sexta-feira, 20 de abril de 2018

A concepção filosófica da Verdade.


DISCIPLINA:  METODOLOGIA DA VERDADE I
AULA DIA 19/04/2018
PROFESSOR : זה TANRILAR TANRI
MATERIAL I




Verdade significa aquilo que está intimamente ligado a tudo que é sincero, que é verdadeiro, é a ausência da mentira.
Verdade é também a afirmação do que é correto, do que é seguramente o certo e está dentro da realidade apresentada.
A verdade é muitas vezes desacreditada e o ceticismo é a descrença ou incredulidade da verdade. Aquele indivíduo que tem predisposição constante para duvidar da verdade é chamado de cético.
Quando pessoas ou grupos tentam provar que se interessam por assuntos, mas na verdade não gostam, ou não entendem, são chamados de pseudo, ou seja que não são verdadeiros. Ex: pseudocatólico, pseudo-intelectual, pseudo-canônico etc.
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A concepção de verdade.
A nossa ideia contemporânea de verdade foi construída ao longo de séculos, desde a antiguidade, misturando a concepção grega, latina e hebraica.
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Em grego, a verdade (aletheia) significa aquilo que não está oculto, o não escondido, manifestando-se aos olhos e ao espírito, tal como é, ficando evidente à razão.
Em latim, a verdade (veritas) é aquilo que pode ser demonstrado com precisão, referindo-se ao rigor e a exatidão.
Assim, a verdade depende da veracidade, da memória e dos detalhes.
Em hebraico, a verdade (emunah) significa confiança, é a esperança de que aquilo que é será revelado, irá aparecer por intervenção divina.
Em outras palavras, a verdade é convencionada pelo grupo que possui crenças em comum.
A união destes conceitos fez com que Tomás de Aquino terminasse definindo a verdade como expressão da realidade, a concepção em voga entre nós no senso comum até hoje.


A verdade filosófica.
Em filosofia, uma designação tradicional de verdade diria que é aquilo que permanece inalterável a quaisquer contingências, um conceito que não está em concordância com o senso comum e que trás um problema.
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O conceito tradicional de verdade, do ponto de vista do senso comum e da filosofia, contraria o objetivo da filosofia, uma busca pelo que está oculto por trás das aparências, tornando a verdade relativa e provisória.
Em outras palavras, a verdade espelha aquilo que é, o problema é encontrar a essência do que as coisas são, adquirir a certeza incontestável sobre algo, o que geraria uma atitude dogmática.
O grande problema é que a verdade não possui um significado único, tampouco estático e definitivo, sendo influenciada por inúmeros fatores.
Destarte, a construção de um sistema filosófico configura uma verdade dogmática que se contrapõem a outras verdades dogmáticas.
Neste sentido, em filosofia existem várias verdades, todas possíveis desde que exista a ausência de contradições, já que somente elementos que se anulam mutuamente poderiam invalidar a verdade.
Na filosofia e nas Ciências Humanas paradigmas coexistem e não se anulam.


Leibniz, Kant e Husserl.
A concepção de verdade foi objeto de estudo de diversos pensadores ao longo da história da filosofia, mas três particularmente exerceram forte influência: Leibniz, Kant e Husserl.
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Para Leibniz seria necessário distinguir dois tipos de verdade: de um lado as verdades de razão e de outro as verdades de fato.
As verdades de razão enunciam que uma coisa é, necessariamente e universalmente, não podendo ser diferente do que é, tal como as ideias matemáticas, sendo inatas.
As verdades de fato, ao contrário, são aquelas que dependem da experiência, expressando ideias obtidas através das sensações, percepção e memória, sendo, portanto, empíricas.
A relação entre verdades de razão e de fato, julgadas pela racionalização das informações, permite conhecer a realidade.
Já para Kant, a verdade surge a partir da relação entre juízos analíticos e sintéticos, expressando o primeiro operações intelectuais e o segundo as estruturas ou fenômenos analisados.
Em outras palavras, a realidade que conhecemos não corresponde aquilo que é, mas sim ao que a razão interpreta.
Partindo do mesmo principio, Husserl criou a fenomenologia, uma ramo da filosofia que estuda a leitura dos fenômenos pela razão, já que a realidade seria relativa e subordinada à manifestação para consciência.
O entendimento sofreria influencia dos sentidos e da razão, além dos conhecimentos previamente presentes na mente e do contexto.


