Estudo sobre a validade, vigência e eficácia da Norma Jurídica – análise doutrinária
As normas jurídicas são estudadas segundo a validade, a vigência e a eficácia. A validade tem relação com o ingresso da norma no ordenamento jurídico, ou seja, uma norma será válida quando não contradizer norma superior e tenha ingressado no ordenamento atendendo ao processo legislativo pré-estipulado[1]. Assim, para Hans Kelsen, a validade da norma está relacionada com o fato de haver uma norma que prescreva se uma conduta “deve ou não deve ser, deve ou não ser feita”.[2]
Em crítica a essa posição de Kelsen, Tércio Sampaio Ferraz Júnior afirma que a explicação Kelseniana da validade sugere que “a norma é um signo, meio para outro signo, e a relação signo/signo, norma/norma, é uma relação de validade”, havendo um excesso de formalismo, e reduzindo a validade “a uma categoria formal do pensamento”, o que denomina de validade condicional[3]. Esta assim, se justificaria na relação meio/fim, exigindo “uma técnica retrospectiva, isto é, para saber se uma norma vale condicionalmente, deve-ser remontar à sua norma imunzante e à norma imunizante desta, até chegar à primeira norma ou norma origem”[4].
Para Tércio Sampaio Ferraz Júnior a validade não deve ser condicionante, mas sim finalística, ou seja, é preciso “saber se uma norma vale, finalisticamente, é preciso verificar se os fins foram atingidos conforme os meios prescritos”, reconhecendo a relação íntima entre direito e moral[5].
Assim, a validade da norma pode ser estudada sob dois enfoques: primeiramente, analisando a norma com relação a forma de ingresso no ordenamento jurídico e em relação a sua relação com a moral, mantendo o direito sempre associado a este.
Resumindo os dois pensamentos, Robert Alexy afirma que uma norma será válida quando atenda os critérios pré-estabelecidos de validade, ou seja, “se a norma N satisfaz os critérios K¹, …, Kn, então, N é válida”, sendo que podem haver diversas teorias de validade, com base nos diferentes tipos de critérios utilizados, sendo todos aceitáveis.[6]
A vigência da norma, por sua vez, tem relação com a sua “existência específica”[7]. Ele é “um termo com o qual se demarca o tempo de validade de uma norma[;] [...] é a norma válida (pertencente ao ordenamento) cuja autoridade já pode ser considerada imunizada, sendo exigíveis os comportamentos prescritos”[8]. Assim, a norma será vigente quando puder ser exigida.
Isso implica dizer que pode haver norma que seja válida e não seja vigência, ou seja, não se pode exigir, como é o caso das normas no período da vacation legis. Neste momento, a norma já tem validade segundo os critérios estabelecidos, entretanto, não a autoridade competente não pode obrigar o seu cumprimento.
Por fim, a eficácia está relacionada com a produção de efeitos[9]. Com o “fato real de ela [a norma] ser efetivamente aplicada e observada, da circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na ordem dos fatos”[10].
A eficácia jurídica está relacionada, para Hans Kelsen, com a validade da norma, isso porque, a “eficácia é condição no sentido de que uma ordem jurídica como um todo e uma norma jurídica singular já não são consideradas como validas quando cessam de ser eficazes”. Assim, para que uma norma seja eficaz ela tem que ter validade, que é “a resposta à questão de saber por que devem as normas desta ordem jurídica ser observadas e aplicadas”[11].
A eficácia enquanto verificadora da produção dos efeitos da norma, tem relação com o modo com o a sociedade a observa, sendo denominada de eficácia social. Assim, ela é observada “quando encontra na realidade condições adequadas para produzir seus efeitos”[12]. Exemplo, a norma que estabeleceu a obrigatoriedade de aparelho de segurança em automóveis para criança (as cadeirinhas), que apesar de válida e vigência, por um tempo não teve eficácia em virtude da ausência dos mesmos para a venda, o que impedia que as pessoas pudesse adquirir os mesmos.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior, neste ponto, distingue a eficácia social, ou a sua ausência, com existência de normas que são desobedecidas em virtude da possibilidade de causarem “tumulto social”, exemplificando com o estipulado no artigo 7º, IV, da CF/88, que estabelece as bases para o salário mínimo, que nunca foi obedecido. Ocorre assim o não sucesso da norma e a mesma passa a ser socialmente irrelevante.[13]
A eficácia jurídica tem relação com o fato de o Estado ter aparato jurídico para fazer a norma ser cumprida. Isto é, se os agentes estatais tem condições de fazer a norma ser exigida.
Desta forma, nos três planos de estudo da norma, verifica-se que a validade da norma tem relação com a adequação desta a critérios formais ou morais previamente estabelecidos, somente ingressando no ordenamento jurídico após a verificação destes. Uma vez válida, verifica-se a vigência da norma, ou seja, se a mesma pode ser exigida, se a autoridade já pode fazê-la cumprir. Tem relação com o tempo da norma, o tempo de exigibilidade da mesma.
E a eficácia jurídica tem relação com a aceitação e produção dos efeitos da norma, com a possibilidade de socialmente ela ser cumprida e de ter seus efeitos produzidos. Isso pode não ocorrer por dois motivos: impossibilidade material ou ausência de condições ou por desobediência a norma, quando a norma não tem sucesso, ou no popular, quando a norma “não pega”.
Referências
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. SILVA, Virgílio Afonso da (trad.). 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. A Validade das Normas Jurídicas. Acesso em: 04 fev. 2013.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. MACHADO, João Baptista (trad.). 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[1] Neste sentido: KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. MACHADO, João Baptista (trad.). 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 139.
[2] Ibidem, p. 07.
[3] FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. A Validade das Normas Jurídicas.
[4] Ibidem, p. 07.
[5] Ibidem, eco. cit.
[6] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. SILVA, Virgílio Afonso da (trad.). 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 60.
[7] KELSEN, op. cit., p. 07.
[8] FERRAZ JÚNIOR, op. cit., p. 14.
[9] Ibidem, eco. cit..
[10] KELSEN, op. cit., p. 08.
[11] Ibidem, p. 148.
[12] FERRAZ JÚNIOR, op. cit., p. 14
[13] FERRAZ JÚNIOR, op. cit., p. 15-16.
Nenhum comentário:
Postar um comentário