importante:
Ø Possibilita ao analista detectar a causa dos sintomas apresentados pela
Ø criança;
Ø Os pais aprendem formas alternativas de ajudar o filho, visto que passam a entender melhor o que ocorre no contexto familiar;
Ø Os pais ouvindo-se narrar os fatos, terão condições de se conscientizarem que também precisam da ajuda de um analista.
É preciso que os pais fiquem atentos aos possíveis sintomas e os comunique ao Psicanalista:
Ø Observe durante alguns dias o comportamento da criança em várias situações: família, escola, clube, etc;
Ø Procure detectar a partir de quando esse comportamento passou a se manifestar e, em quais circunstâncias e com que intensidade;
Ø Analise quais tipos de tentativas foram feitas para solucioná-lo e, por quais pessoas e, em quais situações;
Portanto, deve haver uma intervenção orientada pelo terapeuta em todo ambiente no qual a criança interage, o que inclui, demais familiares, escola, etc.
A forma como os pais se posicionam é um fator determinante no processo terapêutico do paciente infantil. E, pode ser comum aos pais expressarem ansiedade sobre análise de seus filhos, e que, sentimentos de competição, possessividade e de culpabilidade surjam durante o processo, o que denotará o que a criança presencia na vida de seus pais e, que está sendo exibido por meio dos sintomas que apresenta. Por esta razão, faz-se necessário ao terapêuta identificar, esclarecer e elaborar as transferências que forem surgindo, a fim de levar os pais a se conscientizarem de suas próprias dificuldades, o que por sua vez, irá ajudar no êxito do tratamento.
No decorrer do tratamento, a criança pode passar a ter comportamentos tidos como inconvenientes por seus pais, por estarem se libertando de sua dependência emocional, ou mesmo, fazendo com que seus pais vejam que suas próprias dificuldades alimentavam-lhe o sintoma. E, os pais poderão ter dificuldades de lidar com esse tipo de situação, passando então, a negar o que está ocorrendo, transferindo para a figura do analista sua hostilidade, por não ter o profissional transformado seu filho naquilo que convinha às suas expectativas pessoais. Quando os pais tentam manipular e controlar seus filhos através do analista, solicitando essa “ajuda”, este pode ser um dado importante sobre a dinâmica dessa família e das necessidades inconscientes dos pais que estão procurando se realizar através de seus filhos. Esse fator que pode parecer, por um lado, um obstáculo ao tratamento, por outro pode ser usado como material a ser trabalhado, fornecendo ao terapeuta uma oportunidade de denunciar esse tipo de conduta dos pais e fazer com que reflitam a respeito.
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