Concluindo.
A teoria do conhecimento, através da epistemologia (ciência que estuda o discurso), mesclada a discussão em torno do conceito de verdade, a partir do racionalismo, do empirismo e do criticismo; fundou posturas que influenciaram a construção da ciência e atitudes, maneiras de enxergar o mundo e agir.
A maneira de lidar com informações e tomar decisões, considerando especialmente os critérios para solucionar problemas, acabaram sendo influenciados por três tendências que dizem respeito à forma de conhecer e encarar a verdade:

1. Dogmatismo: Baseado no racionalismo de Descartes, afirma que o conhecimento adquirido é seguro e universal, alguns inclusive inatos, conferindo certeza absoluta às decisões.
2. Ceticismo: Oposta ao dogmatismo, originado a partir do empirismo, afirma que o verdadeiro conhecimento é fornecido pelos sentidos e pela experiência, sendo impossível construir uma verdade segura; portanto toda decisão é provisória e sujeita a constantes reajustes.
3. Relativismo: Atitude filosófica originada a partir do criticismo kantiano, a qual defende a ideia de que cada indivíduo possui uma verdade, um ponto de vista e uma perspectiva, para qual as decisões só podem ser tomadas em conjunto, analisando os diversos ângulos e pontos de vista.

Chegar à verdade pode ser mais complexo do que aparente, talvez mesmo impossível dentro da limitada capacidade humana de racionalização.
Porém, o interessante é o caminho percorrido em busca da verdade, uma luz que pode iluminar novas tentativas.


Para saber mais sobre o assunto.
CHAUÍ, Marilena. Convite a filosofia. São Paulo: Ática, 1994.
GOLDSCHMIDT, Victor. “Tempo histórico e tempo lógico na interpretação dos sistemas filosóficos” In: GOLDSCHMIDT, V. A religião de Platão. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1968, p.139-147.

