Se o regime de chuvas está descontrolado e o nível dos oceanos está aumentando, pelo menos existe um lado positivo para o aquecimento global.
Com o derretimento de geleiras e de outras áreas que antigamente estavam congeladas de forma permanente, objetos há muito tempo enterrados estão sendo expostos. Muitos desses artefatos possuem um valor histórico inestimável e estão em ótimo estado de conservação, já que ficaram bem preservados pelo gelo durante décadas ou mesmo milênios.
Porém, uma vez que alguns desses itens são libertados de seus túmulos gelados e se expõem ao ambiente, eles rapidamente decaem e desaparecem. Cientistas e arqueólogos de todo o mundo estão correndo contra o tempo para encontrar e preservar esses achados antes que eles se percam. A lista a seguir elenca 10 descobertas arqueológicas recentes que só foram possíveis em decorrência do aquecimento global.
10. Um vírus gigante de 30 mil anos de idade
Inspirados por cientistas que tinham sido capazes de regenerar flores silvestres a partir de sementes de 30 mil anos de idade, dois biólogos franceses, Jean-Michel Claverie e Chantal Abergel, se perguntaram se eles não poderiam fazer o mesmo com um vírus. No que apenas poderia ser descrito como ficção científica, eles não só foram capazes de trazer de volta um vírus de 30 mil anos de idade, congelado, como também fizeram com que o vírus ainda fosse contagiante.
Felizmente para nós, este vírus infecta só amebas, e não seres humanos. Ele também é incrivelmente grande, quase do tamanho de uma bactéria. Ainda mais intrigante é o fato de o vírus ter atacado a célula hospedeira de uma maneira diferente da maioria dos vírus, além de estar quase vazio por dentro, apesar de seu tamanho gigante. Isso foi considerado estranho pelos cientistas, uma vez que os vírus geralmente embalam o máximo possível de material genético em espaços bem pequenos.
Mas você pode estar com uma dúvida bem pertinente: e se este vírus ressuscitado, ao qual nenhum ser humano foi exposto por 30 séculos, conseguir infectar os seres humanos? Poderia ele matar milhões de pessoas que não possuem resistência natural a ele? Parece loucura, mas à medida que mais e mais geleiras derretem, elas libertam todos os tipos de matéria orgânica que durante muito tempo estava congelada. Simplesmente não há como dizer o que pode surgir. Esse “efeito colateral” bem pouco divulgado é especialmente preocupante no que diz respeito ao derretimento das calotas polares. Em breve, haverá pessoas habitando áreas remotas na Groenlândia, por exemplo, que estiveram congeladas durante séculos. O que eles vão perturbar quando começarem a perfurar o solo a procura de recursos naturais?
9. Musgo antigo
Há aproximadamente 500 anos, a região das Ilhas de Ellesmere, nas proximidades canadenses do Ártico, estava coberta por alguns tipos de musgos e líquens. Estas plantas simples foram, então, enterradas por toneladas e mais toneladas de gelo – e assim permaneceram por centenas de anos. Isso foi até recentemente, quando a grossa camada de gelo derreteu e as plantas emergiram.
Os cientistas que viram essas plantas crescendo no que parecia ser o próprio gelo derretido se questionaram: “Será que essas plantas podem estar vivas?”. Algumas delas tinham coloração marrom e pareciam de fato estar mortas. Porém, outras estavam crescendo novamente, verdinhas. Os pesquisadores recolheram amostras dessas plantas e as levaram para o laboratório com o objetivo de verificar se o musgo seria capaz de sobreviver.
Para a surpresa geral, o musgo conseguiu se regenerar com sucesso e crescer. Mesmo enterradas sob o gelo por centenas de anos, estas plantas permaneceram vivas. As implicações para os cientistas são óbvias: se as geleiras derreterem e expuserem quantidade suficiente dessas plantas há muito tempo adormecidas, elas poderiam ser usadas para recolonizar regiões de climas mais frios.
8. Soldados e armas da Primeira Guerra Mundial
Durante a Primeira Grande Guerra, a região no norte da Itália, perto da fronteira com a Áustria, foi palco de um intenso combate entre as forças italianas e os soldados austro-húngaros, no que ficou conhecido como “a Guerra Branca”. Na época, este era um dos campos de batalha mais remotos e formidáveis de todo o conflito. Hoje, o derretimento das geleiras dos Alpes está revelando os mortos e as armas que foram usadas pelos soldados que lutaram no local.
Em 2003, mais de 200 munições da Primeira Guerra Mundial surgiram devido ao derretimento do gelo, a uma altitude de 3 mil metros na região de Trentino, no norte da Itália. Os soldados tinham aparentemente escavado e construído um esconderijo de munições em uma geleira para armazenar explosivos. Quando as camadas de gelo derreteram, as munições, pesando 10 quilos cada, foram encontradas no chão, empilhadas em cima umas das outras. Os corpos dos soldados também estão sendo descobertos, ainda paralisados em posição de batalha, pois congelaram juntos, onde eles morreram.
