Enquanto a doutrina defende que a mera quebra do dever de fidelidade já ensejaria danos morais e materiais, a jurisprudência aponta que estes só serão reconhecidos quando identificado dano significante, sofrimento excessivo ou humilhação social.
Resumo: Observa-se a ocorrência de fenômenos sociais se desenvolvendo em paralelo: a progressiva estruturação das relações interpessoais e familiares, e o desenvolvimento da ciência da responsabilidade civil. O presente trabalho objetiva o estudo desse enlace, enfocando, em especial, a infidelidade nas relações conjugais. Para tanto, fez-se um levantamento bibliográfico dos temas da responsabilidade civil, unindo-o com os deveres decorrentes do instituto do casamento e as consequências da quebra do dever de fidelidade. Em seguida, o resultado desta pesquisa foi confrontado com o entendimento jurisprudencial brasileiro predominante, qual seja do não reconhecimento da responsabilidade civil diante da quebra do dever de fidelidade, salvo nas hipóteses de comprovado dano à imagem, saúde, honra ou outros bens semelhantes. Diante desse cenário, constata-se a existência de profunda divergência entre os entendimentos doutrinário e jurisprudencial, vez que enquanto a doutrina defende que a mera quebra do dever de fidelidade já ensejaria danos morais e materiais; a jurisprudência aponta que estes só serão reconhecidos quando identificado dano significante, sofrimento excessivo ou humilhação social. Por fim, foram apontados alguns aspectos merecedores de maior atenção dos futuros pesquisadores.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Direito de Família. Casamento. Reparação Civil.
Sumário: Introdução. 1. Do casamento. 2. Dos fundamentos e dos princípios constitucionais. 2.1. Do direito de família. 2.2. Da responsabilidade civil. 3. Dos elementos da responsabilidade civil. 4. Da infidelidade conjugal e da responsabilidade civil. 5. Considerações finais.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal vigente, em seu artigo 226[1], compreende o instituto familiar como o núcleo estrutural da organização social contemporânea. Sendo assim, o Estado visa protegê-la de modo a garantir a estabilidade das relações sociais, como será analisado adiante. Constata-se que do enlace matrimonial, casamento, decorrem inúmeras obrigações, e dentre elas, o dever de fidelidade.
O texto em tela, com base na Constituição Federal de 1988 e nos demais textos infraconstitucionais, tem como objetivo analisar a dinâmica da responsabilidade civil perante a quebra do dever conjugal de fidelidade, uma vez que no campo jurídico se encontra divergência quanto a configuração do dever de indenizar eventual dano decorrente do seu desrespeito.
Antes de se aprofundar o estudo da responsabilidade civil, serão enfocados os princípios constitucionais e infraconstitucionais que fundamentam o tema, bem como o instituto do casamento.
1. DO CASAMENTO
Previsto nos artigos 1.511 e seguintes do Código Civil[2], esta espécie de união possui as características de (i) ser um ato complexo; (ii) dependente de livre manifestação de vontade dos nubentes; e (iii) de ser ato privativo do Juiz de Paz.
Diz-se “complexo”, pois sua concretização depende de celebração de formalidades legais, como o processo de habilitação, a publicidade dos atos, a livre manifestação de vontade, celebração perante juiz competente, dentre outros pré-requisitos previstos nos artigos 1533 e seguintes do Código Civil[3], sob pena de anulação [4].
O casamento válido constitui direitos e impõe deveres aos cônjuges, conforme prevê o artigo 1.566 do Código Civil[5]. Esclarece Rodrigues[6] que este evento acarreta (i) a ordenação das relações sexuais entre os cônjuges, associado ao dever de fidelidade; (ii) a obrigação de proteção, educação e guarda da prole do casal; e (iii) o dever de respeito e mútua assistência.
Nota-se, assim, que a fidelidade consiste em dever, imposto por lei, por meio do qual o cônjuge deve se abster da prática sexual com terceiros. Pode-se afirmar que este traço é um reflexo legal da cultura monogâmica inadmitindo-se a formação concomitante de dois ou mais enlaces conjugais válidos[7].
Nas palavras de Regina Beatriz Tavares[8], o dever de fidelidade é conceituado como a “(...) lealdade, sob os aspectos físico e moral, de um dos cônjuges para com outro, quanto à manutenção de relações que visem satisfazer o instinto sexual dentro da sociedade conjugal.”.
2. DOS FUNDAMENTOS E DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
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