Kant e a mentira

Imagine o seguinte caso. Uma pessoa está fugindo de um assassino e pede para se esconder em sua casa. Você aceita e logo em seguida chega o assassino e pergunta se você não viu a pessoa que acabou de esconder. O que você deveria fazer? Mentir para o assassino, dizendo que a pessoa não se encontra ali, ou falar a verdade?
A maior parte das pessoas diria: devemos mentir para salvar uma vida. Porém Immanuel Kant (1724-1804), um dos maiores filósofos da história, pensa que deveríamos falar a verdade, inclusive nesse caso. Naturalmente, o que fez com se tornasse conhecido e respeitado não foi apenas defender essa resposta que vai contra o senso comum. Ele tinha uma teoria moral bastante sofisticada para dizer isso.
Para compreendermos seu pensamento precisamos entender o que Kant chamava de Imperativo hipotético e imperativo categórico. Imperativos hipotéticos são ordens do tipo “se deseja ser aprovado na escola, então deve estudar”. Esses imperativos sempre tem a estrutura “se… então”. Essas são são ordens que qualquer pessoa deve seguir. Pelo contrário, caso uma pessoa qualquer não queira ser aprovada na escola, ela não tem qualquer necessidade de estudar. Esses imperativos são ordens apenas na medida em que uma pessoa tenha certo desejo. 
Por outro lado, imperativo categórico tem um formato diferente. Exemplos desse tipo de deveres são os deveres morais. Quando digo “você não deve mentir”, não estou fazendo uma afirmação condicional. Não estou dizendo que você não deve mentir caso goste da pessoa ou queira agradá-la. Pelo contrário, em qualquer condição não deve mentir.
Se um imperativo hipotético do tipo “você deve estudar se quiser ser aprovado” tem origem em um desejo, qual a origem de imperativos categóricos?
Há uma frase célebre de Kant que diz o seguinte:
Duas coisas me enchem a alma de crescente admiração e respeito, quanto mais intensa e frequentemente o pensamento delas se ocupa: o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim.
Kant pensava que  imperativos categóricos tinham origem na razão humana. Ele acreditava que havia uma lei moral dentro de cada pessoa, que cada ser racional seria capaz de reconhecer como verdadeira. Essa leia se resumia ao  seguinte princípio: “age apenas segundo uma regra pela qual possas ao mesmo tempo querer que se torne uma lei universal”.
Isso quer dizer que apenas aquelas ações que pode se tornar uma regra a ser seguida por qualquer pessoa em qualquer tempo podem ser consideradas corretas. Por exemplo, imagine que você precisa de um empréstimo. Pra conseguir que alguém te empreste dinheiro, terá que prometer que irá devolver.  Porém, você não tem condições de devolver. Você deveria enganar uma pessoa e pedir dinheiro emprestado, prometendo devolver mesmo sabendo que não fará isso?
Podemos pensar no princípio kantiano como um procedimento para avaliar o que é certo ou errado.
O procedimento seria o seguinte:
  1. Passo 1: transforme sua ação numa regra;
  2. Passo 2: se questione se é possível que essa regra possa ser adotada por todas as pessoas, em qualquer época ou lugar (uma lei universal).
Se transformássemos a ação do exemplo acima em uma regra, obteríamos algo do tipo: “se você precisar de um empréstimo, prometa devolvê-lo, mesmo que você saiba que não será capaz”. É possível que essa regra se torne uma lei universal? Kant diria não, porque essa é uma regra autodestrutiva. Uma vez que essa regra se tornasse uma prática universal, ninguém mais iria acreditar em  promessas de devolução e ninguém faria empréstimos baseados nelas.
Voltemos ao exemplo com o qual começamos esse texto e perguntemos: seria adequado mentir para salvar uma vida? Agora que conhecemos um pouco da teoria moral de Kant, podemos entender porque, apesar de contraintuitivo, ele defendia que seria errado mentir, mesmo nessa situação. Não podemos transformar a ação de mentir em uma lei universal, porque se isso acontece as pessoas não mais dariam qualquer importância ao que outras pessoas dissessem. Já nem mentir poderíamos mais, porque ninguém nos daria ouvidos.
Assim, para Kant, agir moralmente significa agir de acordo com o dever, mesmo que as consequências da ação não sejam positivas. O que importa para considerarmos uma ação moral é a intenção do agente moral e não o resultado.  Kant diferencia entre agir conforme o dever agir por dever. 
Para entender a diferença consideremos os possíveis motivos que levaram, por exemplo, a pessoa imaginária interrogada pelo assassino a dizer a verdade. Talvez ele tenha feito isso por estar com medo de que o assassino descobrisse de qualquer forma e o prejudicasse de alguma maneira. Nesse caso, a pessoa está agindo de acordo com o dever, está agindo por interesse e não por obrigação. Para agir por dever ela deveria pensar “irei falar a verdade, porque é meu dever não mentir” e ao invés de “irei falar a verdade, porque pode ser que acabe sendo prejudicado”.
Moral relativa ou absoluta Segundo Kant 

A ética provém da observância da moral. A norma ética estabelece condutas à moralidade. Para a efetiva credibilidade da norma ética, faz-se mister o entendimento: é a moral absoluta (objetiva) ou relativa (subjetiva)? Como nas ciências filosóficas, humanas e sociais, tudo é relativo; há, pelo menos, duas correntes de pensamento. 

Para a posição absoluta e apriorista, “os valores não se criam nem se transformam; se descobrem ou se ignoram”. A ética dá, então, condições ao homem para afinar-se com esses valores, descobrindo-os; ele não os cria. Seria moral aquilo que dá ao homem a sensação de sentir-se bem após determinada ação. Como se ele tivesse uma bússola natural que o guiasse ao discernimento entre o certo e o errado. 

Já a teoria relativista e empirista remete à tese subjetivista, postulando que a criação de valores acontece por vontade dos homens. As normas são convencionais (estipuladas) e mutáveis, existindo várias normas, ao longo do tempo. 