No início, foram os objetos pessoais dos soldados que emergiam do gelo: agendas, pedaços de roupas, cartas, entre outros. Agora, são as próprias tropas italianas e austríacas que lutaram entre si que estão reaparecendo nas superfícies, voltando a ver a luz solar.
7. Artefatos da época da Roma Antiga
A passagem de Schnidejoch é uma rota através das montanhas alpinas da Europa. O trajeto une dois vales dos Alpes e tem sido usado há séculos pelos viajantes vindos da Itália que desejam seguir caminho para o norte. Os cientistas acreditam que ancestrais europeus têm viajado por Schnidejoch há mais de 6 mil anos.
E, uma vez que os seres humanos têm utilizado esta passagem por tanto tempo assim, significa que eles já deixaram para trás milhares de anos de lixo. Estes resíduos, graças ao derretimento de geleiras dentro da própria passagem de Schnidejoch e nos arredores, agora está se transformando em artefatos científicos de inestimável valor.
Os objetos recuperados tendem a se agrupar em períodos de tempo distintos. Os cientistas acreditam que as relíquias correspondem aos períodos de tempo em que a passagem estava liberada e as pessoas podiam circular livremente por ali. Um desses períodos produziu artefatos associados ao Império Romano, com objetos de cerca de 1.800 anos atrás. As descobertas incluem um cinto feito para ser usado com uma túnica romana, pregos de sapatos romanos, broches de roupas e moedas. Os cientistas também acreditam que as ruínas localizadas a apenas alguns quilômetros da passagem de Schnidejoch podem ter sido um assentamento romano ou posto avançado de comércio.
Tomados em conjunto, estes artefatos históricos de períodos de tempo distintos mostram como geleiras cujas extensões avançam e recuam poderiam abrir e fechar a passagem para os viajantes no passado. Olhando para as moedas recuperadas, é difícil não imaginar um soldado romano, longe do clima quente da região mediterrânea da Itália, deixando-a cair enquanto viaja da Itália para locais mais ao norte que viriam a ser países como a Inglaterra ou a Alemanha.
6. Sapato de couro da época da Idade do Bronze
A Idade do Bronze corresponde a um período da civilização em que ocorreu o desenvolvimento do bronze, abrangendo aproximadamente desde o ano de 3.300 aC até 600 aC. Em 2006, uma descoberta surpreendente surgiu a partir de uma superfície de terra congelada em Lendbreen, na Noruega. Um lenhador e arqueólogo amador se deparou com um sapato de couro muito antigo, mas surpreendentemente bem-preservado.
Quando o objeto foi examinado e testado por profissionais da área, os arqueólogos ficaram absolutamente atordoados. O sapato era muito mais velho do que qualquer um poderia supor: datava de mais de 3 mil anos atrás, aproximadamente da mesma época de Otzi, o Homem do Gelo – um homem da Idade do Bronze encontrado em 1991 nas montanhas do norte da Itália.
Objetos de couro são excelentes marcadores para a idade de uma geleira. Quando o gelo derrete, os objetos de couro são expostos aos ambiente e rapidamente se desintegram. Portanto, quando os cientistas descobrem objetos de couro antigos, eles sabem que o gelo não poderia ter recuado antes da Idade do Couro, tornando a geleira pelo menos tão antiga quanto esta época. O sapato foi feito de couro curtido e possui o correspondente ao nosso tamanho 37. Trata-se de um dos sapatos mais antigos já encontrados no mundo, e o mais antigo já descoberto na Noruega.
5. Um cavalo da Idade do Ferro
A geleira de Lendbreen perto de Lillehammer, na Noruega, já foi o local de muitas descobertas surpreendentes de artefatos arqueológicos bem preservados. Anteriormente, os cientistas haviam descoberto esterco de cavalo bem conservado em altitudes elevadas, onde normalmente só é possível achar esterco de rena em bom estado. Pesquisadores também já encontraram ferraduras de 1.000 anos de idade nas imediações.
Não satisfeitos apenas com o cocô do cavalo, os cientistas continuaram as buscas, argumentando que onde há fezes de cavalos e ferraduras deve ter havido cavalos. Em agosto de 2013, eles finalmente encontraram o esqueleto de um desses animais – na primeira vez em que cientistas conseguiram encontrar restos de um antigo cavalo em uma altitude tão elevada.