Esquematicamente: 

Relativista/empirista: 
- norma com vigência convencional e mutável; 
- caráter empírico (observação); 
- várias morais; 
- subjetivismo; 

Absolutista/apriorista 
- validez atemporal e absoluta; 
- conhecimento da norma “a priori”; 
- bússola natural (certo/errado); 
- predisposição. 

Kant: a verdade subjetiva

Por Peter Kreeft
Immanuel Kant (1724-1804) parecia ser uma pessoa cordial e pacata. Poucos daqueles que o conheceram talvez imaginassem que as suas teorias teriam um impacto destruidor sobre a filosofia e a mentalidade contemporâneas.

Na história da filosofia, houve poucos pensadores tão ilegíveis e áridos como Immanuel Kant. Contudo, poucos tiveram um impacto tão devastador sobre o pensamento humano como ele.
Conta-se que Lumppe, o seu dedicado assistente, teria lido fielmente cada uma das publicações do mestre. Mas nem mesmo ele conseguiu ler a obra mais importante publicada pelo filósofo, A crítica da razão pura; na verdade, chegou a começar a leitura, mas interrompeu-a dizendo que, se tivesse de terminá-la, haveria de ser num hospital psiquiátrico. Desde então, muitos estudantes têm-se feito eco dessa opinião.
No entanto, penso que esse professor abstrato, que escrevia em estilo abstrato sobre questões abstratas, é a fonte primária da idéia mais perigosa de todas para a fé (e, portanto, para as almas): a idéia de que a verdade é subjetiva.
Os simples cidadãos da sua Königsberg natal (atual Kaliningrado, Rússia), onde o filósofo viveu e escreveu durante a segunda metade do século XVIII, parecem ter entendido isso melhor do que muitos acadêmicos profissionais, porque lhe deram o apelido de “o destruidor” e davam o seu nome aos cachorros.
Pessoalmente, Kant era um homem amável, gentil e piedoso, tão pontual que os vizinhos ajustavam os relógios pelos seus passeios. Também o intuito básico da sua filosofia era nobre: restaurar a dignidade humana num mundo cético que idolatrava a ciência.
Essa intenção pode ser ilustrada com o seguinte episódio. Em certa ocasião, Kant assistiu à palestra de um astrônomo materialista sobre o lugar do homem no universo. Quando o cientista concluiu a palestra com as palavras: “Assim, vemos que o homem é evidentemente insignificante em termos astronômicos”, o filósofo levantou-se e disse: “Professor, o senhor esqueceu o mais importante: o homem é o astrônomo”.
No entanto, mais do que qualquer outro pensador, foi ele quem impulsionou a deriva tipicamente moderna da objetividade para a subjetividade. Isso pode parecer bom até nos darmos conta de que implicava a redefinição da própria verdade como algo subjetivo. E as conseqüências dessa idéia têm sido catastróficas.
Quando conversamos com alguém que não crê, percebemos que o obstáculo mais comum à fé hoje em dia não é nenhuma dificuldade intelectual honesta (como o problema do mal ou o dogma da Trindade), mas a convicção de que a religião não pertence ao campo dos fatos nem das verdades objetivas. Assim, qualquer tentativa de tentar convencer outra pessoa de que a fé é verdadeira – objetivamente verdadeira, verdadeira para todos – passa a ser considerada de uma arrogância intolerável.
De acordo com essa mentalidade, a religião é teórica, não prática; tem a ver com valores, não com fatos; é subjetiva e privada, não objetiva e pública. O dogma seria um “extra”, e um “extra” daninho, porque fomentaria o dogmatismo. Ou seja, a religião, no fundo, não passaria de uma ética. Além do mais, uma vez que a ética cristã é muito parecida com a ética das outras grandes religiões, pouco importaria se você é cristão ou não; o importante é ser “boa gente”. (Geralmente, as pessoas que acreditam nisso também acham quase todo o mundo “boa gente”, com exceção de Adolf Hitler e Charles Manson).
Kant é em larga medida responsável por essa maneira de pensar. Ele ajudou a enterrar a síntese medieval entre fé e razão, e descreveu a sua filosofia como “tirar do caminho as pretensões da razão para abrir espaço à fé”, como se fé e razão fossem inimigas, não aliadas. Assim, consumou o divórcio entre fé e razão iniciado por Lutero.
O filósofo pensava que a religião jamais poderia ser objeto da razão – uma evidência, um argumento ou sequer um objeto de conhecimento –; deveria ser unicamente uma questão de sentimentos, de emoções e de atitudes. Esse postulado influenciou profundamente a maior parte dos educadores religiosos atuais (entre os quais redatores de catecismos e teólogos), que deixaram de lado a rocha-mãe da fé, os fatos objetivos narrados na Sagrada Escritura e resumidos no Credo dos Apóstolos. Fregueses da filosofia kantiana, divorciaram a fé da razão e casaram-na com a psicologia pop.
“Duas coisas me deixam maravilhado”, confessou Kant certa vez: “o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim”. Aquilo que maravilha um homem preenche o seu coração e dirige o seu pensamento. Reparemos que, entre as coisas que maravilham o filósofo, não estão Deus, Cristo, a Criação, a Encarnação, a Ressurreição e o Juízo, mas apenas “o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim”.
“O céu estrelado” é o universo físico, tal como a ciência moderna o entende; e tudo o mais é relegado para o campo da subjetividade. Assim, a lei moral não estaria “fora”, mas “dentro de mim”; não seria objetiva, mas subjetiva; enfim, não seria uma Lei Natural com certos e errados objetivos, mas uma lei feita por nós mesmos à qual escolhemos vincular-nos. (Mas será que estamos realmente vinculados quando só nos vinculamos a nós mesmos?) A Moral seria, portanto, apenas uma questão de intenção subjetiva; não teria qualquer conteúdo com exceção da Regra de Ouro (o “imperativo categórico” de Kant).
() A regra de ouro é considerada classicamente o princípio central de toda a ética. Na sua formulação negativa – “não farás aos outros aquilo que não queres que te façam” –, encontra-se em diversos pensadores de quase todos os povos. Cristo deu-lhe uma formulação positiva: Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles (Mt 7, 12) (N. do T.).
Se a lei moral veio de Deus e não do homem, o homem não seria livre no sentido de ser autônomo, o que é verdade. Mas, para Kant, o homem tem de ser autônomo, e portanto a lei moral não vem de Deus, e sim do próprio homem. Partindo da mesma premissa, a Igreja afirma que a lei moral realmente vem de Deus, e portanto que o homem não é autônomo; ele é livre para optar por obedecer-lhe ou não, mas não é livre para criar a lei.
Embora se considerasse cristão, o filósofo negou explicitamente que pudéssemos conhecer ao certo a existência (1) de Deus, (2) do livre arbítrio, e (3) da vida eterna. Disse que deveríamos viver como se essas idéias fossem verdadeiras, porque caso contrário não levaríamos a moral a sério. É essa justificação da fé por razões puramente práticas que constitui um erro terrível. Kant acredita em Deus não porque Ele exista, mas porque é útil. Se for assim, por que não acreditar no Papai Noel? Se eu fosse Deus, preferiria um ateu honesto a um deísta desonesto; e penso que Kant é um deísta desonesto, porque há apenas um único motivo honesto para acreditar seja no que for: o fato de essa coisa ser verdadeira.
Aqueles que tentam vender a fé cristã no sentido kantiano, como um “sistema de valores” em vez da verdade, têm fracassado geração após geração. Com tantos “sistemas de valores” no mercado, por que deveria alguém preferir a variante cristã a outras mais simples, com menos teologia e com uma moral mais fácil e menos inconveniente?
Com efeito, Kant fugiu da batalha ao bater em retirada do campo dos fatos. Acreditava no grande mito do século XVIII, o Iluminismo (nome irônico!). Acreditava que a ciência de Newton tinha vindo para ficar e que, para sobreviver, o cristianismo teria de encontrar um lugar na nova paisagem mental esboçada pela nova ciência. E o único lugar que lhe sobrava era a subjetividade.