O cavalo em questão era pequeno, semelhante aos encontrados na Islândia. Os cientistas teorizam que o animal tenha quebrado a perna e acabado morrendo no local. Sabe-se agora que as pessoas deste período estavam usando cavalos para o transporte. O que ainda está em discussão é se os caçadores de renas da região usavam os cavalos para o transporte das carcaças das renas de volta para as aldeias, que se localizavam aos pés das montanhas.
4. Florestas antigas
Há cerca de 2.000 anos, a geleira de Mendenhall se aproximou lentamente de uma floresta de cicuta e espruce na região que hoje compreende a cidade de Juneau, no estado do Alasca, EUA. À frente da geleira, veio a água do derretimento glacial, empurrando toneladas de cascalho, que lentamente foi engolindo as árvores, arrancando seus galhos, mas deixando as próprias árvores em pé e enraizadas no chão. Eventualmente, o cascalho passou a cobrir a maior parte das árvores e agiu como uma espécie de amortecedor quando a geleira em si foi se aproximando e eventualmente cobriu a floresta.
O peso do gelo e da pressão da geleira normalmente teria esmagado as árvores. Entretanto, o cascalho serviu como proteção para a floresta e hoje, à medida que a geleira derrete, as árvores estão reaparecendo, muitas das quais ainda estão de pé. Não apenas uma grande quantidade das árvores está intacta, como muitas delas ainda possuem a sua casca. Isso permite aos cientistas estudar melhor as plantas, além de conseguir estimar com mais proximidade a idade delas. Uma árvore foi datada de 2.350 anos atrás.
3. Os aventureiros William Holland e Jonathon Conville
Não são somente cadáveres de cavalos, caçadores antigos e alpinistas que emergem do derretimento das geleiras do mundo. Dois corpos descobertos recentemente demonstram o poder das geleiras para tirar a vida de pessoas queridas e, mesmo muitos anos depois, trazer um desfecho emocional para aqueles que ficaram.
Em 1979, Jonathon Conville decidiu fazer uma grande transformação em sua vida. O ex-paraquedista britânico tinha abraçado a ideia da vida ao ar livre e um de seus desafios era escalar o famoso monte Matterhorn nos Alpes da Suíça. Porém, durante a subida, ele e seu parceiro de escalada foram pegos de surpresa por uma tempestade e ficaram presos na face norte da montanha. Conville desapareceu, e seu parceiro foi resgatado por um helicóptero.
Mais de 30 anos depois, outro piloto de um helicóptero de resgate observou algo que não pertencia à montanha. Perto da borda de um local anteriormente recoberto de gelo, que foi derretendo, ele viu o que pareciam ser restos humanos. A equipe de busca encontrou alguns equipamentos de escalada e roupas. Uma etiqueta na roupa confirmou o que parecia improvável para muitos: ali se lia “Conville”. O patologista que examinou o corpo encontrado procurou por parentes vivos de Conville para informá-los de que seus restos mortais tinham sido encontrados. Sua irmã foi capaz de recuperar o corpo e segurar mais uma vez a mão de seu irmão perdido há muito tempo.
Em 2010, no Canadá, um episódio semelhante ocorreu em outra geleira, que revelou o corpo de mais um alpinista perdido há muito tempo. Desta vez, foi um americano chamado William Holland. Em abril de 1989, Holland desapareceu durante uma caminhada em uma perigosa cachoeira congelada, localizada em uma montanha chamada Snow Dome. Assim como Conville, Holland morreu apesar de seus parceiros de escalada terem sobrevivido.
No caso de Holland, ele chegou perto demais da beira de um precipício congelado, que se quebrou. A queda mortal foi de 305 metros. No momento em que uma equipe de regate conseguiu chegar até o local do acidente, uma avalanche já havia enterrado seu corpo – e assim ele permaneceu por mais de uma década. Quando o corpo do aventureiro foi encontrado por alpinistas em 2010, a geleira que derretia o tinha preservado tão bem que sua corda de escalada ainda estava enrolada em seu corpo.
2. Túnica da Idade do Ferro
Você já tirou seu casaco em um cinema, colocou-o sobre a cadeira ao seu lado e foi embora, esquecendo-o lá? Foi uma situação parecida com essa que aconteceu por volta do ano 300 dC, novamente na geleira Lendbreen, na Noruega. Alguém tirou seu kyrtel (uma espécie de túnica), colocou-o em algum canto e lá o deixou. Pelo menos é com esta hipótese que os cientistas trabalham, pois eles concluíram que não faz sentido alguém deixar para trás um casaco quente em um lugar tão frio.