Isso implica ou ignorar os acontecimentos sobrenaturais e miraculosos da história do cristianismo ou interpretá-los como mitos. A estratégia de Kant foi essencialmente a mesma que seguiria Rudolf Bultmann (1884-1976), o pai da “demitologização” e talvez o principal responsável pela perda da fá entre inúmeros universitários católicos. Muitos professores de teologia perfilham as suas teorias exegéticas, que reduzem os milagres contidos na Bíblia, relatados por testemunhas oculares, a simples “mitos”, “valores” e “interpretações piedosas”.
Com relação ao suposto conflito entre fé e razão, Bultmann disse: “A visão científica do mundo veio para ficar e fará valer os seus direitos contra qualquer teologia, por mais impositiva que seja, que venha a entrar em conflito com ela”. Ironicamente, a “visão científica do mundo” oferecida pela física de Newton e aceita como absoluta e imutável por Kant e Bultmann é hoje quase universalmente rejeitada pelos próprios cientistas!
A questão básica de Kant era: Como podemos conhecer a verdade? Na sua juventude, aceitava a resposta racionalista de que conhecemos a verdade pelo intelecto, não pelos sentidos, e de que o intelecto possuía as suas próprias “idéias inatas”. Mais tarde, leu o empirista David Hume, que, em palavras do próprio Kant, o “despertou do sono dogmático”. Como outros empiristas, Hume acreditava que o homem só pode conhecer a verdade mediante os sentidos e que não existem “idéias inatas”. Mas as premissas de Hume conduziram-no ao ceticismo, à negação de que seja possível conhecer a verdade com certeza. Kant considerou inaceitáveis tanto o “dogmatismo” racionalista como o ceticismo empirista e procurou uma terceira via.
Ora, havia uma terceira teoria disponível desde os tempos de Aristóteles: a filosofia do senso comum, que é o realismo. De acordo com o realismo, podemos conhecer a verdade por meio do intelecto e dos sentidos, desde que ambos trabalhem corretamente em conjunto, como as lâminas de uma tesoura. Em vez de voltar-se para o realismo tradicional, Kant inventou toda uma nova teoria do conhecimento, geralmente chamada idealismo. Considerava-a a sua “revolução copernicana na filosofia”. Mas o nome mais simples para ela é subjetivismo, pois o que pretende é redefinir a própria verdade como subjetiva, não objetiva.
Todos os filósofos anteriores tinham dado por assente que a verdade é objetiva. Aliás, de acordo com o senso comum, é simplesmente isso o que queremos dizer ao falar de “verdade”: conhecer o que realmente é, conformando a mente segundo a realidade objetiva. Alguns filósofos (os racionalistas) julgavam ser capazes de atingir essa meta apenas com a razão. Os primeiros empiristas (como Locke) julgavam que podiam atingi-la através dos sentidos. O empirista cético Hume, posterior, julgava que não havia maneira alguma de atingir com certeza a verdade.
Kant negou a premissa comum a essas três filosofias concorrentes, ou seja, negou que a verdade devesse ser atingida, que a verdade significasse conformidade com a realidade objetiva. A “revolução copernicana” de Kant redefine o próprio conceito de verdade como realidade que se conforma segundo as nossas idéias. “Até hoje, sustentava-se que o nosso conhecimento devia adequar-se aos objetos […]. Haverá mais progresso se assumirmos a hipótese contrária, de que são os objetos de pensamento que devem adequar-se ao nosso conhecimento”.
Kant afirmou que todo o nosso conhecimento é subjetivo. Bem, essa afirmação é um conhecimento subjetivo? Se é, então o conhecimento desse fato também é subjetivo, et cetera, e todos estamos aprisionados num infinito salão de espelhos. A filosofia kantiana é perfeita para o inferno. É possível que os condenados creiam não estar realmente no inferno; seria apenas coisa da cabeça deles. E talvez seja isso mesmo: é possível que o inferno seja exatamente assim.

Tipos de ações segundo kant


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