Talvez o motivo para a atitude tenha sido um raro dia quente e ensolarado, durante o qual o proprietário da túnica tenha aproveitado para absorver um pouco de sol e esqueceu onde deixou sua roupa. Outra hipótese é a de que a pessoa em questão estava nos últimos estágios da hipotermia e sofreu o estranho fenômeno chamado de “paradoxo do desnudamento”. Isto ocorre quando a pessoa sente uma repentina onda de calor, pouco antes de congelar até a morte, e retira as suas roupas. Será que o dono da túnica teve este fim? Independentemente da forma como foi perdido, o kyrtel foi descoberto devido ao derretimento de gelo, que liberou a peça de roupa muito bem preservada para seus 1.700 anos de idade.
Usada sobre a cabeça, como um moletom de capuz da Idade do Ferro, a túnica foi feita para servir em uma pessoa de aproximadamente 1,75 metro de altura. A peça foi criada a partir das lãs de uma ovelha adulta e de um cordeiro. As duas lãs tinham, cada uma, um tom diferente de cor. A túnica foi alterada duas vezes por seu usuário, talvez com o objetivo de torná-la mais fácil de ser identificada.
1. O homem da Passagem de Theodul
Você deve ter ouvido falar de Otzi, o homem da Idade do Cobre surpreendentemente bem preservado, que viveu em algum momento entre 3.500 e 3.100 aC. A descoberta desse homem antigo, em 1991, a milhares de metros de altitude nas montanhas alpinas, e o mistério de quem ele era e como ele viveu e morreu ainda estão sendo pesquisados por cientistas mais de 20 anos depois. Menos conhecido, mas não menos importante, é o homem do século 16 conhecido como “o homem da passagem de Theodul”. Apesar de não ser tão antigo quanto Otzi, o homem da passagem de Theodul tem sua própria história enigmática.
Tudo começou em 1985, quando uma professora de esqui, Annemarie Julen-Lehner, estava caminhando perto da geleira Theodul, na Suíça – uma região conhecida pelos moradores como “Lichenbretter” ou “laje de cadáveres” (um apelido que se justifica por histórias como esta). A passagem de Theodul é um atalho perigoso, a 3.350 metros de altitude, que serpenteia as montanhas que separam a Suíça da Itália. A geleira está cheia de fendas escondidas, de modo que o tempo que um alpinista gasta para evitá-las pode custar a sua própria vida. Isto foi, aparentemente, o que aconteceu com o homem da passagem de Theodul.
Julen-Lehner encontrou ossos que emergiam do gelo, e os levou para seu irmão biólogo. Ele imediatamente reconheceu a importância do achado. Os ossos eram de um ser humano e uma mula. Embora o gelo normalmente preserve os corpos, os ossos encontrados indicavam que eles tinham sido expostos ao sol e se deterioraram em algum ponto no tempo. Eventualmente, Annemarie e seu irmão encontraram mais do que apenas ossos e foram capazes de recuperar pedaços do crânio do homem e até mesmo pedaços de seu cérebro.
Nos quatro anos seguintes, os irmãos, em conjunto com uma equipe de arqueólogos, recuperaram mais pistas que ajudaram a decifrar a identidade da figura misteriosa. Descobriu-se, por exemplo, que ele estava bem armado para a viagem, pois carregava uma pistola, um punhal e ainda uma espada com a marca de um ferreiro alemão. Além disso, ele estava usando um amuleto de prata com uma cruz gravada e carregava um copo onde era possível verificar as iniciais “H. A.”. A descoberta mais significativa, entretanto, foram as mais de 90 moedas de cobre e de prata que o homem estava carregando. Esta foi a pista mais concreta de que seus restos mortais deveriam ser da última década do século 16.
Até a descoberta das moedas, os arqueólogos acreditavam que o homem poderia ser Anton Fux, um cidadão local que desapareceu na geleira em 1584. No entanto, como as moedas são datadas de 1585 adiante, não poderia ter sido ele. As moedas, na realidade, deixaram claro que o homem da passagem de Theodul morreu algum tempo depois de 1588 – além de conterem também mais pistas a respeito de onde ele veio. Elas mostravam a imagem de Filipe II de Habsburgo, que governava a Espanha e norte da Itália na época. É provável que a pessoa enigmática fosse descendente de italiano ou espanhol, viajando pela passagem rumo ao norte quando a tragédia aconteceu.
Ao considerar todas as evidências em conjunto, os arqueólogos imaginam que o homem da passagem de Theodul tenha sido um mercenário italiano que viajava da Itália para a Suíça. Montado sua mula, ele provavelmente caiu em uma fenda e morreu. Lá, ele e a mula ficaram expostos ao ambiente durante muitos anos, até que a Pequena Idade do Gelo se estabeleceu na Europa no século seguinte, mantendo os restos mortais do homem e do animal presos à geleira. Mais de 400 anos depois, quando a geleira recuou, o homem, sua mula e seus bens foram redescobertos. [List Verse]
Parabéns giane, muito legal seu blog. bjs
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